"A história de todas as sociedades que existiram até nossos dias tem sido a história das lutas da classes"
Marx e Engels
"Existe apenas uma espécie de revolução possível, e ela não é nem econômica, nem política, nem social, mas racial, e será sempre a mesma coisa: a luta entre as classes inferiores e as raças superiores que estão no poder. ... Todas as revoluções – e eu estudei com dedicação e cuidado – foram raciais...”
Hitler, diálogo entre Hitler e Otto Strasser

Uma das personalidades a quem cabe a maior culpa, ou pelo menos a quem mais se atira a culpa desse nacionalismo, foi Hegel, o inspirador simultâneo do nazismo e do marxismo, dois filhos da sua doutrina, opostos, adversários, mas analogados em muitos aspectos como ainda veremos.
Hegel tornou o Estado a expressão da Divina Idéia concrecionada na Terra. É a marcha de Deus através do mundo, um organismo com consciência e pensamento, seus atributos essenciais, cuja realidade é necessária, e que existe por si e para si. Nunca se endeusou tanto o Estado, também nunca se endeusou tanto um filósofo, como o foi Hegel pelos autoritários prussianos e pelos filósofos alemães de então, cuja maioria o proclamava o supremo ditador da filosofia, apesar de muitos, de inegável valor e dignidade, terem-se oposto às suas doutrinas.
A lei é uma manifestação da vontade, dizem eles, mas de quem? Do Estado, afirmam os estatólatras; da nação, afirmam os nacionalistas; do povo, afirmam os democráticos; do proletariado, afirmam os marxistas e os socialistas autoritários em geral.
Deu-se uma vontade ao povo, à nação, à classe, uma vontade e uma consciência, que se transformaram em supernacionalidades hipostasiadas, criações do coletivismo romântico.
Marx substituiu o Espírito de Hegel pela matéria e pelos interesses econômicos, do mesmo modo que o nazismo substituiu o Espírito pela Raça. E, então, quando Hegel afirmava que o Espírito é o propulsor da história, o senhor do espetáculo da História, Marx substituindo o termo Espírito, afirmava: A Matéria e os interesses econômicos são os propulsores da História, os senhores do espetáculo da História. Hitler substituindo pela Raça, poderia dizer: a Raça é a propulsora da História, a senhora do espetáculo da História.
Em Marx, o Espírito vira de cabeça para baixo, e vira Matéria; em Hitler, torna-se Sangue. Essa é a inversão de que tanto eles se orgulharam.
O arsenal dos argumentos é o mesmo para todos. Não foram proporcionados apenas por Hegel, pois já vinham de antigas pilhagens de outras aventuras intelectuais do Renascimento, das lutas que procuravam impor o direito dos príncipes contra a concepção da Igreja, defensora das pequenas pátrias, a fim de acautelar e impedir as grandes guerras destrutivas, e partir, a pouco e pouco, para uma maior unidade dos cristãos, que acima dos particularismos nacionalistas, deviam pôr a idéia da Humanidade em Cristo, e torná-la universal) católica (de Kath'olon, em grego, universal), vencendo os obstáculos, que impediam a fraternidade universal e que reinasse a paz entre os homens de boa vontade.
Um conjunto de esquematismos gira em torno da idéia nacionalista. Podemos alinhar alguns:
1) o Estado é a encarnação do Espírito (Hegel), ou da Raça (Hitler) ou da Ditadura do Proletariado (Marx). Uma raça eleita, que deve conquistar o mundo (Hitler) ou um Estado eleito que deve dominar o mundo (Hegel) ou uma classe eleita, que deve dominar o mundo (Marx).
2) O Estado é independente e liberto de toda obrigação moral. Deve realizar seus fins, sejam quais forem os meios (Os fins justificam os meios, é do patrimônio de todos, de Hegel, Marx e Hitler).
3) Para realizar seus fins é mister uma guerra impiedosa e totalitária (também do patrimônio de todos).
4) Portanto, impõe-se uma vida heróica, que não tema os perigos, que viva perigosamente a grande façanha de realizar o ideal (também do patrimônio de todos).
5) Realizar-se-á, finalmente, o Grande Homem do amanhã (o germano superior de Hegel e Hitler, o revolucionário de Marx). O Estado não é a meta final, mas sim a fusão dele com o ideal-typus preconizado.
6) O Estado não está sujeito a nenhuma norma superior; ele é a lei, tanto a moral como a jurídica.
7) Os Estados podem estabelecer acordos mútuos entre si, porém não são obrigados a cumpri-los, porque seria violentar a sua soberania (Tese de Hegel).
8) Quando os Estados não encontram uma solução para as suas pendências, a guerra deve procurar resolvê-las (Tese de Hegel).
9) O bom êxito justifica tudo (Tese de Hegel). O bom êxito é o único juiz da História.
10) O despojo será do forte, que expropriará os mais fracos (Tese de Freyer, aceita por todos os autoritários).
11) O ataque é sempre a melhor defesa (Tese aceita por todos os totalitários).12) A moralidade particular, a filantropia, a caridade não são guias do Estado poderoso (Tese de todos, que renegam qualquer consideração aos direitos alheios).
13) Não se deve vacilar na propaganda ante o emprego da infâmia, da calúnia, da mentira. O êxito justifica tudo. "Caluniai, caluniai, que alguma dúvida ficará..." Todos os poderosos totalitários aconselharam essa prática. Lenin justificou-a várias vezes, e aconselhou-a aos bolchevistas.
14) Todo o bem conquistado em favor do Estado é justo (Tese universal de todos os dominadores).
15) Só a guerra viriliza os homens e impede que se enfraqueçam. A política, na paz, só é justificada se prepara uma boa guerra (Assim pensaram sempre os poderosos). A guerra é a forma mais perfeita da atividade do Estado (Tese de Max Scheler, existencialista, mas aceita por todos os totalitários). A guerra é um bem precioso e raro (Hegel).
16) O humanitarista não é um regulador da História. O homem adultera-se pela idéia humanista (Tese de Rosenberg, filósofo nazista).
17) Há uma missão histórica a ser cumprida, para a qual está predestinado o Espírito (Hegel), a raça (Hitler), a classe (Marx). São os novos messias. É preciso amar esse destino.
18) Não há princípios morais acima do Estado. Tudo deve subordinar-se ao Estado como encarnação, ou da nação, da raça ou da classe, etc.
19) A tese aceita é dogmática e a expressão viva da Verdade. Qualquer opinião em contrário é herética e blasfemática, e quem a profere deve ser eliminado. (Tese de todos os totalitários).
20) A vontade individual deve subordinar-se à vontade coletiva, representada pelo Estado, como encarnação de Deus, Raça, Classe, etc.
21) O ideal preconizado é inevitável, e sua vitória final é determinada necessariamente pela História (Tese universal dos totalitários).
22) O terror preventivo é o melhor meio de impedir as tentativas de oposição. A admissão de partidos é absurda, porque só há uma verdade, a do Estado, como encarnação de... (Tese universal).
Schopenhauer — pondo de lado suas deficiências — ergueu sua voz na Alemanha contra o totalitarismo e viu em Hegel o grande perigo para o seu povo e para a humanidade. Algumas de suas palavras não podem ser hoje esquecidas. Durante quase quarenta anos, fêz-se a conspiração do silêncio em torno de sua obra, que é a tática sempre usada contra todo aquele que traz alguma coisa de novo e superior, e põe em risco a mediocridade oficial dominante.
Comentando Hegel, escrevia: "Exerceu não só sobre a Filosofia, mas sobre todas as formas da literatura germânica, uma influência devastadora, ou, para falar com maior rigor, de caráter letárgico e — até se poderia dizer — pestífera. É dever de todo aquele que se sente capaz de julgar com independência, combater essa influência tenazmente e em todo momento. Porque, se calarmos, quem falará?"
E mais esta passagem, permitam-nos citar: "Se alguma vez vos propondes a embotar o engenho de um jovem e anular seu cérebro para qualquer tipo de pensamento, então nada podereis fazer de melhor que dar-lhe a ler Hegel. Com efeito, estes monstruosos cúmulos de palavras, que se anulam e se contradizem entre si, atormentam a mente que procura inutilmente encontrar nelas algum sentido, até que, finalmente, se rende totalmente exausta. Deste modo, fica tão perfeitamente destruída toda capacidade de pensar, que o jovem termina por tomar por verdade profunda uma verbosidade vazia e ôca. O tutor, que teme que seu pupilo se torne demasiado inteligente para os seus projetos, poderia, pois, evitar essa desgraça, sugerindo-lhe inocentemente a leitura de Hegel."
E que frutos deu essa doutrina? O nazismo e o marxismo.
Contudo, Hegel, como filósofo, tem um grande valor, apesar do que partejou para a humanidade.
Escrito por Wellington Moraes
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