sexta-feira, 27 de junho de 2008

Abominável!

Recentemente, a esquerda festiva e "governante" aprendeu uma nova palavra e vem juntando-a ao seu vocabulário ("nunca antes", "nada sabia", "é mentira", "mídia golpista" etc.): tal palavra é abominável.

Quando prensado na parede, por causa de sua ligação com as FARC, através do Foro de São Paulo, nosso presiMente declarou que "é abominável essa história de seqüestro"; quando Dilma foi acusada por Denise Abreu, retornou dizendo que "eu acho abominável, e a história haverá de fazer o julgamento das ilações que estão sendo feitas contra a ministra Dilma."; também classificou de abominável a conduta dos militares, no caso do PAC pentecostal de seu apadrinhado "bispo" Marcelo Crivella - e, neste caso particular, abominando TODO o exército e não somente os indivíduos que fizeram o ato realmente abominável!

E Nelson Jobim, um dos papagaios de plantão do Planalto, foi mais longe neste caso: subiu o Morro da Providência para pedir desculpas às famílias dos três jovens mortos, e classificou a ação do tenente do exército Vinícius Ghidetti de Moraes Andrade e seus comandados de "indesculpável", "abominável" e "desprezível", e afirmou que eles serão punidos. Mas, pelo menos, não culpou, qual o apedeuta-mor, o exército como um todo.

Ouvindo-os, e a todos os políticos que nos rodeiam e salteiam diariamente, fiquei indagando: quantas abominações nos vitimam, vindas desta "classe" e por ela defendidas ferrenhamente?

Quão abominável é ver que "nunca antes neste país" houve tantos políticos com passaporte para o enriquecimento ilícito, que nós pagamos com a enorme carga tributária que nos é imposta e praticamente sem qualquer retorno?

Quão abominável é ver que "nunca antes neste páis", o "governo" do Partido dos Trabalhadores - que prometia transformar o Brasil em algo melhor - comprou lealdades e distribuiu tantas mentiras em todos os níveis apadrinhando, cada vez mais, meliantes de todos os tipos nos cargos de Ministro e Secretários Especiais, entre outros que se apinham nos cargos de confiança, sangrando nossos bolsos?

Quão abominável é saber que "nunca antes neste país" os companheiros transgrediram a legislação penal brasileira, dia após dia, fazendo com que esta, aos cidadãos honestos, pareça ter sido feita para proteger bandidos e impedir que seja efetivada a punição para quem comete crimes?

Quão abominável é saber que "nunca antes neste país" promoveu-se tanto a sua fragmentação, não apenas em termos territoriais mas, também - e não menos importante -, na área jurídica, criando conflitos raciais, culturais, sexuais, étnicos e classistas, num claro ataque ataque à liberdade, à propriedade e à nacionalidade?

Quão abominável é saber que "nunca antes neste país" houve um presidente que, em conjunto com outros mandatários, pertence a uma organização que quer subjugar nossa liberdade, nossa soberania, nossa democracia, para instaurar uma "ditadura do proletariado", totalmente comunista, nos moldes da extinta União Soviética e da atual Cuba?

Quão abominável é ver que "nunca antes neste país" tantas pessoas lutaram a favor do patrulhamento ideológico, com claríssimas tendências comunistas, e pela volta da censura à liberdade de imprensa?

Quão abominável é saber que "nunca antes neste país" fomos governados por tanta legislação infra-legal, não mais vigindo a lei, mas o decreto, a portaria, a instrução normativa, o aviso?

Quão abominável é saber que "nunca antes neste país" a sociedade foi dominada por uma chusma revanchista que quer acabar com a Lei da Anistia para punir os torturadores da "ditadura", mas não os guerrilheiros, seqüestradores, assaltantes e assassinos que foram a causa do contra-golpe militar? E que muitos destes últimos, "nunca antes neste país", estiveram nos antros de poder, legislando em causa própria, num claro achaque à moral e aos bons costumes da sociedade?

Quão abominável é ver que "nunca antes neste país" houve um total domínio da esquerda comunista que, cotidianamente, segue o ensinado por Lenin, que dizia que "a tarefa dos comunistas é explorar todas as contradições; e onde não existirem, criá-las"?

A lista é imensa e abominável e o povo brasileiro, sustentado em sua grande maioria pelo bolsa-esmola, nada faz a respeiro, dando, pelo contrário, apoio a toda esta imoralidade.
Se de fato, como a arte, a corrupção não evolui, apenas muda, cumpre observar que, nestes últimos anos, ela nos tem revelado facetas inusitadas. E isso se deve, justiça seja feita, à indiscutível contribuição do PT, que, como se sabe, nasceu para mudar o Brasil. Se não mudou as relações de propriedade, instaurando o socialismo, inventou pelo menos uma nova maneira de apropriar-se do dinheiro público, ou de fazê-lo impunemente.

Ferreira Gullar

quinta-feira, 26 de junho de 2008

A Volta da Censura

Nos primeiros anos da era Lula, não faltaram motivos para a imprensa temer por sua liberdade. Desde a malfadada tentativa de criar um conselho federal e conselhos regionais para 'fiscalizar' a atividade jornalística à tentativa, igualmente abandonada, de expulsar o correspondente estrangeiro que escrevera sobre o presidente e a bebida - para citar os exemplos mais escabrosos -, o governo emitiu sucessivos sinais de estar interessado em intimidar e, no limite, manietar os meios de comunicação.
Em cada caso, a pronta reação da sociedade e do conjunto dos órgãos de mídia fez ver ao Planalto que o Brasil havia amadurecido o suficiente para não se intimidar diante de quaisquer ameaças dos poderosos de turno ao fundamento constitucional que, acima de todos os outros, distingue o sistema democrático dos regimes de força. Hoje em dia, escolado, o máximo que Lula se permite são eventuais diatribes contra tópicos do noticiário. Ficando nisso, o essencial está preservado.
Ou assim parecia, antes que as baldadas ameaças do Executivo cedessem lugar a um perigo ainda maior, por vir de onde tem vindo - o Judiciário. Pelo País afora, juízes que parecem ter perdido a noção do valor concreto das liberdades públicas vêm tomando decisões francamente incompatíveis com o exercício do direito de informar e ser informado, como se este não precedesse todos os demais na hierarquia jurídico-legal das democracias. Tais decisões nem sempre repercutem com a devida intensidade por afetar pequenas empresas jornalísticas a distância dos principais centros metropolitanos. Nem por isso se deve desconsiderar o seu potencial de gerar perniciosos efeitos cumulativos, fomentando, no limite, uma cultura liberticida. O fato de se tratar de sentenças de primeira instância, passíveis de revogação em escalões superiores, não retira a gravidade da ameaça. Seja porque produzem conseqüências objetivas desde o primeiro momento, seja porque obrigam os atingidos a onerosas e demoradas contestações.
Agora, enfim, a opinião pública nacional tem diante de si atos do Ministério Público e da magistratura que talvez só se expliquem por uma visão distorcida do trabalho da imprensa e das garantias constitucionais que o protegem. Estão aí as multas impostas por juízes eleitorais a um jornal e a uma revista - a Folha de S.Paulo e a Veja São Paulo - por terem publicado entrevistas com a pré-candidata Marta Suplicy, que configurariam propaganda antecipada.
Significativamente, uma ação similar contra o Estado, por uma entrevista com o prefeito Gilberto Kassab, foi arquivada pelo juiz eleitoral Antonio Martin Vargas. Mas o que literalmente passou do limite foi a liminar do juiz substituto Ricardo Geraldo Rezende Silveira, da 10ª Vara Federal Cível de São Paulo, proibindo o Jornal da Tarde e O Estado de S. Paulo de publicar uma reportagem sobre presumíveis irregularidades no Conselho Regional de Medicina de São Paulo (Cremesp), sob investigação do Tribunal de Contas da União.
A censura prévia - não há outro termo para a decisão - evoca os "anos de chumbo" da ditadura militar, quando a imprensa era proibida de publicar o que não interessasse ao regime. Pior, afronta a Constituição que não só veda expressamente a censura à imprensa, como estipula que nenhuma lei poderá 'constituir embaraço à plena liberdade de informação jornalística'. Ao conceder a liminar pedida pelo Cremesp, o juiz intimou o Grupo Estado a 'prestar esclarecimentos' em 72 horas. 'Esclarecimentos sobre o quê?', indignou-se o jurista Dalmo Dallari, da USP. 'Sobre o que vai publicar? Sobre a intenção? Isso é censura.' Antes da decisão, o presidente do Cremesp, Henrique Carlos Gonçalves, advertiu que processaria quem divulgasse o que entende ser uma 'difamação'. Está no seu direito. 'O abuso (jornalístico) é punido a posteriori, jamais previamente', atesta o presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Cezar Britto. Espanta que a esta altura da história brasileira ainda seja necessário chamar a atenção para essa verdade elementar, consagrada nas leis e na jurisprudência.
Ou para a amarga observação do presidente da Associação Brasileira de Imprensa (ABI), Maurício Azedo, segundo o qual 'o grande inimigo da imprensa hoje é o Poder Judiciário'.

do Editorial do Estado de São Paulo, em 26/08/2008

Moral e Civismo

Manifestação nacional de indignação repudia a crise moral que envolve hoje plêiades de homens públicos, acomodados em cargos e vantagens financeiras. Quando idealizada, há décadas, a obrigatoriedade do ensino da moral e do ci­vismo, a administração pública e a moralidade profissional já padeciam de con­vulsões éticas. A expectativa era a de que, hoje, já adultos aqueles jovens, que então receberiam os ensinamentos da moral e do civismo, viessem a compor uma geração de homens de bem. O projeto, porém, fracassou por insuficiência cul­tural dos seus executores. O ideal era a fusão dos princípios da legalidade com os da moralidade e do civismo, para preservar a segurança jurídica do cidadão, fortalecer a defesa da dignidade humana e realizar uma sociedade justa e solidária.

O ex-Presidente da República, Jânio Quadros, ostentava a vassoura como símbolo do seu propósito moralizante. Pregava, nas excursões político-eleitorais, a decência dos costumes, particulares e públicos. Ao assumir a Presidência da República, logo baixou o Dec. 50.505, de 26.04.1961, cujo art. 1.° dispunha que "é obrigatória a prática de atividades extra-escolares, de natureza moral e cívica, nos estabelecimentos de qualquer ramo ou grau de ensino, públicos ou particulares, sob a jurisdição do Ministério da Educação e Cultura". O Ministério deveria editar e distribuir um "Calendário Cívico" e respectivo programa de comemorações, além de providenciar a organização e divulgação de material didático destinado ao cumprimento do decreto.

O Dec. 50.505/61 ressaltou as atividades de natureza moral e cívica que deveriam ser desenvolvidas como, (I) o hasteamento, no início da semana, do Pavilhão Nacional, com a presença do corpo discente e antes dos trabalhos es­colares; (II) freqüentes execuções do Hino Nacional, do Hino à Bandeira e de outros que sejam expressões coletivas das tradições do país; (III) comemoração das datas cívicas; (IV) estudo e divulgação da biografia e da importância histórica de personalidades do país; (VI) divulgação e debate sobre a realidade econômica e social do país, incluindo estudo da sua posição internacional; (IX) divulgação dos princípios fundamentais da Constituição Federal, dos valores que a informam e dos direitos e garantias individuais.

Com a renúncia de Jânio Quadros e o reboliço político-partidário, que se seguiu, veio a Revolução Militar de 1964, com Castelo Branco na Presidência da República. Conhecido como patriota, o Presidente baixou o Dec. 58.023, de 21.03.1966, que dispunha sobre a educação moral e cívica em todo o país. O Departamento Nacional de Educação, órgão do MEC, ficou encarregado de estimular a educação cívica, "usando de processos capazes de incentivar a consciência cívica de cada comunidade." A formação cívica deveria processar-se "obrigatoriamente na escola, como prática educativa", "em todos os graus de ensino e ser preocupação dos professores em geral". Nascia, então, a esperança de que a próxima geração, que despontava, criaria uma nação mais civilizada e respeitada pela imagem de idoneidade do seu povo, dos seus homens públicos e dos seus líderes.

O decreto dispunha no art. 2.°, na conceituação dos princípios, que "a educação cívica visa a formar nos educandos e no povo em geral o sentimento de apreço à Pátria, de respeito às instituições, de fortalecimento da família, de obediência à lei, de fidelidade no trabalho e de integração na comunidade, de tal modo que todos se tornem, em clima de liberdade e responsabilidade, de cooperação e solidariedade humanas, cidadãos sinceros, convictos e fiéis no cumprimento dos seus deveres". Embora tais disposições nos transmitissem um projeto idealista, elas foram inspiradas num momento crítico em que o país estava mergulhado num clima de desordem político-partidária, com as instituições profundamente abaladas, sobretudo na segurança jurídica do cidadão.

O decreto teve o propósito de ver utilizados, para a divulgação dos princípios cívicos, "todos os veículos de difusão cultural, como os jornais e as revistas, o cinema e o teatro, o rádio e a televisão, os clubes de esportes e de recreação, e quaisquer acontecimentos que, em contato com a opinião pública, possam despertar os idéias e os hábitos preconizados". O DNE ficou, por sua vez, encarregado de promover "nas capitais dos Estados e Territórios, bem como no Distrito Federal, seminários destinados a despertar, no professorado local e na opinião pública, interesse pela educação cívica e pelos problemas pedagógicos dessa prática educativa". Estava, pois, lançado um movimento promissor, que deve­ria atingir a consciência cívica de todos os cidadãos.

O governo contra-revolucionário militar quis ampliar o movimento, e baixou o Dec. 61.314, de 08.09.1967, com o objetivo de estimular as organizações sindicais, de todos os graus, de empregados ou de empregadores, a desenvolverem suas atividades educativas, especialmente no que se relacionassem com a educação moral e cívica, a qualificação da mão-de-obra e da educação sanitária, em conjunto com instalação de cursos para a alfabetização funcional. O decreto conclamava todas as autoridades, especialmente da administração escolar, federais, estaduais, municipais e territoriais, para que colaborassem no movimento, que receberia a assistência do Departamento Nacional de Edu­cação.

Em 12.09.1969, quando o país era governado pela Junta Militar dos três Ministros da Marinha, do Exército e da Aeronáutica, foi baixado o Dec.-lei 869, pelo qual foi "instituída, em caráter obrigatório, como disciplina e, também, como prática educativa, a Educação Moral e Cívica, nas escolas de todos os graus e modalidades, dos sistemas de ensino do país." E o Dec.-lei exemplificava as finalidades que deveriam ser alcançadas, com o apoio nas tradições nacionais, como defesa dos princípios democráticos, da dignidade da pessoa humana, do amor à liberdade com responsabilidade, preservação dos valores espirituais e éticos da nacionalidade, preparo do cidadão para o exercício das atividades cívicas, com fundamento na moral, no patriotismo e na ação construtiva, visando ao bem comum e o culto de obediência à lei.

O Dec.-lei 869 alimentava o sonho de preparar a nova geração mediante o aprimoramento do caráter, com apoio na moral, na dedicação à família e à comunidade, com o fim mais abrangente de estimular a compreensão dos direitos e deveres dos brasileiros e o conhecimento da organização sócio-político-eco-nômica do país. Pretendeu-se motivar o magistério, público ou privado, a voltar-se à formação cívica do aluno. Inspirada nesses princípios, o governo nutria a esperança de que a primeira nova geração, formada nessa educação, que despontasse na nação, haveria de dedicar à pátria um sentimento de idoneidade político-administrativa. Não tinham e nem podiam ter pressa. O Terceiro Milênio haveria de chegar com a pátria entregue - como era no sonho - a cidadãos patriotas ilibados. O sonho, porém, não se realizou.

Este bem intencionado projeto, de âmbito nacional, fora entregue a uma recém-criada Comissão Nacional de Moral e Civismo (CNMC), dentro do MEC. A Comissão deveria articular-se com as demais autoridades para a manifestação chamada de Doutrina de Educação Moral e Cívica, para elaborar currículos e programas, envolver as organizações sindicais de todos os graus, convocar a cooperação das instituições e formadores da opinião pública de toda espécie, falada e escrita. A Comissão, na forma de assessoria, deveria contribuir, com o Ministro de Estado, para a aprovação dos livros didáticos, sob o ponto de vista da moral e do civismo. O projeto, todavia, não se atentou para o fato de que a implantação da promissora doutrina não dispunha de quem a executasse, por­que o magistério, sempre mal remunerado, não possuía suficiente preparo intelectual para a missão.

O desenvolvimento de um projeto de tamanha envergadura, e com objetivos de reconhecida complexidade, como o da "Educação Moral e Cívica", exigia a disponibilidade de um exército da orientadores. A apuração da suficiência do magistério revelou a inabilitacão generalizada para a nova matéria. Este impasse teve a agravante de que a nova função não tinha compensação financeira e deve­ria ser exercida cumulativamente às funções regulares. O legislador pressentiu a insuficiência do magistério no assunto, mas, determinou que "até que o estabelecimento do ensino disponha de professor ou orientador, regulavelmente formado ou habilitado em exame de suficiência, o seu diretor avocará o ensino da Educação Moral e Cívica, a qual, sob nenhum pretexto, poderá deixar de ser ministrada na forma prevista".

O Dec.-lei 869 foi regulamentado pelo Dec. 68.065, de 14.01.1971, que acrescentou que a Educação Moral e Cívica, em face da lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, deveria somar-se ou articular-se com o ensino da Organização Social e Política Brasileira. Dispôs mais, que a Educação Moral e Cívica no ensino superior, inclusive na pós-graduação, deveria ser ministrada sob o enfoque de "estudos de problemas brasileiros". O decreto, para isso, buscou estimular a criação de Centros Cívicos ou instituições extra-classes, de qualquer espécie, com condições hábeis para desenvolver, de alguma forma, a educação moral e cívica e cooperar na formação ou aperfeiçoamento do caráter do educando. Cada escola deveria ter um orientador de Educação Moral e Cívica, assessorando o centro cívico.

Após a regulamentação do Dec.-lei 869, sem que nada relevante tivesse acontecido, veio o Dec. 87.801/82, para dispor que as normas gerais de funcionamento da Comissão Nacional de Moral e Civismo deveriam ser fixadas em Regimento Interno. Seguiu-o o Dec. 92.300, de 16.01.1986, que dispôs que a referida Comissão deveria ser integrada por 11 membros, com mandato de 6 anos, cujas funções seriam consideradas de relevante interesse nacional e seu exercício teria prioridade sobre o de qualquer cargo público de que este fosse titular ou conselheiro. Finalmente, veio o cumprimento da falência prenunciada: a Lei 8.663, de 14.06.1993, revogou o Dec.-lei 869/69, que havia estabelecido o ensino obrigatório da Educação Moral e Cívica.

A referida Lei 8.663, por outro lado, dispõe que "a carga horária destinada às disciplinas de Educação Moral e Cívica, de Organização Social e Política do Brasil e dos Estudos dos Problemas Brasileiros, nos currículos do ensino fundamental, médio e superior, bem como seu objetivo formador de cidadania e de conhecimento da realidade brasileira, deverão ser incorporados sob critério das instituições de ensino e do sistema de ensino respectivo às disciplinas da área de Ciências Humanas Sociais" (art. 2.°). A revogação de uma lei que pregava o ensino da moral e do civismo foi uma preocupante revelação pública de insensibilidade política e cultural, e sintomática de que a nação corre o grave risco de não mais encontrar profissionais ou homens públicos merecedores de credibilidade.

O então Ministério de Educação e Cultura (MEC) tinha um órgão, denominado Comissão Nacional de Moral e Civismo (CNMC), com competência para implantar e manter uma doutrina oficial, consubstanciada em princípios legalmente instituídos. Urge, hoje, uma reavaliação da política de qualidade da educação. Nesta iniciativa incluir-se-ia a reavaliação do livro didático, incorporando-lhe uma visão mais direta para a formação do discente, em todas as áreas, como cidadão integrado na sociedade, com seus deveres e obrigações cívicas e morais. É público e notório que a queda de qualidade do ensino, do primário ao superior, explorado como mero investimento financeiro de capitalistas, é um dos principais responsáveis pela vertiginosa queda do padrão de muitos profissionais, em quase todas as áreas do conhecimento.

A Educação Moral e Cívica está dentro da concepção da Pedagogia Social, designativa de uma educação, que enxerga o indivíduo como um ser mais comprometido com a comunidade e se dedica à formação de uma mentalidade ajustada ao convívio social. Equivale ao que pregam: uma educação permanente; para desenvolvimento da comunidade educacional, em que se incluem o combate ao analfabetismo; a educação do imigrante e a convivência globalizada. Nesta iniciativa podem, e devem, se envolver, além do Estado, as instituições particulares. A urbanização acelerada e a nova tecnologia das comunicações e das informações tornaram a pedagogia social uma preocupação em permanente reavaliação.

A crise na educação, revelada incapaz de dar cumprimento ao projeto da educação moral e cívica, agravou-se com a constatação de que havia incapacidade intelectual dos professores em assumir, de forma pedagógica, legalmente recomendável, a incumbência do ensino da matéria. "Faltam 710 mil professores no país", foi o título de artigo no jornal Folha de S.Paulo, de 12.09.2006. Com tal limitação operacional, o propósito do legislador se converteu num mero ideal irrealizado. Na educação há o fenômeno dos vasos comunicantes: a preocupação com a educação está no mesmo nível da capacidade intelectual dos legisladores. Só valoriza a educação e incentiva o seu desenvolvimento competitivo quem foi educado e se capacitou intelectualmente para conhecer-lhe a importância e os benefícios.

O Brasil, considerado país emergente vem patinando, na corrida para o desenvolvimento e o progresso. Está evidenciado, nesta competição, que os vencedores são aquelas nações que mais souberam investir no aprimoramento da sua política educacional. A estratégia deste investimento indica a prioridade na erradicação do analfabetismo, e elevação da qualidade do ensino da pré-escola à pós-graduação. E regra consagrada que a educação torna mais célere e eletivo o progresso de qualquer país. Não basta preocupar-se com o fator quantitativo sem o equivalente qualitativo. Comprovadamente, as insuficiências do ensino básico haverão de repercutir na formação profissional. Repitamos a verdade escancarada de que a atenção dispensada pelo Poder Público à educação do povo reflete a qualidade ou o grau de cultura dos governantes responsáveis.

A educação moral e cívica nas escolas teve, desde o início, o obstáculo da insuficiência pedagógica dos responsáveis pelo cumprimento do projeto legal. Exigiu-se dos professores que ensinassem o que eles pouco conheciam ou não saberiam ensinar. A moralidade administrativa, além do fator pedagógico - escrevemos no livro Cidadania - tem elevado peso jurídico, que dá legitimidade à ordem legal instituída. A história adverte que os ciclos de pobreza dos povos soem ser seqüelas dos desvios abusivos do poder público. Muito desestabiliza as instituições, ou a confiança popular nelas, o desrespeito à lei pela própria autoridade, ou a impunidade em que se abriga, nos seus excessos. É quando o povo sofre uma traumática humilhação moral.

A educação, do latim educere, significa extrair, tirar, desenvolver. É um processo vital porque é uma atividade criadora. Ela permite ao ser humano realizar suas potencialidades físicas, intelectuais, morais e espirituais, abrangendo-o no corpo e na alma. Como fase sistemática e especial, é dirigida à infância, à adolescência e à juventude, identificando a família e o Esta­do como promotores do bem comum. A lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional contribuiu para suprir as deficiências da formação natural do ambiente familiar. Quer dizer, buscou contribuir para que seja harmoniosa ou coerente a formação do caráter e da personalidade do cidadão. Nesta almejada educação convém incluir, com redobrado empenho, a Educação Moral e Cívica da nossa pregação.

As convicções dos princípios morais e cívicos adquirem relevância ante a rapidez da evolução tecnológica. Os jovens profissionais se vêem submetidos a uma complexa interdisciplinariedade, levando-os à perplexidade ante os sistemas de ensino. As novas tecnologias de informação e comunicações instigam à priorização de vantagens materiais. Buscam-nas numa sociedade cada dia mais participativa, sem a conveniente observância de princípios éticos ou morais. A escassa convivência do estudante com as regras morais e cívicas vem acarretando danosas implicações na idoneidade desejada de profissionais, de políticos e administradores da coisa pública. O conhecimento é o mais valioso patrimônio de um povo. Partilhá-lo é a mais eficaz fórmula de incentivar vocações científicas. O ambiente escolar e acadêmico tem a virtude de fomentar ou despertar curiosidades culturais, descobrir talentos e alargar as pesquisas.

A expressão pedagogia social designa uma educação que, diferenciada da forma padronizada da alfabetização tradicional, pura e simples: aula e livro - procura aprimorar a personalidade da pessoa, inspirada na vivência social, para integração do cidadão na comunidade, profissional e politicamente, de forma idônea, construtiva, permitindo-lhe contribuir para a formação de cidadão adulto produtivo. Após a II Guerra Mundial, a humanidade acordou para a necessidade de o cidadão tomar consciência de que ele tinha compromissos inarredáveis e intransferíveis com a sua comunidade, política e culturalmente. A Fundação MOBRAL, em 1976, foi um valioso passo na alfabetização, que arrancou da escuridão intelectual milhões de analfabetos.

Urge fazer da cátedra também uma fonte de inspiração moral, ética e cívica. A vida acadêmica é o momento em que são acalentados os sonhos profissionais. Mas, também é o ensejo em que as vocações, ao serem forjadas, devem ser temperadas na ética e no civismo. Os embates forenses ou as atribulações da atividade política têm, por naturais ingredientes, angústias, temores e anseios. O enfretamento de tais condições conflituosas exige do advogado a conveniente consciência dos valores humanos, éticos, morais e cívicos, na justa distinção entre o bem e o mal. O direito é concebido a partir do justo, da moral e do eqüitativo. O advogado tem, por vocação histórica, consagradamente, de ser o confiável guardião entre a lei e a moral.

No prefácio da 2a edição, do livro de Robison Baroni Cartilha de Ética Profissional do Advogado, dissemos que "a grande redenção da humanidade está na preparação moral do cidadão, como fator de diminuição da injustiça e, por conseqüência, da pobreza e da infelicidade. Afinal, formação ética e moral significa a capacidade de auto disciplinar, liberto de agressões exteriores; o justo enquadramento do que seja o bem e o mal; a grandeza de praticar a justiça oportuna e ver na solidariedade entre os homens o caminho mais curto entre a vida e o bem-estar". Plínio Barreto, símbolo de jurista, dizia, sobre o advogado: "nenhuma civilização real caminha sem nós; somos guias obrigatórios de quem quer que procure orientação no sentido da paz, da justiça e da felicidade".

O reverenciado Pitágoras já ensinava, séculos antes de Cristo, que "se educarmos a criança não precisamos preocupar-nos com o adulto." Quer dizer, a priorização da educação significa que o resto - progresso, cultura e desenvolvimento - vêm naturalmente. "Talvez o resultado mais precioso de toda educação seja a habilidade de fazer com que a gente faça o que deve fazer, quando deve ser feito, quer goste quer não de fazê-lo; é a primeira lição que deveria ser aprendida; e por mais cedo que o treinamento do homem comece, será provavelmente a última lição que aprenderá a fundo" (Thomas Henry Huxley). Prevalece no ensino o critério tradicional de abarrotar a memória de idéias inservíveis, deixando na vacuidade a compreensão e a consciência das coisas e dos princípios, que são afinal os marcos que nos guiam.

O sentimento de civismo melhor se aprimora na infância e na juventude. Espírito cívico, na sociedade política e democrática, é aquele vigilante dos interesses do seu país, mediante o cumprimento espontâneo e permanente das obrigações sociais, legais, na defesa da ordem pública. Caracteriza-o a natural predisposição de contribuir para com as atividades, que, de algum modo, fortaleçam a solidariedade humana e difundam as virtudes sociais, enquanto inspiradas e resultantes de valores morais. Os ideologismos encharcados de voracidade pelo poder, o sectarismo cego pelas incoerências com a realidade ou os egoísmos desenfreados de vantagens gratuitas nunca serão integrados por cidadãos que tiveram raízes na educação moral e cívica.

O equilíbrio e a convivência pacífica e ordeira dos membros de uma sociedade é e deve ser o ideal por todos abraçado e estimulado. Este ideal tem por componente básico estar o indivíduo adequadamente escolarizado, assim como moral e civicamente instruído. O Estado deve ter o dever, de alguma forma, de obrigar o indivíduo a receber tal educação. Há exigências sociais inarredáveis, como os deveres do respeito à lei; a higienização do indivíduo como necessidade urbana; a previdência social como proteção à doença e à velhice. Educar-se, então, passa a ser uma obrigação social de todos os indivíduos. A sociedade tem interesse em que os que a integram estejam, para tanto, credenciados pela educação moral e cívica. A educação é dever do Estado, mas, educar-se é uma obrigação exigível e irrecusável do cidadão.

O tema da educação moral e cívica nas escolas foi suscitado pela indignação de que foi tomada a sociedade brasileira, em face, recentemente, dos clamorosos desmandos político-administrativos divulgados, em todas as esferas. Quando foi baixado o Decreto-lei que tornou obrigatório o ensino da moral e do civismo, sabíamos que os efeitos haveriam de advir ao longo de décadas. Confortava-nos o sentimento de que, no final do milênio, surgiria uma geração de homens dignos e patriotas, aptos para liderar a nação. Não foi o que aconteceu, e a nação se viu afogada num turbilhão de peculatos, falcatruas, improbidades administrativas, enlaçada numa política espúria e egoística. Voltou, pois, a ser a hora de renovar o empenho de levar para as escolas, primárias ou superiores, um brado de alerta, para concitar o cidadão à conscientização dos princípios éticos profissionais, da moralidade individual e do respeito às instituições em que se assenta a nação.

Este escrito quer exortar o retorno do ensino obrigatório da moral e civismo nas escolas, da primária à superior. A escola é o único reduto, além do ambiente familiar, onde se há de forjar a personalidade do cidadão, ou sua formação moral e cívica. Não há, nesta missão educacional, muitas alternativas. A educação, sob todos os ângulos, fases e condições é a fonte de prosperidade de uma nação. Esta é a verdade que a história, com eloqüência, nos demonstra. Dentre os investimentos públicos do Estado, nenhum é mais rentável e de retorno mais seguro do que educar o povo e criar-lhe condições para elevação do seu nível cultural. E este será tanto mais promissor quanto mais consolidado em princípios moralizantes e cívicos.

Decálogo cívico

  1. Amarás o Brasil, tua Pátria, com um amor inteligente e forte. Inteligente, para conhecer seus problemas e grandezas; forte, para empenhar-te em prol de seu desenvolvimento e na defesa de sua semelhança;
  2. Amarás os teus irmãos brasileiros, reconhecendo em todos a igual dignidade de pessoas humanas, sem discriminações de raça, origem, condição social, situação econômica, opiniões doutrinais, ideológicas ou religiosas;
  3. Não excluirás de teu amor e respeito os filhos de outras terras que vieram colaborar lealmente para a grandeza da pátria comum;
  4. Prezarás os teus valores humanos, espirituais e físicos, procurando, através de todos os recursos do ensino e da educação, levá-los a uma plenitude ordenada e harmoniosa;
  5. Amarás entranhadamente o bem, a virtude e a verdade, detestando o mal, a mentira e a iniqüidade;
  6. Amarás com predileção a tua família, a cuja promoção te dedicarás pelo trabalho competente e honesto, no exercício de uma profissão;
  7. Procurarás conhecer sempre melhor teus deveres e direitos de cidadão, para observá-los com maior fidelidade, esforçando-te por participar da vida de tua cidade, de teu município, de teu Estado e da Federação;
  8. Lembrar-te-ás que um bom cidadão não pode ignorar os elementos fundamentais da organização jurídica e administrativa de sua Pátria;
  9. Deverás também te esforçar por conhecer sempre melhor os elementos da organização econômica e dos processos sociais do Brasil, bem como os sistemas propostos para resolver os seus problemas, a fim de formar, a respeito de todos, uma opinião clara e segura;
  10. Não deverás nunca esquecer que o Brasil faz parte de uma Cultura e de uma Comunidade Internacional, para com as quais tem também direitos inalienáveis e deveres urgentes, de cujo respeito depende o advento de uma paz justa e definitiva.

por Elias Farah, na Revista do Instituto dos Advogados de São Paulo, n. 18, julho/dezembro 2006, pp. 290-301

quarta-feira, 25 de junho de 2008

Entrevista com o Corajoso Promotor Gilberto Thums

O promotor gaúcho Gilberto Thums, em entrevista a Terra Magazine, classifica o MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra) como "organização criminosa". Membro do Conselho Superior do Ministério Público do Rio Grande do Sul, Thums foi um dos promotores que aprovaram relatório no final de 2007 pedindo a "dissolução" do movimento.
- Para o Ministério Público, o MST é um braço de guerrilha da Via Campesina - declara.
Thums argumenta que o Ministério Público não é contrário a nenhuma manifestação pacífica, mas considera o MST um "movimento político". O promotor afirma que a organização já passou dos limites da luta pacífica.
- Aqui no Rio Grande do Sul eles escolheram territórios estratégicos para ocupação. Eles não têm personalidade jurídica, e se valem dessa ilegalidade e clandestinidade em que vivem para praticar os atos de vandalismo e destruição (...) Este movimento busca atentar contra o Estado Democrático de Direito, essa é a verdade.
Por fim, Thums desabafa:
- A sociedade brasileira está de saco cheio com este movimento, com esta bandeira. Os objetivos estão esgotados. A técnica de atuação é molestar a população.
Em nota, o MST classificou a decisão do Ministério Público do Rio Grande do Sul como uma "afronta" e "grave violação" dos direitos constitucionais.
"O Ministério Público (...) não se confunde com atitudes facistas de alguns de seus integrantes, que impedem o direito de manifestação e organização e destroem a base do sistema democrático", diz o movimento, em nota assinada pelo advogado Juvelino Strozake.
A seguir, a entrevista com o promotor Gilberto Thums:


O relatório do Ministério Público prevê a dissolução do Movimento dos Sem Terra?

Uma proposta é essa. Existe um conjunto de ações que estão sendo desencadeadas. Foi constatado através de um levantamento que o Ministério Público fez, de que o objetivo do movimento não é a luta pela conquista da terra. O Ministério Público considera hoje o MST um movimento político. Tanto é verdade que eles não fazem nenhuma questão de querer título de propriedade sobre lotes onde estão os assentamentos. Porque para o MST ninguém pode ser proprietário de terra, pois a terra é de todos. Quem consegue o título de propriedade tem que vender o lote para continuar no movimento.
E quais são os objetivos?

Aqui no Rio Grande do Sul eles escolheram territórios estratégicos para ocupação. Um deles, por exemplo, fica em Nova Santa Rita. É um local estratégico. Uma granja que faz divisa com o pólo petroquímico, por onde passa um duto da refinaria (Alberto) Pasqualini e quatro linhas de redes de alta tensão que abastecem dois terços do estado do Rio Grande do Sul. Ali eles também têm acesso ao rio Guaíba. É o melhor lugar que o movimento poderia conseguir para paralisar o Estado. Para o Ministério Público o MST é um braço de guerrilha da Via Campesina. Eles não têm personalidade jurídica e se valem dessa ilegalidade e clandestinidade em que vivem para praticar os atos de vandalismo e destruição. É nítido para qualquer órgão de inteligência no mundo civilizado que tinha um processo de formação de guerrilha. Este movimento busca atentar contra o Estado Democrático de Direito, essa é a verdade.
Em que fase estão as ações do Ministério Público?

A ação ainda não foi ajuizada. O primeiro passo foi a remoção de acampamentos. O segundo passo, a inibição de marchas em locais estratégicos. Um próximo passo, que estamos juntando material para isso, é declarar ilegal o movimento. Somos a favor da luta pela terra. Tudo que é movimento pacífico o Ministério Público apóia. Agora, este movimento perdeu o controle, está além dos limites que se aceitam num Estado Democrático de Direito. Em nenhum lugar do mundo esse movimento seria aceito com essa conformação em que está hoje. Eles se empenham hoje em atos de sabotagem contra instituições, contra as estruturas estatais. Isso não é tolerado em nenhum país civilizado do mundo. Nem na Rússia! (...) A ação principal ainda não foi apresentada. Ela está na fase do levantamento de documentos. Como alguns documentos nos estão sendo sonegados pelas autoridades, nós estamos tentando consegui-los por outros meios.
Não há terra improdutiva no estado?

Não tem. Há um assentamento de terras que foram dadas pela União e pelo estado do Rio Grande do Sul, e dentro dele existe um acampamento. Isso é um absurdo. Inclusive, é ilegal. Sobrevoando a região se vê umas 100 casinhas que foram construídas, mas não plantaram um pé de alface. Ou seja, eles não tornam a terra produtiva, pelo contrário, eles apenas ocupam o espaço físico e abandonam para manter a ocupação territorial e continuam acampados em outras frentes.
Como haveria de fato a dissolução do movimento, já que o MST possui representatividade nacional?

Nós (o Ministério Público estadual) não temos poderes para interferir em outros estados, mas aqui nós vamos iniciar um processo de revés contra eles.
Como?

Nós podemos proibir o poder público de negociar com o movimento, pois vamos entendê-los como sendo uma organização criminosa, porque os objetivos não são lutas pacíficas. Qualquer pessoa que faz o que eles fazem estaria na cadeia. Se nós prendemos um ladrãozinho aí que furta um celular nós o metemos por dois anos na cadeia; se eles depredam e fazem tudo o que querem e não acontece nada, então alguma coisa está errada.
O fato de o movimento não possuir um CNPJ dificulta a ação do Ministério Público?

Nenhuma ação indenizatória pode ser feita. Toda a ação que envolve desocupações é feita mediante identificação de cada um. Vamos partir para a responsabilização individual. Isso para efeitos penais, porque para efeitos civis não podemos fazer nada. São um movimento que aproveitam uma máscara de pele de ovelha, mas por trás, na verdade está um leão feroz. Nosso objetivo é mostrar às claras qual é o objetivo desse movimento.
Por outro lado, a defesa do MST diz ter o apoio do governo gaúcho...

Eles podem ter até o apoio do presidente da República. Nós estamos lutando pelo império da lei. O Ministério Público não está preocupado com as autoridades que apóiam o movimento. Nós estamos usando a Constituição Federal em defesa do Estado Democrático de Direito. A sociedade brasileira está de saco cheio com este movimento, com esta bandeira. Os objetivos estão esgotados. A técnica de atuação é molestar a população. Tivemos um supermercado depredado. A que título? O que o supermercado tem a ver com a ideologia deles? Nada. Por que não invadem o Palácio do Governo então? Qualquer cidadão que entrar num supermercado e pegar um objeto vai preso. Como é que essa gente pode entrar, depredar, invadir, subtrair e não acontece nada? Isso é uma subversão da ordem pública. As coisas se complicaram muito é pela forma de atuação.

no Terra Magazine

A Morte do Bom Senso

Hoje choramos o falecimento de um velho amigo muito querido, o Bom Senso, que esteve em nossa companhia durante muitos anos. Ninguém sabe com certeza qual era a sua idade já que seu registro de nascimento foi perdido há muito tempo nos meandros da burocracia.

Ele será lembrado como alguém que cultuava algumas lições de valor como: saber quando sair da chuva; Deus ajuda a quem cedo madruga; a vida nem sempre é uma festa; e quem sabe a culpa é minha? Bom Senso tinha uma vida simples baseada em fundamentos econômicos sólidos (não gastar mais do que se ganha) e estratégias confiáveis (são os adultos que mandam, não as crianças).

Sua saúde começou a se deteriorar rapidamente quando regulamentos excessivamente autoritários, embora bem intencionados, foram criados. Notícias de que um menino de seis anos fora acusado de assédio sexual por ter beijado uma coleguinha; adolescentes foram suspensos das aulas por usarem líquidos contra o mau hálito após o almoço; e um professor foi despedido por ter repreendido um aluno insubordinado. Tudo isto contribuiu para piorar sua saúde.

Bom Senso perdeu o chão quando pais atacaram professores por fazerem o que eles não tinham feito: disciplinar seus filhos. Piorou mais ainda quando as escolas foram obrigadas a pedir o consentimento dos pais para usar protetores solares ou dar uma Aspirina aos alunos; mas não podiam informá-los quando uma aluna engravidava ou queria abortar.

Bom Senso perdeu a vontade de viver quando as igrejas se tornaram balcões de negócios; e criminosos passaram a receber melhor tratamento que suas vítimas.

Sentiu-se agredido quando soube que não poderia mais se defender de um assaltante que invadiu sua casa e que, caso tentasse, o meliante poderia processá-lo por agressão. Bom Senso finalmente desistiu de viver quando uma mulher se queimou por não perceber que o café estava quente demais, entornou um pouco na sua roupa e imediatamente processou o restaurante que teve que pagar a ela uma enorme indenização.

Bom Senso morreu depois de seus pais, Verdade e Confiança; de sua mulher, Discrição; de suas filhas, Responsabilidade e Razão. Sobreviveram a ele seus irmãos adotivos: Eu Conheço Meus Direitos, Eu Quero Já, O Outro é o Culpado e Eu Sou Uma Vítima.

Poucos compareceram ao seu enterro porque só uma minoria percebeu que ele havia morrido. Se você ainda se lembra dele, re-envie esta notícia. Caso contrário junte-se à maioria e nada faça.

terça-feira, 24 de junho de 2008

Imparcialidade: o Novo Nome do Patrulhamento Ideológico

Já escrevi aqui antes (Ideologia dos Sem Ideologia e Da Necessidade de Tomar Partido) que imparcialidade não é comigo. Aliás, já deixei claro que não acredito na dita-cuja. Pelo menos, não quando se trata de analisar o governo de Lula e do PT. Para estes, reservo minha parcialidade mais estreita, minha ausência de neutralidade mais furiosa. Se eu estiver num debate e o mediador ou quem quer que seja me pedir para ser neutro em relação a eles, eu nem penso duas vezes: levanto da cadeira e vou para casa, pois saberei que estarei diante de mais uma farsa.
A "neutralidade", no tocante aos petralhas, não tem nava a ver com honestidade; pelo contrário: é cumplicidade com o crime e a mentira. Por isso sempre desconfiei de análises ditas "neutras", presentes no discurso "isentista" ou "nenhumladista". É possível ser "neutro" em relação às ditaduras de Hitler e Stálin? Do mesmo modo, não acredito ser possível ser neutro diante de tiranias totalitárias como a dos irmãos Castro em Cuba, ou de seus clones Hugo Chávez e Evo Morales. Assumo inteiramente minha parcialidade, minha posição contrária a tudo isso, em favor da vergonha na cara.
Atualmente, o discurso "isentista" é brandido como um álibi, um pretexto para toda sorte de malandragem, desde que praticada pelos companheiros no poder. "E o escândalo do PSDB no RS, não vai falar nada?". É o que mais se ouve atualmente quando se critica os petistas. Não, não vou falar do caso gaúcho, assim como não vou falar de nenhum caso que sirva para desviar a atenção, por exemplo, do escândalo da venda da Varig. Por um motivo muito simples: os mesmos que tentam a todo custo abafar o caso em Brasília enchem-se de indignação contra a governadora gaúcha. Acreditam que os desvios dos outros justificam e enaltecem os próprios. Mais: fazem com que todos se esqueçam deles. Danem-se os tucanos e os democratas, ex-pefelistas. Os escândalos deles serão apurados, e o dia deles chegará, com certeza. Por ora, o que interessa é desmascarar os petralhas. Não me importo de ser chamado de parcial por causa disso. A mim eles não pautam.
Eis como agem os petistas. Os aliados do governo foram pegos com a mão na massa pilhando o BNDES? Alguém lembra de um caso envolvendo o DEM ou o PSDB. O compadre do presidente age como um PC Farias, mandando e desmandando na venda de uma companhia aérea? É preciso investigar a corrupção do governo paulista com uma empresa francesa, dizem. Os ministros se refestelam com cartões corporativos, pagos com dinheiro público? Que se faça a devassa nas contas do governo anterior, inclusive na forma de dossiês, um instrumento de chantagem. Descobriram que o governo anda fazendo dossiês, uma prática criminosa? Prenda-se quem vazou para a imprensa, não quem o fez (ou mandou fazer). E assim por diante. Antes, faziam questão de se mostrar diferentes, e faziam alarde disso. Agora, esforçam-se para dizer que são iguais a todos. E ai de quem diga que não são! É capaz de ser tachado de "reacionário" e outros títulos do gênero.
O mesmo nos temas de relações internacionais. Há alguns dias, o ditador perpétuo de Cuba, o Coma Andante Fidel Castro, veio da tumba para bater boca publicamente com Caetano Veloso, que teria pedido desculpas aos EUA por causa de uma música sua, "Baía de Guantánamo", em que critica - como se fosse necessário - as violações aos direitos humanos dos prisioneiros. Fidel atacou Caetano por sua suposta concessão ao "imperialismo ianque", porque Caetano, entre outras coisas, reconheceu o óbvio: que, entre a Suprema Corte americana e a castradura cubana, fica com a primeira em matéria de direitos humanos. Para Fidel, só valeria se o baiano mantivesse o que está na letra da música - uma cretinice, aliás, como quase tudo que faz o Goethe de Santo Amaro da Badalação. Enquanto isso, ninguém fala das mais de duzentas Guantánamos existentes em Cuba. Fidel, o imparcial, não aceita que critiquem as violações dos direitos humanos na ilha-prisão. Só em Guantánamo ou em Abu Ghraib.
É esse tipo de patrulhamento ideológico que se esconde - ou nem isso - por trás do discurso da "isenção" ou da "imparcialidade". Existe nisso uma mudança de paradigma. Antes, as patrulhas ideológicas exigiam que não se falasse mal da esquerda. Agora, zelam para que se fale mal também de seus adversários. Isso é sintomático da desmoralização da esquerda nos últimos anos, com a sucessão de escândalos no governo Lula. Se antes eles posavam de santos, clamando contra a podridão moral dos políticos de sempre, agora, desmascarados em sua hipocrisia, não têm outra saída senão apelar para a mediocridade generalizada do "todos são iguais". E parte da imprensa brasileira, obcecada pela busca da tal objetividade, acaba bancando a Suiça e caindo na armadilha.
O que está por trás dessa tal "imparcialidade"? Uma coisa só: salvar a cara dos esquerdistas. Nada mais que isso. A imparcialidade, como já afirmei, é uma espécie de tábua de salvação para os larápios, sempre que eles são apanhados com a mão na massa. Do que eles mais necessitam não é a conversão das pessoas; a imparcialidade destas é suficiente.
Estranha imparcialidade essa, a exigida pelos esquerdistas... É curioso como eles a cobram de órgãos como a Veja e O Estado de S. Paulo, enquanto não parecem muito incomodados com a postura parcial e panfletária - no pior sentido - de revistas como a Carta Capital, a Fórum e a Caros Amigos. Que vivem de subvenções estatais, diga-se de passagem. É que estas, ao contrário da Veja e do Estadão, falam bem do governo, logo podem ser parciais à vontade... Em nome dessa abordagem supostamente imparcial, já tentaram empurrar goela abaixo da sociedade um tal Conselho Federal de Jornalismo e ressuscitar a censura, para impor sua visão "imparcial" à sociedade...
O mais esquisito é que esse pessoal da esquerda se acostumou a falar mal da "mídia" e de todos aqueles que não batem palmas para eles como se fossem inimigos do povo, verdadeiros ogros contra a humanidade, e durante anos isso passou a ser visto como um dogma. Falar mal da Veja ou da Globo, para muita gente ainda hoje, é uma espécie de prova de fidelidade ideológica, um sinônimo de inteligência, de senso crítico e até de bom gosto. Eu mesmo, quando mais novo, vez ou outra me via vociferando contra a revista dos Civita ou contra a Rede Globo, assim como contra a "imprensa burguesa" em geral, e isso já bastava para ser considerado alguém "crítico". Outro dia vi, num desses canais estatais de TV - me recuso a usar o termo "pública" aplicado a esses tevês, pois de públicas elas têm muito pouco - uma menina, filiada ao PCdoB e presidente da UNE, criticando, tatuagem no braço e piercing no nariz, o "monopólio da informação" nas mãos dos "grandes veículos de imprensa" e advogando em defesa da "democratização" dos meios de comunicação no País. Quando um esquerdista fala em "democratização" dos meios de comunicação, pode ter certeza: o que ele ou ela quer é o controle da imprensa pelo Estado. Em outras palavras: estão advogando em causa própria, contra a liberdade de imprensa. Imprensa boa, para esse pessoal, é imprensa a favor (deles, claro). O que é o mesmo que imprensa nenhuma. Para eles, não vale a frase de John Stuart Mill, "A solução para os males da liberdade de imprensa é mais liberdade de imprensa".
Sempre que vejo alguém cobrando "imparcialidade" em relação ao atual governo, coisa que o próprio Lula e os esquerdistas sempre negaram em relação aos demais governos, lembro de outra frase muito boa, do Millôr Fernandes: "imprensa que se preza tem que ser do contra. O resto é armazém de secos e molhados". Imparcialidade, para os petistas, só se for a favor.


por Gustavo Bezerra, em 20/06/2008

Fim do MST?

O Conselho Superior do Ministério Público do Rio Grande do Sul aprovou relatório que pede a "dissolução" do MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra) e já serviu de base para oito ações judiciais contra sem-terra, que incluem proibição de marchas e autorização de despejos e deslocamento de acampamentos.
"Voto no sentido de designar uma equipe de promotores de Justiça para promover ação civil pública com vistas à dissolução do MST e a declaração de sua ilegalidade", afirma o promotor Gilberto Thums, em relatório obtido pela Folha e aprovado por unanimidade pelo conselho no final de 2007.
Os promotores, além de mirar na intervenção de escolas ligadas ao movimento, buscam agora um mecanismo jurídico para apresentar à Justiça o pedido de dissolução do MST. As ações atuais têm o apoio também do governo gaúcho, segundo os sem-terra.
"Nós conseguimos, com a ajuda da Polícia Militar, identificar todos [os militantes do MST]", disse o promotor Thums, que completou: "Quem invadir, quem depredar, quem praticar atos de vandalismo e de sabotagem vai ser preso, pois já estará identificado como integrante desse movimento. Vamos mover processo criminal contra eles".
Para o MST, trata-se da ofensiva jurídica mais dura de sua história. Como contra-ataque, o movimento promete denunciar a ação dos promotores em organismos internacionais, como ONU (Organização das Nações Unidas) e OEA (Organização dos Estados Americanos).
Criado em 1984, o MST não existe juridicamente, portanto não é simples a tarefa de extingui-lo. Numa estratégia de blindagem, justamente contra ações como a do Ministério Público, não há um CNPJ para ser anulado nem presidente para ser preso ou processado.
Para o MST, em termos de "repressão" à sua atuação, a iniciativa dos promotores só fica atrás do massacre de Eldorado do Carajás, quando, em abril de 1996, 19 sem-terra morreram em ação de desobstrução de rodovia pela PM paraense.
"Não há como dissolver o que não existe do ponto de vista legal. Numa hipótese doida, o que eles [promotores] poderiam fazer é [pedir à Justiça] a decisão de proibir todos de se reunirem como MST. A única possibilidade seria essa", disse Juvelino Stronzake, advogado do movimento.
"Se retiramos o massacre de Eldorado do Carajás, esse é o fato mais marcante da história do movimento. É significativo por ser instância do Estado tentando limitar a organização popular. Só tivemos situações como essa, de proibir marchas, na ditadura", completou.
A idéia do Ministério Público do Rio Grande do Sul é chegar ao ponto de proibir qualquer órgão do Estado de negociar contratos e convênios, com o movimento. "Cabe ao Ministério Público agir agora. Quebra a espinha dorsal do MST", diz um dos trechos do relatório.

por Eduardo Scolese, em 24/03/2008, no Folha de São Paulo

O MST, sob diferentes denominações, dedicou uma série de ações à destruição e a invasões de propriedades e de empresas do agronegócio. Das ações anteriores, estas se destacam não apenas por sua abrangência nacional - o que já ocorria -, mas por se concentrarem num leque de empresas e setores do agronegócio e mesmo fora dele, como se o seu alvo fosse propriamente - e explicitamente - a sociedade capitalista e o Estado de Direito.
Um conceito particularmente apropriado para explicar as transformações do campo brasileiro é o de “destruição criadora”, elaborado por Joseph Schumpeter em seu livro Capitalismo, Socialismo e Democracia. O conceito de “destruição criadora” permite pensar os processos de destruição do capitalismo, próprios de seu movimento, que são criadores de novas etapas, que o colocam num patamar mais avançado. Por exemplo, a indústria de máquinas de escrever foi totalmente destruída, com falência de empresas, lojas, acarretando consigo o desemprego correspondente. Ora, essa destruição, num setor da economia, foi devida a novas invenções, particularmente o computador e todo o mundo eletrônico, mediante novas empresas, mais renda e mais emprego, mudando a própria face do capitalismo contemporâneo. Invenções tecnológicas são destruidoras e criadoras ao mesmo tempo, permitindo uma completa remodelação das relações socioeconômicas. O resultado, do ponto de vista social, é o desemprego nos setores destruídos e outras formas de emprego e renda nos setores criados.
Se, no entanto, fizermos como os marxistas, que recortam apenas uma fase deste processo - por exemplo, o período inicial de desemprego e falências, com imagens televisivas e reportagens jornalísticas -, ficaremos apenas com uma face estanque do processo, como se estivéssemos diante de uma crise iminente do sistema, que daria lugar a uma sociedade socialista.
Poder-se-ia aplicar o conceito de “destruição criadora” ao desenvolvimento da economia de mercado no campo brasileiro, em especial ao agronegócio. Com a implantação do capitalismo no campo, rompendo com suas formas não-capitalistas, como a do “latifúndio improdutivo”, opera-se toda uma transformação, com a introdução de novas tecnologias, culturas, formas de cultivo da terra, introdução de transgênicos, mecanização e, também, deslocamento de populações que migraram para os centros urbanos. Há aqui, evidentemente, todo o aspecto destrutivo que é criador de novas relações socioeconômicas, que possibilitaram ao Brasil se tornar um grande exportador de commodities e player internacional. Ora, o que faz o MST? Fixa-se apenas no aspecto da destruição operada, procurando, com sua concepção marxista, criar condições de inviabilização da propriedade privada, da moderna exploração agrícola e do agronegócio. Não percebe - ou não quer aceitar - que foi o próprio capitalismo que eliminou o “latifúndio improdutivo”. Conseqüentemente, o seu objeto de luta se torna o “capitalismo” e o “agronegócio”.
Boa parte dos conflitos fundiários que o Brasil vive atualmente é decorrente do governo anterior, pelo desconhecimento que tinha da verdadeira natureza - digamos, leninista, revolucionária - do MST e de seus apoios partidários. O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, por exemplo, em seu livro A Arte da Política, escreve: “Nem sequer o MST se afirma abertamente socialista, e muito menos comunista.” A simples leitura dos documentos do MST e de seus textos didáticos sinaliza claramente essa orientação socialista e/ou comunista, como se queira chamá-la. O que acontece é que esse setor tucano tinha uma espécie de “óculos” que lhe permitiam ver algumas coisas, e não outras. Foram capturados pelo discurso da “justiça social”, da “reforma agrária”, como se esse fosse puro e evangélico, não encobrindo todo um projeto revolucionário de poder, perseguindo um projeto autoritário, se não totalitário, de tipo socialista e/ou comunista.
Completamente livre em seus movimentos sob o governo Lula, o MST deu pleno curso a suas ações, voltando-se mais diretamente contra as empresas capitalistas, de preferência as mais modernas, abandonando progressivamente a bandeira do “latifúndio improdutivo”. Essa organização política passou a assumir cada vez mais clara e publicamente, e não apenas intramuros, para seus militantes, o seu caráter visceralmente anticapitalista e pró-socialista/autoritário. Suas bandeiras são, agora, as lutas contra o lucro, o agronegócio, as exportações, o modelo econômico, o “neoliberalismo”. Tudo o que cheira a modernidade e inovação é liminarmente recusado. O seu instrumento ideológico de ação é a relativização da propriedade privada, produzindo a insegurança jurídica e violando sistematicamente o Estado de Direito.
A sua finalidade consiste em abarcar todo esse setor da economia brasileira, procurando mesmo, no futuro, talvez imediato, expandi-lo para as zonas urbanas. Signo disso é a aliança entre o MST e uma nova Assembléia Popular, na verdade, o mesmo MST aliado a si mesmo por intermédio da Igreja Católica, que com suas pastorais organiza e apóia essas iniciativas. A Teologia da Libertação e todo um setor esquerdista da Igreja Católica continuam muito atuantes. Com o intuito de aparentar uma diversidade de iniciativas, como se não fosse o próprio MST o organizador dessas invasões, ele se apresenta sob distintas máscaras. Ora aparece o seu braço internacional, a Via Campesina, como se fosse uma iniciativa mundial dos que lutam contra o aumento do preço dos alimentos no mundo; ora o seu braço voltado contra as usinas hidrelétricas, que é quando comparece o Movimento dos Atingidos pelas Barragens (MAB); ora o seu braço da agricultura familiar, o Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA).
O objetivo reside em mostrar à opinião pública que vários setores da sociedade se estão voltando contra o agronegócio e a moderna empresa brasileira.

por Dennis Rosenfeld, em 24/03/2008, no Estado de São Paulo

Vamos lá. O que Dennis Rosenfeld comenta, em seu editorial no Estadão, é o que estamos acostumados a ver aqui: o MST, e todos os braços desse monstro tentacular, incluindo-se aí a guerrilha chamada Liga dos Camponeses Pobres, nada mais é do que um movimento de bandidos, que desprezam as leis e a ordem, a propriedade privada e o Estado de Direito, com as bençãos do PT e de Lula, que os alimenta, farisaica e nababescamente, com o dinheiro dos nossos impostos!
Mas eis que surge, no horizonte, uma luz chamada Gilberto Thums e resolve agir de acordo com as leis, já que "nunca antes neste país" estas foram tão desprezadas por todas as esferas do Poder. O MST deixou de ser um “movimento social” há muito tempo. Suas práticas podem ser caracterizadas, sem exagero, de terroristas.
Além disso, o MST pode não ser uma pessoa jurídica - que é uma abstração -, com CNPJ a caracterizá-lo, mas é composto de pessoas físicas - outra abstração -, reconhecíveis pelo nome, sobrenome, RG e CPF.
Assim, há, basicamente, duas formas de quebrar a espinha dorsal deste "movimento":
1. Enquadrar as pessoas físicas, principalmente os "chefes", que participam de tais violações, pegando-se-as em flagrante, nos muitos crimes cometidos, empregando-se a Lei, de forma imparcial e sem considerações político-ideológicas, como se faria com qualquer outro cidadão normal; ou
2. Atribuir à ela, "ex-oficio", uma razão social (CNPJ), sendo seus "chefes" os donos de tal "empresa", e tendo as mesmas pessoas físicas participantes como "sócios", e processar todos pelos atos ilegais que ora cometem.
Espero que os promotores não recuem de suas decisões e ponham os canalhas no lugar que merecem: a cadeia.

Uma Republiqueta Fiscal

O Banco Mundial, em recente relatório, declarou que o País cresceu, em 2007, menos que a média dos países emergentes e continuará crescendo menos, no ano de 2008. Os números são decepcionantes para o governo Lula. Enquanto a média dos países emergentes foi de um crescimento de 7,4% do PIB, em 2007, e será de 7,1%, em 2008, o PIB brasileiro apresentou um crescimento de 4,8%, em 2007, e deverá crescer apenas 4,5%, em 2008. Nada obstante o presidente Lula esgrimir com dados estatísticos que lhe são contrários, como se fossem favoráveis, o Brasil, em seu governo, cresceu, nos primeiros cinco anos, menos que a América Latina e o Caribe. É de se lembrar que, nos períodos de crise recessiva mundial (1997-2002), o Brasil de Fernando Henrique elevou o seu PIB, no ano de 2002, em 2,7%, enquanto a América Latina e o Caribe tiveram um crescimento negativo de 0,5%. A partir da era Lula, a América Latina e o Caribe sempre estiveram a frente do Brasil, inclusive no ano de 2007, lembrando-se que a Argentina, com toda a crise decorrente do calote financeiro de alguns anos atrás, cresceu 7,8%, em 2007, e crescerá 5,7%, em 2008.
Em outras palavras, o governo Lula, por força do céu de brigadeiro da economia mundial, apresenta números absolutos melhores que seu antecessor e piores em números ponderados e comparativos. Cresceu, proporcionalmente em relação à economia mundial, menos do que o governo anterior, e só apresenta dados positivos ainda, porque copiou, rigorosamente, o modelo econômico de Fernando Henrique, no que diz respeito à política monetária.
Todo o drama brasileiro reside no fato de que o governo não tem projeto, sua política assistencialista e eleitoreira custa-lhe pouco (menos de 1,5% do orçamento federal), a política econômica reproduz o governo anterior e o inchaço da máquina administrativa atrasa o desenvolvimento brasileiro.
Em outras palavras, seu governo ostenta boas realizações (política monetária) e realizações originais (inchaço da máquina), sendo que as boas realizações não são originais (cópia do governo FHC) e as originais não são boas (o aparelhamento do Estado com sindicalistas e não concursados, o que torna a administração ineficiente e atravanca o progresso nacional).
Para sustentar esta incrível, esclerosada e adiposa máquina, que cresce na exata proporção das acomodações políticas para manter a instável e pouco confiável base aliada – constantemente levada às barras dos tribunais, por conduta incompatível com a moralidade pública –, o presidente Lula tem elevado, ano após ano, o peso dos tributos sobre a sociedade brasileira, que gera desenvolvimento e empregos, nada obstante todos os esforços da Administração Pública para atrapalhá-la neste desiderato.
Estou convencido de que o Brasil só não cresce no mesmo nível – detectado pelo Banco Mundial – da Índia (9,0% em 2007 e 8,4% para 2008), China (11,3% em 2007 e 10,8% para 2008), Rússia (7,5% em 2007 e 6,5% para 2008), porque o governo obstaculiza o crescimento. A retirada de recursos da sociedade através de tributos objetiva, primordialmente, assegurar o alargamento da máquina governamental, o festival de desperdícios em festas, cartões de crédito, empreguismo oficial e benesses "pro domo sua", sem na utilização de recursos – não para a saúde ou para investimentos em infra-estrutura no Brasil – mas para doações em benefício do governo cubano do ditador e homicida Fidel Castro, que nos idos de 50 assassinou, sem julgamento, nos famosos "paredons", milhares de seus irmãos de pátria. Desta forma, o contribuinte brasileiro é obrigado a pagar mais do que os contribuintes russos, chineses e indianos e de todos os países da América Latina e do Caribe. A política tributária no Brasil, portanto, é iníqua.
Compreende-se, pois, o esforço hercúleo da administração pública – hoje até com uma força tarefa encarregada de desestruturar o terceiro setor – para liquidar com aquelas entidades tornadas imunes pela Constituição, pois fazem elas o que o governo deveria fazer com os nossos tributos e não faz.
Assim é que instituições hospitalares como as Santas Casas de Misericórdia – que a Constituição pôs a salvo de tributos e que fazem mais pela saúde do que o governo brasileiro – estão sendo vítimas de perseguições tributárias, em face da necessidade pantagruelesca do Estado de retirar cada vez mais tributos do povo brasileiro. São melhores do que os hospitais públicos, assim como atendem mais à população do que o governo. Na visão apequenada dos áulicos governamentais, todavia, é melhor pisotear a Constituição e exigir impostos e contribuições destas entidades – reduzindo, pois, o serviços a serem prestados à sociedade – do que permitir que o terceiro setor continue fazendo bem o que o governo faz mal com os nossos tributos.
O mesmo ocorre com as faculdades e universidades federais e com o ensino público – de boa qualidade, no passado – e que se encontra deteriorado, nada obstante o esforço que reconheço no ministro Fernando Haddad, um dos poucos que se salvam, no emaranhado de aliados não confiáveis e de ocasião do presidente Lula.
No que diz respeito aos direitos do contribuinte, jamais foi ele tão maculado quanto na administração Lula. O direito de "ampla defesa", constitucionalmente assegurado (art. 5º, inciso LV), ano após ano torna-se menos "amplo", ao ponto de ter o Secretário da Receita Previdenciária e Tributária – pessoa inteligente, culta e de fino trato – mudado a composição dos Conselhos do Contribuinte, objetivando torná-lo um órgão homologatório de suas decisões. Autorizou, por outro lado, a Procuradoria da Fazenda Nacional a propor projeto de lei em que o Judiciário é excluído da execução fiscal, podendo a própria PGFN leiloar os bens, independentemente de autorização judicial, amesquinhando o direito do contribuinte, que, se recorrer ao Judiciário e sair vitorioso oito ou dez anos depois, receberá sem correção o produto arrecadado nos leilões judiciais, sempre em valor inferior ao de mercado. Passou-se, agora, a enviar o nome dos presumidos devedores ao Fisco à Serasa, intentando cortar seu crédito junto ao sistema financeiro e nas casas comerciais, reeditando-se, assim, procedimento da Ditadura Vargas (sanções de devedor remisso) que foi fulminado pelo STF. Seu único objetivo é, de resto, desestimular a discussão judicial e obrigar o contribuinte a pagar o que deve e, principalmente, o que não deve. Monta, ainda, operações cinematográficas, com a ajuda da polícia federal e do Ministério Público, contra os contribuintes, que são presos e têm sua imagem denegrida "sem sequer ter havido lavratura de autos de infração". Há inúmeras outras medidas cerceadoras do direito, que podem ser apontadas.
Paralelamente, cresce, preocupantemente, o nível da arrecadação federal. Bate recordes, mês após mês, para sustentar o inútil dinossauro estatal.
Com o nível de arrecadação que possui, à evidência, não precisaria o governo da CPMF, pois só em 2007 arrecadou além de suas próprias previsões, mais do que o valor arrecadado pela referida contribuição (uma vez e meia).
Por esta razão, Brasília não tem qualquer interesse na reforma tributária, pois, se a fizesse, correria o risco de perder sua participação no bolo fiscal, hoje em 60%.
Como Estados e Municípios desejam elevar sua participação, hoje de 40%, na arrecadação tributária, se vier um projeto de reforma tributária só haverá um perdedor: o contribuinte brasileiro, que a deseja para redução e não para aumento da carga.
Valem pouco as promessas do presidente da república, que, como dizia Roberto Campos, "apenas comprometem quem as recebe e não quem as faz". Tanto é assim que, apesar de ter prometido não aumentar o nível impositivo, nem ofertar novos pacotes, ao negociar com a oposição a aprovação da DRU, maculou sua credibilidade, lançando um pacote e elevando a CSLL e o IOF, poucos dias depois.
Com ameaças de cortes nas despesas do Judiciário, espera o governo compelir o STF a encontrar solução jurídica para manter os aumentos do início do ano.
O certo é que a palavra oficial não é confiável, a política tributária não existe – há apenas um fantástico e, muitas vezes, ilegal esforço de arrecadar mais, sem qualquer compromisso com o desenvolvimento nacional ou a justiça fiscal –, o País cresce pouco em comparação com seus concorrentes diretos entre os emergentes (Rússia, China e Índia), e quase nada se fez para a infra-estrutura. Já se vê o risco de apagão e aumento de mortes nas rodovias federais e outras deficiências da falta de investimentos públicos, nos últimos cinco anos.
Nesta republiqueta fiscal em que vivemos, em que os tributos são fundamentalmente destinados a sustentar uma máquina esclerosada, assim como os amigos de Cuba, da Bolívia e o futuro Banco de Chávez, a "sorte" do presidente Lula, com o sucesso da economia mundial em seu mandato, no qual o Brasil progrediu por força do "efeito maré", pode vir a mudar, se realmente o desenvolvimento mundial decrescer em 2008.
Para o bem do Brasil, gostaria que seu estilo de governo mudasse, o que é pedir muito. Torço apenas para que, pelo menos, sua "sorte" continue.


por Ives Gandra da Silva Martins, Professor Emérito das Universidades Mackenzie, UNIFMU, UNIFIEO, UNIP e das Escolas de Comando e Estado Maior do Exército-ECEME e Superior de Guerra-ESG, Presidente do Conselho Superior de Direito da Fecomercio e do Centro de Extensão Universitária - CEU.

segunda-feira, 23 de junho de 2008

Contra o Comunismo

"Sou contra todos os tipos de ditadores. Sou contra o comunismo".

Fidel Castro, em Abril de 1959, em Washington

A União Soviética

A maior sandice socialista/comunista é o uso malicioso da palavra "imperialismo", referindo-se, particularmente, aos Estados Unidos, que venceram duas guerras mundiais e não se apropriaram de nem um metro quadrado de território estrangeiro, enquanto que a extinta URSS, após a II Guerra Mundial, anexou dezenas de países e os manteve subjugados, a poder de fuzis e tanques, como Hungria, Checoslováquia e Alemanha Oriental.
No entanto, esquerdistas de todo o mundo referem-se aos Estados Unidos como país imperialista e esquecem-se que a URSS, esta sim, a nação mais imperialista de todos os tempos, anexou tantos países que chegou a atingir 21 milhões de quilômetros.

1.INTRODUÇÃO
União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS) (em russo, Soiuz Sovietskikh Sotsialisticheskikh Respublik), Estado federal plurinacional criado como resultado da Revolução Russa em 1917 no território do antigo império russo, fundado com tal denominação em dezembro de 1922. A URSS começou com a conquista do poder pelo Congresso dos Sovietes de toda Rússia, dirigido pelo partido bolchevique, que promulgou imediatamente uma série de decretos através dos quais a Rússia deixaria de combater na I Guerra Mundial, toda terra seria nacionalizada e se constituiria o Conselho dos Comissários do Povo (Sovnarkom), que atuaria como primeiro governo dos trabalhadores e dos camponeses presidido por Lenin. Os sovietes garantiram o direito à igualdade e à autodeterminação das numerosas nacionalidades. A primeira nação a tirar proveito desta situação foi a Finlândia, onde foi estabelecido um governo nacional e reconhecida a independência. As idéias fundamentais foram reconhecidas na Constituição de 1918, que proclamou a República Socialista Federativa Soviética da Rússia (RSFSR).

2.O TRATADO DE PAZ
As negociações de paz com a Alemanha se iniciaram em 1917. Os termos da paz apresentados pelos alemães no Tratado de Brest-Litovsk eram inaceitáveis; entretanto, concluiu-se um tratado segundo o qual a RSFSR cedia a Ucrânia, a Polônia e os estados bálticos, o que provocou o rompimento do Partido Socialista Revolucionário e a resposta dos bolcheviques no chamado Terror Vermelho. A RSFSR se transformou em um Estado com regime de partido único, o Partido Comunista Russo (bolchevique), nome adotado pelo Partido Trabalhista Social-democrata Russo (POSDR) em 1918.

3.A GUERRA CIVIL
A política social e econômica provocou a Guerra Civil e a intervenção das potências estrangeiras. Apesar dos reveses iniciais, os bolcheviques conseguiram repelir esses ataques no início de 1920 e as tropas soviéticas, reorganizadas por Leon Trotski em 1918 com o nome de Exército Vermelho, iniciaram a contra-ofensiva. A guerra com a Polônia terminou com a assinatura, em 1921, do Tratado de Riga, e a Guerra Civil após a expulsão das tropas de ocupação japonesas da Sibéria oriental no final de 1922. O denominado “comunismo de guerra” arruinou por completo a economia do país e Lenin adotou a denominada Nova Política Econômica (NEP) em 1922.

4.A ÉPOCA DE STALIN
Na luta pelo poder desencadeada após a morte de Lenin em 1924, Josef Stalin obteve o apoio da maioria no Partido Comunista. A partir de então, começou a série de expurgos que caracterizariam os 25 anos de mandato stalinista. Trotski foi proscrito na União Soviética e, em 1940, assassinado no México.

5.A FUNDAÇÃO DA URSS
Durante a década de 1920, aconteceram mudanças radicais na administração governamental e ocorreram melhorias notáveis na economia nacional e nas relações internacionais. A Constituição de 1924 reorganizava os territórios sob controle soviético em torno do novo Estado.

6.A TRANSFORMAÇÃO ECONÔMICA
Em 1928 teve início um período de economia planificada dirigida a partir do Comitê de Planificação Estatal (GOSPLAN, criado em 1921), colocando em prática o primeiro dos planos qüinqüenais aplicados por Stalin. Cada um desses planos, que duravam 5 anos, aplicava uma série de programas para desenvolver a economia nacional. Os objetivos básicos eram transformar a URSS de um país agrícola em uma potência industrializada, completar a coletivização da agricultura e transformar profundamente a natureza da sociedade.

7.O GRANDE EXPURGO
Em meados da década de 1930, a política soviética foi caracterizada pelos drásticos expurgos de todos os elementos supostamente contrários à política stalinista. Os denominados “processos de Moscou” suscitaram críticas em todo o mundo ao regime soviético, que ficou seriamente debilitado pelas numerosas execuções.

8.A POLÍTICA EXTERNA
Do ponto de vista soviético, os acontecimentos internacionais ocorridos durante a década de 1930 colocaram em crescente perigo a segurança da URSS. A ocupação japonesa da região de Dongbei Pingyuan ou Manchúria em 1931 e a ascensão de Hitler na Alemanha supuseram uma ameaça para a segurança soviética. Buscando estabelecer alianças com outras potências para resistir à ofensiva fascista, especialmente com a França e a Grã-Bretanha, a URSS ingressou na Sociedade das Nações em 1934. No verão de 1938 se originou uma grave crise quando o governo alemão exigiu do governo da Tchecoslováquia a cessão dos Sudetos. O resultado da tímida postura adotada pela França e Grã-Bretanha foi o Pacto de Munique, que assegurava a cessão dos territórios em litígio à Alemanha.

9.A II GUERRA MUNDIAL
A guerra fronteiriça contra o Japão e a inquietação diante dos progressos alemães em 1939 provocaram a assinatura de um pacto de amizade e de não-agressão entre a Alemanha e a URSS (conhecido como Pacto Ribbentrop-Molótov) que, em uma cláusula secreta, determinava a partilha da Polônia e as esferas de influência de ambos os países na Europa Oriental. Em 1º de setembro, a invasão alemã da Polônia levou a França e a Grã-Bretanha a declararem guerra a esse país. Assim começou a II Guerra Mundial. Dezesseis dias mais tarde, o Exército Vermelho ocupava a parte oriental da Polônia. A ocupação do leste da Polônia foi a primeira de uma série de anexações territoriais que afetaram a Estônia, a Letônia, a Lituânia, a Carélia, a Bessarábia e a parte setentrional da Bucovina. Os pactos de não-agressão impostos pela URSS aos países bálticos lhe deram o direito de estacionar tropas nesses territórios. No final de 1939, o governo soviético exigiu da Finlândia a cessão do istmo da Carélia, o que originou a Guerra Russo-finlandesa. Segundo os acordos do tratado de paz, a URSS ficou com os territórios do istmo da Carélia e o porto de Viborg. Ao mesmo tempo, dirigiu seus objetivos para os Balcãs. Exigiu da Romênia a devolução da Bessarábia e a entrega do norte da Bukovina. Entretanto, em 1941 firmava com o Japão um pacto de neutralidade. Em junho deste ano, a Alemanha invadiu a URSS, e em janeiro de 1942, após aceitar os princípios da Carta do Atlântico, o governo soviético e outros 25 governos dos países aliados assinaram uma declaração através da qual se comprometiam a cooperar na guerra contra as potências do Eixo. Enquanto no norte os alemães freavam seu avanço para Moscou, no sul foram finalmente detidos e derrotados na épica batalha de Stalingrado (hoje Volgogrado). Em 8 de maio de 1945 acabou a guerra na Europa. Três meses mais tarde, segundo um tratado secreto, a URSS declarou guerra ao Japão e ocupou grande parte da região de Dongbei Pingyuan ou Manchúria, da Coréia do Norte, das ilhas Kurilas e a parte meridional da ilha Sakhalin. No final da guerra foi reconhecida como uma das grandes potências mundiais e participava junto aos chefes de governo dos Estados Unidos e da Grã-Bretanha das conferências de Teerã, Ialta e Potsdam para estabelecer uma política comum. Em 1947, já havia sido desenhada a chamada Cortina de Ferro.

10.O INÍCIO DA GUERRA FRIA
O governo soviético encarou os problemas do pós-guerra com uma política expansionista destinada a aumentar os territórios controlados pelos governos comunistas leais, fortalecer sua segurança na previsão de futuras agressões e utilizar o movimento comunista internacional como instrumento para incorporar outros países a sua órbita, o que gerou o conflito conhecido como Guerra fria. Em 1948, a Tchecoslováquia caiu sob o controle da URSS. Em troca, a Iugoslávia, dirigida pelo marechal Tito, foi expulsa da Oficina de Informação Comunista (Kominform) e Tito se transformou no porta-voz máximo do não-alinhamento durante a Guerra fria. Essa situação conduziu à criação da Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN) em 1949. A URSS, por sua vez, fundou nesse mesmo ano o Conselho de Ajuda Econômica Mútua (COMECON) para coordenar a atividade econômica dos Estados sob seu controle. As relações com a China durante esse período foram conciliatórias e o Exército vermelho se retirou da Manchúria.

11.A LUTA PELA LIDERANÇA
Com a morte de Stalin, Georgi Maximilianovitch Malenkov, Lavrenti Beria, Kliment Vorochilov, Nikita Khrutchev, Nikolai Aleksandrovitch Bulganin e Lazar M. Kaganovitch ocuparam os cargos mais relevantes, embora de imediato surgisse uma luta pelo poder, que em 1957 acabou nas mãos de Khrutchev. Em uma surpreendente manobra realizada no XX Congresso do PCUS (1956) diversos líderes comunistas, como Khrutchev, denunciaram a política de Stalin e repudiaram grande parte do que ela representou. Khrutchev foi destituído no mês de outubro de 1964 por conta do progresso insatisfatório da agricultura e da indústria, e pelos desastres na política externa. Aleksei Nikolaievitch Kosiguin foi nomeado primeiro ministro. Em 1977, Brejnev tornou-se chefe do Estado e promulgou uma nova Constituição. Iuri Andropov, antigo chefe da polícia secreta soviética (KGB), ocupou a secretaria geral do partido. A rápida industrialização obtida graças aos planos qüinqüenais de Stalin transformou o país na segunda potência industrial e militar do mundo.

12.O DESENVOLVIMENTO CULTURAL
A partir de meados do século XX, o governo soviético pretendeu que os cidadãos das diversas nacionalidades da URSS participassem da cultura de uma sociedade comunista homogênea, conservando ao mesmo tempo as tradições específicas de cada povo ou nacionalidade. Como resultado dessa política o analfabetismo foi erradicado. Os avanços no campo das ciências naturais foram notáveis, destacando áreas como a química e a física. Prestou-se grande atenção à energia nuclear e à exploração do espaço. O governo insistiu que todos os aspectos da cultura soviética deviam fomentar a sociedade comunista. Essa premissa não supôs um sério condicionante para a ciência, apesar da atitude do governo produzir personalidades como Trofim Lissenko, Sergei Prokofiev e Dimitri Chostakovitch, mostrando como os valores políticos podiam afetar as concepções científicas ou artísticas. As belas-artes e a literatura sofreram graves limitações por conta das exigências do realismo socialista. Durante a década de 1920 a arte modernista russa conheceu uma idade de ouro, mas foram proibidas a literatura de vanguarda e as obras pictóricas de Marc Chagall, Kazimir Malevitch e Wassily Kandinsky, entre outros. Centenas de dissidentes foram cassados, detidos e enviados para instituições psiquiátricas ou campos de trabalhos forçados. Os mais distinguidos foram o escritor Aleksandr Isaievitch Soljenitsin e o físico nuclear Andrei Sakharov.

13.RELAÇÕES COM OS PAÍSES SATÉLITES
A criação do Pacto de Varsóvia em 1955 como aliança militar que integrava à URSS seus países satélites, foi a resposta à OTAN e serviu para fortalecer o controle soviético sobre o Leste Europeu. A Revolução Húngara no final de 1956 provocou a intervenção das tropas soviéticas, que esmagaram brutalmente o movimento e impuseram um governo de marionetes presidido por János Kádár. Na Tchecoslováquia a crise do verão de 1968 foi respondida com a invasão e ocupação de aproximadamente 600.000 soldados soviéticos e do Pacto de Varsóvia. Essa repressão teve conseqüências negativas para os partidos comunistas de muitos países distantes do bloco soviético. Entretanto, a Conferência sobre Segurança e Cooperação na Europa, celebrada em Helsinki (Finlândia) em 1975, ratificou aparentemente o domínio soviético no Leste Europeu.

14.RELAÇÕES COM A CHINA
Em 1949, a URSS reconheceu plenamente o governo chinês de Mao Zedong (Mao Tsé-tung), aliou-se a ele e continuou exigindo que substituísse na ONU o governo nacionalista de Jiang Jieshi (Chiang Kai-shek), estabelecido em Taiwan. Ambos os países apoiaram a Coréia do Norte durante a guerra da Coréia, mas a URSS negou, em 1959, ajuda a China para o desenvolvimento de seu poderio nuclear. Ao crescer em intensidade, o conflito ameaçou, inclusive, culminar em uma guerra entre os dois países. A visita do presidente norte-americano Richard Nixon a China em 1972 alarmou ainda mais a URSS sobre a possibilidade de um realinhamento das potências.

15.RELAÇÕES COM OUTRAS NAÇÕES ASIÁTICAS
Em 1950, a URSS reconheceu as forças comunistas vietnamitas de Ho Chi Minh. Em 1954, participou do Acordo de Genebra que dividiu o país em Vietnã do Norte e Vietnã do Sul, e continuou apoiando o primeiro. Durante a guerra do Vietnã entrou em conflito com os Estados Unidos e após a vitória norte-vietnamita manteve seu apoio em sua luta contra a China. As relações com outros países asiáticos foram conciliatórias, mas também agressivas. Em 1966, foi mediadora no confronto entre a Índia e o Paquistão pela região de Kashmir, que terminou com a criação do Estado de Bangladesh em 1971. Por outro lado, a URSS se negou a devolver ao Japão as estratégicas ilhas Kurilas. E em 1979 as tropas soviéticas ocuparam o Afeganistão.

16.PENETRAÇÃO NA ÁFRICA
A influência soviética na África sofreu dois notáveis contratempos durante a década de 1960. O primeiro ministro da República Democrática do Congo, o pró-soviético Patrice Lumumba, foi assassinado em uma revolta em 1961. Em Gana, Kwame Nkrumah e seu governo comunista foram derrotados e os assessores soviéticos expulsos. Entretanto, durante a década de 1970 a URSS, com a ajuda das tropas cubanas, conseguiu colocar no poder um governo pró-soviético em Angola e ajudou a Etiópia a expulsar os somálios. Respaldou a antigovernamental Frente Patriótica da Rodésia (hoje Zimbábue) e grupos similares na África do Sul. A URSS apoiou o Egito quando nacionalizou o canal de Suez em 1956, ajudou na construção da represa de Assuã e respaldou os egípcios na guerra dos Seis Dias (1967). Mas em 1977, Anwar al-Sadat ordenou à URSS fechar seus consulados e cessar todas suas atividades culturais. Os assessores soviéticos também foram obrigados a abandonar o Sudão e a Somália.

17.RELAÇÕES COM A EUROPA OCIDENTAL
Em 1970 os governos da URSS e da Alemanha Ocidental assinaram um tratado pelo qual renunciavam ao uso da força e aceitavam as fronteiras européias existentes naquele momento, inclusive a fronteira Oder-Neisse entre a Alemanha Oriental e a Polônia.

18.RELAÇÕES COM OS ESTADOS UNIDOS
Em 1962 a URSS e os Estados Unidos sofreram uma grave deterioração de suas relações como conseqüência da denominada crise dos mísseis de Cuba. Um ano depois, a URSS firmou um acordo com os Estados Unidos e a Grã-Bretanha pelo qual estavam proibidas todas as provas nucleares, exceto as subterrâneas. Além disso, uniu-se aos Estados Unidos no compromisso de manter livre o espaço de todo tipo de armamento. As negociações, iniciadas em 1969 sobre a redução de armas nucleares de longo alcance, conhecidas como Conversações para a Limitação das Armas Estratégicas (SALT), foram concluídas em acordos posteriores que limitavam o número de mísseis e silos nucleares. Apesar de certos focos de tensão, Jimmy Carter e Brejnev alcançaram um acordo que se materializou no novo tratado SALT em 1979, mas o Congresso norte-americano não o ratificou em virtude da intervenção do Exército soviético no Afeganistão.

19.A ERA GORBATCHOV
Konstantin Ustinovitch Tchernenko, que faleceu treze meses antes de ser eleito chefe de Estado, foi substituído em 1985 por Mikhail Gorbatchov. Os planos de Gorbatchov exigiam a perestroika (“reestruturação”) da economia nacional e uma glasnost (“abertura”) na vida política e cultural. Em 1989, o povo soviético participou das primeiras eleições livres celebradas desde 1917 e elegeu um renovado Congresso de Deputados do Povo. Dois trágicos acontecimentos dificultaram o processo de reformas: o grave acidente ocorrido em 1986 na central nuclear de Chernobyl, que causou sérios danos ao meio ambiente e revelou graves deficiências no programa nuclear soviético; e o terremoto na Armênia em 1988, que provocou mais de 25.000 mortes e deixou, pelo menos, 400.000 pessoas sem lar. Nesse mesmo ano se chegou a um acordo para a retirada das tropas soviéticas que ocupavam o Afeganistão. Entre 1985 e 1991, Gorbatchov celebrou diversas reuniões com os presidentes norte-americanos Ronald Reagan e George Bush, e assinou um tratado que colocaria fim à produção de armas químicas e um acordo para uma redução substancial das armas nucleares estratégicas. Gorbatchov anunciou na Assembléia Geral das Nações Unidas a redução unilateral de armas convencionais, em especial no Leste Europeu e na fronteira chino-soviética. Durante sua visita à Pequim em 1989, a China e a URSS concordaram em reatar as relações após trinta anos de conflito. Em um encontro com o papa João Paulo II, prometeu garantir a liberdade religiosa na URSS e concordou em estabelecer relações diplomáticas. As relações com Israel também melhoraram notavelmente ao flexibilizar as restrições de migração aos judeus russos. No conflito do Golfo Pérsico em 1990, a URSS apoiou a política do governo dos Estados Unidos de utilizar a pressão econômica e militar para forçar a retirada iraquiana do Kuwait.

20.O COMUNISMO EM CRISE
Diferentemente de épocas passadas, a URSS se negou a intervir no processo de reformas no Leste Europeu entre 1989 e 1991, que colocaram um fim aos governos comunistas da Polônia, Hungria e Tchecoslováquia, e culminaram com a reunificação da Alemanha. O COMECON e o Pacto de Varsóvia foram dissolvidos. Em 1990, em um processo de deterioramento cada vez maior da economia soviética, o Partido Comunista concordou em ceder seu monopólio político. Em 11 de março a Lituânia declarou sua independência desafiando as sanções impostas por Moscou. A partir desse momento os grupos nacionalistas e os movimentos separatistas também atuaram em outras repúblicas e as explosões de violência étnica se tornaram cada vez mais freqüentes. Em agosto de 1991 a ala ortodoxa comunista deu um golpe de Estado e tentou reinstaurar o controle centralizado comunista. Em três dias os reformistas, liderados por Boris Yeltsin, detiveram o golpe e começaram a desmantelar o aparato do partido. Com a URSS a beira do colapso, o Congresso dos Deputados do Povo concordou em 5 de setembro em estabelecer um governo provisório no qual o Conselho de Estado, liderado por Gorbatchov e composto pelos presidentes das repúblicas participantes, exerceria poderes de emergência. A crescente influência de Yeltsin acabou com a de Gorbatchov e o governo da Federação Russa assumiu os poderes que havia exercido o desaparecido governo soviético. Em 21 de dezembro de 1991, a URSS deixou formalmente de existir. Onze das doze repúblicas que permaneceram concordaram em criar a chamada Comunidade dos Estados Independentes (CEI). Gorbatchov renunciou em 25 de dezembro e no dia seguinte o Parlamento soviético proclamou a dissolução da URSS.