segunda-feira, 7 de dezembro de 2009

Honduras, Lula e o Respeito às Constituições

Este post foi feito pelo Gustavo Bezerra, do Blog do Contra, no dia 04/11. Leiam atentamente! Esta é a Verdade e o porquê os esquerdistas tanto lutaram contra Honduras. Os grifos, como sempre, são meus.


Acabou a comédia em Honduras. Por 111 votos a 14 - repito: 111 a 14! - o Congresso do país decidiu, ontem, pela não restituição do golpista Manuel Zelaya à presidência da República. De quebra, ainda manteve todas as acusações contra ele, como tentativa de violação da Constituição e traição à pátria. Não só ele não irá voltar ao poder, como permanece um fora-da-lei.

O processo de afastamento de Zelaya foi limpo e transparente. A decisão do Congresso de ratificá-lo ocorreu inteiramente dentro do estipulado pelo Acordo de San José-Tegucigalpa, que, ao contrário do que andaram espalhando os zelaystas de lá e de cá, não previu, em momento algum, o retorno de Zelaya como pré-condição para qualquer coisa. Com o detalhe de que a votação no Congresso foi uma exigência dele, Zelaya, pois o governo interino de Roberto Micheletti queria que a decisão fosse da Suprema Corte do país (e - vejam só - dos 25 parlamentares zelaystas, 11 votaram CONTRA a volta de Zelaya à presidência). O calendário eleitoral foi mantido e as eleições presidenciais - das quais participaram dois candidatos aliados de Zelaya - transcorreram de forma limpa e democrática, normalmente, apesar das ameaças dos zelaystas. A vontade popular não cedeu às pressões da "comunidade internacional", e elegeu um candidato adversário do zelayismo. Apesar de tudo, o país resguardou sua soberania e a democracia. Não há o que contestar.

É a derrota total dos bolivarianos. E é a maior humilhação da política externa petista, talvez a maior da História da diplomacia brasileira. O governo Lula permitiu que a embaixada do Brasil em Tegucigalpa fosse transformada em escritório político de Manuel Zelaya. Agora as principais instituições do país vêm confirmar aquilo que este escriba e mais uma meia dúzia de blogueiros vêm dizendo desde o dia 28 de junho: a deposição de Zelaya foi legal. O Brasil abrigou um golpista. Não só isso: interveio diretamente nos negócios políticos de Honduras. Um vexame total.

Você deve estar se perguntando: afinal, o que levou a diplomacia brasileira a cometer erro tão grosseiro, enterrando sua credibilidade e reputação em Honduras? A resposta pode ser encontrada num episódio acontecido no Brasil em 2003.

Era o começo do governo Lula. A lua-de-mel deste com a imprensa estava no auge. Praticamente não passava um dia sem que algum jornalista basbaque falasse na onda de "esperança" criada pela eleição do "presidente-operário" etc. Foi então que um jornalista estrangeiro - norte-americano, para ser mais exato - resolveu botar um pouquinho de areia no oba-oba generalizado. Ele começou a publicar no jornal para o qual trabalhava umas matérias meio esquisitas: em vez de enaltecer o "primeiro-presidente-de-origem-popular-da-história-do-Brasil" e outras patacoadas do tipo, ele publicou umas reportagens em que descrevia o hábito do presidente de tomar uns uísques e rabos-de-galo, e a preocupação de alguns políticos de que o presidente estava "passando da dose" em suas jornadas etílicas.

O governo chiou. O presidente da República quis saber quem era aquele gringo atrevido, que ousava chamá-lo de bêbado na imprensa. Disse que queria vê-lo expulso do Brasil. Ficou sabendo que ele era casado com uma brasileira, logo, pela Constituição de 1988, não poderia ser expulso do País. Não adiantou. Lula bateu pé. Tamanha ofensa ao supremo mandatário da nação não poderia ficar impune, vociferou, espumando de ódio. Diante da informação de que havia um impedimento constitucional à expulsão do jornalista estrangeiro, ele não titubeou:
Lula replicou, batendo na mesa, berrando, exaltado: "Que se foda a Constituição! Quero que ele vá embora!"

A frase acima, incluindo o relato completo do episódio, está no livro Deu no New York Times (Rio de Janeiro, Objetiva, 2008), na página 186. O jornalista em questão, e autor do livro, chama-se Larry Rohter, ex-correspondente do NYT no Brasil. Ele foi expulso do País por ordem de Lula.
O que isso tem a ver com o fracasso do Itamaraty lulista em Honduras? Tudo. Leiam novamente a frase de Lula, e como ele "resolveu" a questão. Lula passou por cima da Constituição do Brasil para se livrar de um jornalista que o incomodava. Mostrou, enfim, total desprezo pela Carta Magna do País. Se ele está se lixando para a Lei Maior do Brasil, por que haveria de se preocupar com o que diz a Constituição de um país insignificante como Honduras?

Em Honduras, Manuel Zelaya, com apoio de Hugo Chávez, quis fazer algo proibido pela Constituição hondurenha. Tentou rasgar uma cláusula pétrea da Constituição (não importa se essa tal cláusula pétrea não existe em outras constituições: o fato é que ela existe na de Honduras). Por isso foi deposto. O governo Lula, juntamente com Chávez e outros governos latino-americanos, além da OEA e da ONU e, num primeiro momento, também os EUA, condenaram imediatamente o "golpe militar" e passaram a exigir a volta de Zelaya. O Brasil, em particular, esperava que ninguém se lembrasse de ler a Constituição de Honduras. Como quase ninguém o fez nos primeiros dias, durante algum tempo a tese do "golpe" se impõs e se criou um quase-consenso da "comunidade internacional" contra o "governo golpista" de Honduras e a favor de Zelaya.

O que levou a esse consenso fabricado, que pareceu convencer a todos, durante certo período, de que houve "golpe" em Honduras, resultando em uma das maiores pressões internacionais a que um país foi submetido nos últimos tempos? Apenas isso: a pura e simples ignorância do que diz a Constituição hondurenha, em especial seu artigo 239, que pune com a perda IMEDIATA do mandato quem propuser a reeleição do presidente da República. O governo brasileiro, assim como o venezuelano e o nicaragüense, acreditou que ninguém se daria à pachorra de ler o que está lá escrito. Daí ter martelado, insistentemente, a tese do "golpe" contra Zelaya, contra todas as evidências. Contou para tanto com um erro dos militares que, atendendo à determinação judicial, detiveram Zelaya: em vez de tê-lo prendido e levado a julgamento, onde deveria estar agora, eles o expulsaram do país, dando munição aos bolivarianos, que passaram a dizer que houve golpe porque, afinal, o presidente "foi deposto e expulso de pijamas". Desse modo, os defensores de Zelaya deram uma contribuição completamente original à Ciência Política, criando a teoria do pijama. Segundo esta, o que caracteriza golpe de Estado não é a ruptura da ordem legal, mediante, por exemplo, a tentativa de convocação de uma consulta inconstitucional, mas algo muito mais importante e transcendente - o tipo de roupa que o presidente está usando na hora de sua deposição...

A farsa, felizmente, não durou muito. Quando parecia que Zelaya voltaria na marra, tendo retornado clandestinamente ao país em um plano arquitetado por Hugo Chávez e Daniel Ortega, e instalando seu QG político na embaixada do Brasil, de onde passou a incitar a uma guerra civil no país e defender teorias sobre raios de alta freqüência e mercenários israelenses, eis que a verdade, essa dama indócil, pediu passagem. Foi então que alguns começaram a dizer Epa! e lembraram que Honduras, ao contrário do que diziam os bolivarianos e a "comunidade internacional", tem, vejam só!, uma Constituição. Isso mesmo, senhores: HONDURAS TEM UMA CONSTITUIÇÃO! E ELA DEVE SER RESPEITADA!

Súbito, o governo de Barack Obama, até então cúmplice e avalista da fraude, percebeu que dar apoio a um golpista travestido de democrata contra um país que lutava para preservar suas instituições era demais até para ele, Obama, e se rendeu ao óbvio: a volta de Zelaya e seu abrigo na embaixada brasileira foi uma irresponsabilidade, para usar a linguagem diplomática, e o melhor caminho para encerrar a crise era garantir a realização das eleições e reconhecer o resultado das urnas. Os EUA, enfim, se deram conta que Honduras tem instituições. Outros países, como Colômbia e Peru, também fizeram o mesmo. Menos o governo do Brasil, que insiste na pantomima, e agora está bufando de raiva contra os "golpistas" que impediram seu golpista de estimação de rasgar as leis do país.

Assim como aconteceu no episódio de Larry Rohter, o fiasco brasileiro em Honduras demonstra aquilo que somente a cegueira voluntária ou a cretinice irremediável, além, claro, da safadeza ideológica, ainda insistem em esconder: em um e em outro caso, o que guiou a política brasileira foi a arrogância presidencial, o supremo desdém petista pela democracia e pelas instituições em nome de um projeto ideológico e pessoal. Em outras palavras: se em 2003 Lula esbravejou contra a Constituição brasileira, que o impedia de expulsar um jornalista incômodo, em 2009 o Itamaraty petista justificou seu apoio incondicional ao golpismo bolivariano batendo na mesa e berrando: "Que se foda a Constituição de Honduras! Queremos que ele, Zelaya, volte ao poder!"

Agora, derrotado e cada vez mais isolado na questão, o que fará o governo brasileiro com Manuel Zelaya e sua trupe, aquartelados na embaixada em Tegucigalpa? Talvez seja melhor contratá-lo para o serviço diplomático, já que o governo Lula se recusa a lhe conceder o asilo político. Ou, então, fechar de vez a embaixada, transformando-a no que ela já é há mais de 70 dias: um cortiço e comitê eleitoral dos zelaystas. Que tal enviar para lá Lula, Celso Amorim e Marco Aurélio Garcia, para fazer companhia ao golpista frustrado e a seus militantes? Estes poderiam ficar lá indefinidamente, e até reproduzir-se, criando uma espécie nova, cada vez menos bípede. Quem sabe o Brasil poderia até ganhar uma graninha, cobrando ingresso para que todos vejam essa nova espécie, os bolivarianos que se recusam a ler o que diz as constituições de seus próprios países e enxergam democracia na Venezuela e no Irã, mas não em Honduras. Nem seria necessário se preocupar com a alimentação: os jardins da embaixada, com seus gramados, poderiam fornecê-la em abundância.

O governo Lula participou ativamente de uma das tentativas de fraude mais toscas de todos os tempos. Raras vezes a política externa de um país desceu tão baixo, cobriu-se de forma tão ignominiosa de vergonha e de ridículo.

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