segunda-feira, 7 de dezembro de 2009

A Camarada Estela Tem Idéias Próprias!

Nas inserções do horário político na TV, já dá para ver uma Dilma Rousseff com banho publicitário: a voz menos metálica, a expressão serena, a fala pausada… E, como não poderia deixar de ser, ela se coloca como discípula de Lula, que “ensinou o caminho” — mais um pouco, e o marqueteiro João Santana acrescenta: “a verdade e a vida”… Lula quer ser Cristo. Ele só daria no pé na hora da crucificação. Preferiria fazer um acordo com Judas…

É a Dilma para o povo. Para os formadores de opinião, a receita do vídeo ganhou um ingrediente novo. Não que o PT, no íntimo, dê muita bola aos ditos-cujos — afinal, para eles, só uma pessoa forma opinião: Lula —, mas há certo temor de que cole na candidata a pecha de que não tem vontade própria, de que não existe como ser autônomo.

Na viagem de trem entre Berlim e Hamburgo, ontem, Dilma foi sozinha ao vagão dos jornalistas — sem Lula. E respondeu a uma pergunta sobre Honduras. Assim:

“Veja bem, em Honduras, nós não estávamos discutindo eleição. Nós estávamos discutindo um golpe de estado, né? Há uma diferença muito grande entre uma coisa e outra. Uma coisa é o seguinte, é um golpe. Outra coisa é a discussão… Tanto é que eu acho que esse novo processo aí vai ter de ser considerado. Houve uma eleição. Agora, nós divergimos e continuamos divergindo é em chamar o governo do Micheletti, né?, de algo que não fosse um golpe de estado” (o vídeo do Jornal Nacional está abaixo).


Primeira coisa a observar para quem assistiu ao vídeo. Aquela Dilma já filtrada pela propaganda também estava no trem. Nunca se viu um ser tão manso, tão doce, tão caroável. Parecia sinceramente interessada no assunto e em se fazer entender — embora a sua fala não faça sentido.

A imprensa destacou o que seria a “diferença” de opinião entre Lula e sua candidata. Bobagem! Trata-se de um movimento combinado: a) Dilma precisa mostrar alguma autonomia; b) o governo, de todo modo, precisa de algum fato novo para começar a recuar de sua posição ridícula de não reconhecer as eleições, talvez as mais democráticas desde a normalização institucional daquele país.

Mesmo que a gente verta a fala de Dilma para o português, trata-se de um amontoado de despropósitos. Dizer que existe uma grande diferença entre “eleição” e “golpe de estado” é como asseverar, com ar grave e sapiente, que o Lobo Mau não é a Vovozinha. A fala faria algum sentido se a data das eleições já não estivesse definida quando Manuel Zelaya, o “golpista de fato”, foi deposto. E, sabemos, o Chapeludo, ele sim, era o golpista. Vocês conhecem a argumentação de fio a pavio.

O importante a destacar, reitero, é que se busca construir também a imagem da Dilma que pensa e fala por conta própria. Falar é fácil. Pensar é que é o “xis” do problema. O que vai acima é o sumo da embromação. Como legitimar o que deriva da ilegitimidade? Dilma que explique. Eu não preciso me ocupar do paradoxo porque sempre achei a deposição do maluco legal e legítima.
Mas esse mérito, agora ao menos, não é relevante. É bem possível que essa Dilma doce-de-coco comece a dar opiniões sobre assuntos não afeitos à sua pasta — e, sempre que possível, ”com idéias próprias”.

por Reinaldo Azevedo

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