Muitos de nós fazemos uma idéia do que é o politicamente correcto (PC), pela repetição de informações transmitidas pela mídia.
O PC não teve origem recente; remonta a sua utilização como instrumento ideológico, ao tempo da I Guerra Mundial. Quando Karl Marx escreveu o “Manifesto Comunista” (séc. 19), ficou bem claro que a ideologia que nascia assentava em duas vertentes básicas:
- o Marxismo Econômico, que defende a idéia de que a História é determinada pela propriedade dos meios de produção, e;
- o Marxismo Cultural, que defende a idéia de que a História é determinada pelo Poder através do qual, grupos sociais (para além das classes sociais) definidos pela raça, sexo, etc., assumem o poder sobre outros grupos.
Até à I Guerra Mundial, o Marxismo Cultural não mereceu muita atenção, que se concentrou praticamente toda no Marxismo Econômico, que deu origem à revolução bolchevista (URSS).
O Marxismo Cultural é uma sub-ideologia do Marxismo (a “outra face da moeda” é o marxismo econômico), e como todas as ideologias, tende inexoravelmente para a implantação de uma ditadura, isto é, para o totalitarismo.
À semelhança do Marxismo Econômico, o Marxismo Cultural (ou Politicamente Correto) considera que os trabalhadores e os camponeses são, à partida, “bons”, e que a burguesia e os capitalistas são, a priori, “maus”. Dentro das classes sociais assim definidas, os marxistas culturais entendem que existem grupos sociais “bons” (como as mulheres feministas — porque as mulheres não-feministas são “más” ou “ignorantes”), os negros e os homossexuais – para além dos muçulmanos, dos animistas, dos índios, dos primatas superiores, etc.. Estes “grupos sociais” (que incluem os primatas superiores — chimpanzés, gorilas, etc.) são classificados pelos marxistas culturais como sendo “vítimas” e por isso, são considerados como “bons”, independentemente do que os seus membros façam ou deixem de fazer. Um crime de sangue perpetrado por um homossexual é visto como “uma atitude de revolta contra a sociedade opressora”; o mesmo crime perpetrado por um heterossexual de raça branca é classificado como um “ato hediondo de um opressor”. Segundo o Marxismo Cultural, o “macho branco” é o equivalente ideológico da “burguesia” no Marxismo Econômico.
Enquanto que o Marxismo Econômico baseia a sua ação no ato de expropriação (retirada de direitos à propriedade), o Marxismo Cultural (ou PC) expropria direitos de cidadania, isto é, retira direitos básicos a uns cidadãos para, alegadamente, dar direitos acrescidos e extraordinários a outros cidadãos, baseados na cor da pele, sexo ou aquilo a que chamam de “orientação sexual”. Nesta linha está a concessão de cotas de admissão, seja para o parlamento, seja no acesso a universidades ou outro tipo de instituições, independentemente de critérios de competência e de capacidade.
Enquanto que o método de análise utilizado pelo Marxismo Econômico é baseado no Das Kapital de Marx (economia coletivista marxista), o Marxismo Cultural utiliza o desconstrucionismo filosófico e epistemológico explanado por ideólogos marxistas como Jacques Derrida, que seguiu Martin Heidegger, que bebeu muita coisa em Friederich Nietzsche.
O Desconstrucionismo, em termos que toda a gente entenda, é um método através do qual se retira o significado de um texto para se colocar a seguir o sentido que se pretende para esse texto. Este método é aplicado não só em textos, mas também na retórica política e ideológica em geral. A desconstrução de um texto (ou de uma realidade histórica) permite que se elimine o seu significado, substituindo-o por aquilo que se pretende. Por exemplo, a análise desconstrucionista da Bíblia pode levar um marxista cultural a inferir que se trata de um livro dedicado à superioridade de uma raça e de um sexo sobre o outro sexo; ou a análise desconstrucionista das obras de Shakespeare, por parte de um marxista cultural, pode concluir que se tratam de obras misóginas que defendem a supressão da mulher; ou a análise politicamente correta dos Lusíadas de Luís Vaz de Camões, levaria à conclusão de que se trata de uma obra colonialista, supremacista, machista e imperialista. Para o marxista cultural, a análise histórica resume-se tão só à análise da relação de poder entre grupos sociais.
O Desconstrucionismo é a chave do politicamente correto (ou marxismo cultural), porque é através dele que surge o relativismo moral como teoria filosófica, que defende a supressão da hierarquia de valores, constituindo-se assim, a antítese da Ética civilizacional europeia.
Com a revolução marxista russa, as expectativas dos marxistas europeus atingiram um ponto alto. Esperava-se o mesmo tipo de revolução nos restantes países da Europa. À medida que o tempo passava, os teóricos marxistas verificaram que a expansão marxista não estava a ocorrer. Foi então que dois ideólogos marxistas se dedicaram ao estudo do fenómeno da falha da expansão do comunismo marxista: Antônio Gramsci (Itália) e George Lukacs (Hungria).
Gramsci concluiu que os trabalhadores europeus nunca seriam servidos nos seus interesses de classe se não se libertassem da cultura européia – e particularmente da religião cristã. Para Gramsci, a razão da falha da expansão comunista marxista estava na cultura e na religião. O mesmo conclui Lukacs.
Em 1923, por iniciativa de um filho de um homem de negócios riquíssimo de nacionalidade alemã (Félix Veil), que disponibilizou rios de dinheiro para o efeito, criou-se um grupo permanente (“think tank”) de estudos marxistas na Universidade de Frankfurt. Foi aqui que se oficializou o nascimento do Politicamente Correto (Marxismo Cultural), conhecido como “Instituto de Pesquisas Sociais” ou simplesmente, Escola de Frankfurt – um núcleo de marxistas renegados e desalinhados com o marxismo-leninismo.
Em 1930, passou a dirigir a Escola de Frankfurt um tal Max Horkheimer, outro marxista ideologicamente desalinhado com Moscovo e com o partido comunista alemão. Horkheimer teve a idéia de se aproveitar das idéias de Freud, introduzindo-as na agenda ideológica da Escola de Frankfurt; Horkheimer coloca assim a tradicional estrutura socio-econômica marxista em segundo plano, e elege a estrutura cultural como instrumento privilegiado de luta política. E foi aqui que se consolidou o Politicamente Correto, tal como o conhecemos hoje, com pequenas variações de adaptação aos tempos que se seguiram. Surgiu a Teoria Crítica.
O que é a Teoria Crítica? As associações financiadas pelo nosso Estado e com o nosso dinheiro, em apoio ao ativismo gay, em apoio a organizações feministas camufladas de “proteção à mulher”, e por aí fora – tudo isso faz parte da Teoria Crítica do marxismo cultural, surgida da Escola de Frankfurt do tempo de Max Horkheimer. A Teoria Crítica faz o sincretismo entre Marx e Freud, tenta a síntese entre os dois (“a repressão de uma sociedade capitalista cria uma condição freudiana generalizada de repressão individual”, e coisas do gênero).
No fundo, o que faz a Teoria Crítica? Critica. Só. Faz críticas. Critica a cultura européia; critica a religião; critica o homem; critica tudo. Só não fazem auto-crítica (nem convém). Não se tratam de críticas construtivas; destroem tudo, criticam de forma a demolir tudo e todos.
Por essa altura, aderiram ao bando de Frankfurt dois senhores: Theodore Adorno e Herbert Marcuse. Este último emigrou para os Estados Unidos com o advento do nazismo.
Foi Marcuse que introduziu no Politicamente Correto (ou marxismo cultural) um elemento importante: a sexualidade. Foi Marcuse que criou a frase “Make Love, Not War”. Marcuse defendeu o futuro da Humanidade como sendo uma sociedade da “perversidade polimórfica”, na linha das profecias de Nietzsche.
Marcuse defendeu também, já nos anos trinta do século passado, que a masculinidade e a feminilidade não eram diferenças sexuais essenciais, mas derivados de diferentes funções e papéis sociais; segundo Marcuse, não existem diferenças sexuais, senão como “diferenças construídas”.
Marcuse criou a noção de “tolerância repressiva” – tudo o que viesse da Direita tinha que ser intolerado e reprimido pela violência, e tudo o que viesse da Esquerda tinha que ser tolerado e apoiado pelo Estado. Marcuse é o pai do Politicamente Correto moderno.
O sucesso de expansão do Marxismo Cultural na opinião pública, em detrimento do Marxismo Econômico, deve-se a três razões simples: a primeira é que as teorias econômicas marxistas são complicadas de entender pelo cidadão comum, enquanto que o tipo de dedução primária do raciocínio PC, aliado à fantasia de um mundo ideal e sem defeitos, é digno de se fazer entender pelo mentecapto mais empedernido. A segunda razão é porque o Politicamente Correto critica por criticar, pratica a crítica destrutiva até à exaustão – e sabemos que a adesão popular (da juventude, em particular) a este tipo de escrutínio crítico é enorme. A terceira razão é que o antropocentrismo do marxismo econômico falhou, como sistema social e econômico, em todo o mundo; resta ao Marxismo a guerrilha cultural.
O que se está a passar hoje na sociedade ocidental, não é muito diferente do que se passou na União Soviética e na China, num passado recente. Assistimos ao policiamento do pensamento, à censura das idéias, rumo a uma sociedade totalitária.
O marxismo cultural (ou politicamente correcto actual) trata-se de uma utopia negativa, porque se concentra na crítica dissolvente da nossa sociedade real. A Teoria Crítica da sociedade por parte do politicamente correto é negativa porque não possui conceitos capazes de superar a distância entre o presente e o futuro, mas “pretende conservar-se fiel àqueles que deram e dão a sua vida pela Grande Recusa” (“O Homem Unidimensional”, de Herbert Marcuse). Quaisquer que sejam as possibilidades reais que a nossa sociedade atual apresenta de um futuro melhor, o marxismo cultural não nos revela quais são, limitando-se a negar totalmente o sistema em que se baseia a nossa sociedade, e na sua totalidade. Exemplos do marxismo cultural são as “picaretas falantes” do Bloco de Esquerda: destrói, destrói, critica e critica, bota-abaixo, mas ficamos sem saber muito bem quais são as alternativas que propõem para a nossa sociedade.
A chamada Utopia Negativa (marxismo cultural ou politicamente correcto actual) nasceu com a Escola de Frankfurt, conforme descrito aqui. Herbert Marcuse, Theodor Adorno e Max Horkheimer ligaram estritamente a investigação filosófica à sociologia e à psicologia e declararam inspirar-se em Hegel, Marx e Freud.
Com Hegel, os marxistas culturais insistem no caráter absoluto da Razão, isto é, “o que é real é racional, e o que é racional é real” (sic, Hegel) o que implica um determinismo que já está ultrapassado pela atual probabilística científica. Por outro lado, seguindo Hegel, os marxistas culturais refutam o Saber fora do seu carácter finito, ao contrário de Fichte que distinguiu o Saber Finito em constante evolução, do Saber Infinito. Depois, os marxistas culturais dizem que seguem Hegel no carácter dialético (ou caráter negativo) da Razão, ignorando contudo a parte mais importante da dialética de Hegel, que é a identidade positiva entre a realidade e a racionalidade. Em suma, os marxistas culturais pegam em Hegel, adulteram a sua filosofia, e depois dizem que se baseiam nele.
A Marx, os marxistas culturais vão buscar a essência da sua filosofia: a crítica à sociedade capitalista, a prognose do fim do capitalismo – que não só não acabou, como se transformou no neoliberalismo atual –, ignorando contudo quer o desenvolvimento da estrutura econômica que deveria – segundo Marx – determinar a passagem à sociedade socialista, quer o conceito de Marx de que o homem é essencialmente constituído pelas necessidades e pelas relações de produção e trabalho que as satisfazem (a chamada “Esquerda Caviar”).
A Freud, os marxistas culturais foram buscar o conceito de “instinto”, entendido como tendência para o regresso a uma situação anterior, primordial ou originária; o “instinto”, segundo Freud, é o retorno à origem do Homem. Depois, foram buscar o conceito freudiano de “repressão”, sendo que (segundo os marxistas culturais) esta é exercida pela civilização sobre o tal “instinto” primordial e originário – ignorando os marxistas culturais a função positiva que, segundo Freud, essa repressão exerce, através do Superego, quer na formação da civilização quer na formação da personalidade humana normal. .Em suma, os marxistas culturais pegam em Freud, adulteram as suas conclusões científicas, e depois dizem que se baseiam nele.
Existem outras vacuidades dos marxistas culturais, como a negação filosófica da relação entre a “razão objetiva” versus “razão subjetiva”. Segundo os marxistas culturais, a tarefa da filosofia não é a de regressar à tradição objetivista do passado, mas antes à total e completa destruição do presente por meio de um “progresso da direção da utopia que consiste na negação de tudo o que é inútil ao homem e impede o seu livre desenvolvimento” (“Eclipse da Razão”, Max Horkheimer). Paradoxalmente, existe muito de Hayek nesta idéia; vejam esta citação: “precisamos de reformas radicais para libertar o processo de crescimento espontâneo dos obstáculos que a loucura humana erigiu” (Hayek, “Road to Serfdom”). Contudo, e apesar de tudo, a utopia de Hayek é positiva, e não negativa como a dos marxistas culturais, porque pretende utilizar a realidade tal qual existe para chegar à sua utopia, enquanto que os marxistas culturais pretendem destruir a realidade social no seu todo para chegarem à sua utopia.
Para os marxistas culturais, para além da trilogia “Marx, Freud e Hegel”, só existem duas personalidades históricas que não são crucificadas, e que constituem verdadeiros ídolos: Nietzsche (na sua faceta niilista e anti-ética) e o Marquês de Sade, “porque ao declararem a identidade entre a Razão e o Domínio, as doutrinas impiedosas são mais piedosas do que as dos lacaios da burguesia” (“A Dialética do Iluminismo”, Adorno & Horkheimer).
Para os marxistas culturais, existe uma obcecação doentia na luta total contra o “domínio”: o domínio dos pais sobre os filhos, o domínio do dono sobre o gato, o domínio do gato sobre o rato, etc., e quando um filho mata o pai, não se trata de um crime, mas “de uma revolta contra o domínio estabelecido pela Razão burguesa”. Quando um heterossexual mata um homossexual, trata-se de “um crime hediondo que exprime o domínio da Razão burguesa sobre uma vítima da civilização”; quando um homossexual mata um heterossexual, trata-se da “reação de uma vítima da História contra o domínio cultural da burguesia”.
Outra obcecação doentia dos marxistas culturais é tudo o que se relaciona com a sexualidade. A “repressão do instinto” é pau para toda a colher, tudo o que é “instinto” é valorizado, e a noção aristotélica de “virtude moral” baseada na Razão do “justo-meio” é desprezada sistematicamente pelo marxismo cultural.
“A auto-sublimação da sexualidade destrói o primado da função genital, transforma todo o corpo em órgão erótico e transforma o trabalho em jogo, divertimento ou espectáculo. Com o advento do puro Eros, ficaria assim destruída a ordem repressiva da sexualidade procriadora” – “Eros e Civilização”, de Herbert Marcuse
Sendo que “a auto-sublimação da sexualidade destrói o primado da função genital”, legitima-se assim tacitamente a pedofilia através da necessidade da não-sublimação da sexualidade infantil (conforme defendido por Alfred Kinsley, Wilhelm Reich e Michel Foulcault, todos eles marxistas-freudianos), embora os marxistas culturais não assumam abertamente a defesa da pedofilia – para já; lá chegaremos: na Holanda já se iniciou a campanha politicamente correcta marxista-freudiana a favor da legalização da pedofilia.
Depois, consideram a procriação como expressão de uma sexualidade “repressiva”, legitimando assim a prática sexual homossexual, não-reprodutiva por excelência, como sendo “não-repressiva”, e portanto, superior à heterossexualidade.
Quando um homossexual se suicida, o marxista cultural vem dizer que “o suicídio resulta de uma manifestação de desespero perante a repressão da moral burguesa e do domínio dos lacaios da burguesia em relação a uma vítima da História”; quando um heterossexual se suicida, o marxista cultural não diz nada porque os suicídios são majoritariamente cometidos por heterossexuais, e porque o heterossexual faz parte da “maioria dos lacaios da burguesia” – salvo se o heterossexual suicida for um negro ou melhor: uma mulher negra.
Seria fastidioso enumerar aqui toda uma série de contradições ideológicas e filosóficas do marxismo cultural; trata-se de uma retórica risível que defende sistematicamente uma idéia e contradiz essa mesma idéia logo a seguir. Mas a triste realidade é que muita da filosofia inconscientemente absorvida pelos nossos políticos atuais é de origem marxista cultural.
por O. Braga, no Perspectivas - Condensado a partir dos posts "O que é Politicamente Correto?" e "Utopia Negativa"
Um comentário:
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