sexta-feira, 26 de junho de 2009

O Paradoxo da Praça


O protesto contra o grevismo na USP reuniu cerca de 200 estudantes. Está de bom tamanho. O tempo também não ajudou: chuva, frio etc. “Ah, os filhinhos de papai não querem enfrentar as intempéries, né?” Bobagem! Não há diferença de classe social entre os que querem estudar e os que não querem. A diferença é só, digamos assim, de horizonte utópico. Um grupo, o dos não-grevistas, pertencente à esmagadora maioria dos 78 mil alunos que seguem estudando, entende que uma boa maneira de mudar o Brasil é cumprindo a sua tarefa — estudar —, lutando, eventualmente, para reformar a universidade. O outro grupo é formado pelos extremistas que usam a USP como mero pretexto. O que eles querem? Bem, suas lideranças se dizem “marxista-revolucionárias”. O que posso informar é o que gente dessa espécie quis e fez quando lhe foi dado o poder: 70 milhões de mortos na China, 35 milhões na URSS, 3 milhões no Camboja, 100 mil em Cuba. No Brasil, a contrapelo da história, esses dinossauros podem não matar uma mosca. Mas atrapalham a vida de quem estuda e trabalha.

Não esperava, como escrevi aqui, mais do que isso. Estamos diante, como já expliquei, do chamado “Paradoxo da Praça”. Os baderneiros, que também marcaram manifestação para hoje, certamente reunirão mais gente, o que dará a falsa impressão de que são maioria. Ocorre que a minoria costuma ir quase toda à rua porque julga ter uma “causa”. A maioria tende a se acomodar porque, de fato, não sente o statu quo ameaçado. É assim no mundo inteiro. Também nas manifestações que não são especialmente políticas.

Marque uma marcha do “Orgulho Heterossexual”, e é provável que se reúnam menos do que os 200 da USP. Além de haver uma ponta — ou muito — de ridículo da coisa, tal condição não é, de modo nenhum, ameaçada pela, sei lá eu, “homossexualização” da cultura. Embora exista esse esforço, não passa de espuma. Ademais, creio que a maioria dos heterossexuais considere justo que não haja discriminação civil contra homossexuais. E pronto: ou ficam em casa ou vão espiar a marcha gay. Se os católicos, mais de 70% dos brasileiros, decidirem “marchar com Jesus”, talvez não reúnam nem metade do que reúnem os evangélicos — pouco mais de 20%, dizem, divididos em dezenas de denominações. Também nesse caso, o fato de ser “minoria” açula o desejo de ocupar a praça, de se fazer visível.

Notem: estou apenas dando exemplos outros, não-virulentos, do “Paradoxo da Praça”. Evidentemente, gays ou evangélicos nas ruas não ameaçam os direitos de heterossexuais ou de católicos. Não se trata, pois, de uma comparação com o que acontece na USP, onde uma minoria se impõe de modo ditatorial e ilegal à esmagadora maioria.

Finalmente, descaracterizo aqui uma tolice, em que os greveiros reiteram em comentários boçais enviados, e jamais publicados, ao blog: “Quem não vai a uma reunião de condomínio não pode reclamar depois das decisões tomadas”. Opa! Claro que pode! Se os presentes tomarem decisões contrárias ao estatuto, podem, sim. Se os presentes decidirem mudar o estatuto, tornando-o incompatível com a Constituição e com as leis que regem a sociedade, podem, sim.

Uma banana, macaco! Mesmo os 78 mil se negando a participar das pantomimas que alguns chamam “assembléias”, eles têm todo o direito de rechaçar a ação dos extremistas. Porque essa gente não viola só o estatuto da USP. Viola também as leis. Viola a Constituição. E o Ministério Público, creio, só não agiu até agora porque, nesse caso, parece mais próximo da minoria do que da maioria; mais próximo de quem transgride a lei do que de quem a respeita.

por Reinaldo Azevedo

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