sexta-feira, 17 de dezembro de 2010
A Anistia e a Corte Interamericana de Direitos Humanos
A Corte Interamericana de Direitos Humanos condenou o Brasil pelo desaparecimento de 62 pessoas na Guerrilha do Araguaia (1972-1975), maior foco da luta armada contra a ditadura militar. A sentença determina que o Estado identifique e puna os responsáveis pelas mortes e afirma que a Lei de Anistia não pode ser usada para impedir a investigação do caso. O governo foi notificado ontem da decisão, aprovada por unanimidade no último dia 24. O tribunal é vinculado à OEA (Organização dos Estados Americanos). Em tese, o Brasil é obrigado a acatar suas determinações.
De acordo com a sentença, o Estado brasileiro é “responsável pelo desaparecimento forçado” dos guerrilheiros mortos pelas tropas que sufocaram a guerrilha. Assim, deve promover uma investigação sobre os desaparecimentos "a fim de esclarecê-los, determinar as correspondentes responsabilidades penais e aplicar efetivamente as sanções e consequências que a lei preveja". Para a corte, as disposições da Lei da Anistia "carecem de efeitos jurídicos e não podem seguir representando um obstáculo para a investigação", "nem para a identificação e punição dos responsáveis" pelas mortes.
OUTROS CASOS
A decisão afirma ainda que a lei, aprovada em 1979, também não deve valer para "outros casos de graves violações de direitos humanos" durante a ditadura. Esse trecho pode dar margem a novas condenações do país envolvendo o desaparecimento de opositores políticos do regime militar. O texto estimula a criação da Comissão da Verdade, uma das propostas mais polêmicas do PNDH-3 (Plano Nacional dos Direitos Humanos), lançado em 2009. Ressalta, no entanto, que a iniciativa não substitui investigações no campo judicial.
O tribunal determinou que o Brasil realize "todos os esforços" para encontrar ossadas dos combatentes e promova um "ato público de reconhecimento de responsabilidade internacional".
Além disso, ordenou que o governo federal crie "um programa ou curso permanente e obrigatório sobre direitos humanos" dirigido a "todos os níveis hierárquicos das Forças Armadas". Esse ponto deve provocar desconforto entre os militares, que travam batalha com militantes de direitos humanos contra o reconhecimento de que o Exército executou presos na guerrilha. O caso do Araguaia se arrastava na Corte Interamericana desde 1995, quando o país foi denunciado por ONGs de direitos humanos. O julgamento só foi iniciado em maio deste ano.
por Bernardo Mello Franco, na Folha de São Paulo
Comento:
Embora o Brasil seja signatário do tratado, o que o obriga a seguir os princípios da Corte Interamericana, há nenhum mecanismo que faça com que a Lei da Anistia possa ser deixada de lado para que haja a punição dos chamados "torturadores do regime", uma vez que o Supremo Tribunal Federal já tomou sua decisão sobre a irrevocabilidade e o alcance desta Lei.
O próprio presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Cezar Peluso, afirmou que a condenação do Brasil pela Corte Interamericana dos Direitos Humanos (CIDH) não altera a posição do STF sobre a Lei de Anistia:
"A eficácia (da decisão da CIDH) se dá no campo da convencionalidade. Não revoga, não anula e não cassa a decisão do Supremo".
Ainda, o Ministro da Defesa, Nelson Jobim, afirmou que é meramente política a decisão da Corte Interamericana de Direitos Humanos, uma vez que ela não tem efeitos jurídicos no Brasil. Assim, afirmou, não há possibilidade de punição para os militares que praticaram tortura no país.
Segundo Jobim, que já foi presidente do STF (Supremo Tribunal Federal), a validade da Lei da Anistia não deve voltar a ser discutida, já que "o assunto não pode voltar ao Supremo, pois a Corte está sujeita a suas próprias decisões. As decisões de constitucionalidade têm efeito contra todos, inclusive eles [os ministros]". "Se você tem uma lei que anistiou, ela não pode ser revista hoje. É uma lei que se esgota em sua própria vigência".
Já o secretário de Direitos Humanos, Paulo Vannuchi, disse que o STF poderia voltar a discutir a Lei de Anistia, julgada constitucional por 7 votos a 2 em abril deste ano. Como bom esquerdista, o secretário com status de "Sinistro" está louco para punir só um lado do imbróglio: o dos militares, claro!
Jobim afirmou, também, que o Estado já está cumprindo decisão da Corte Interamericana com o grupo de trabalho do Tocantins, que atua há dois anos e é formado por diversos especialistas que trabalham na localização dos corpos dos desaparecidos na guerrilha. O ministro lembrou que a anistia foi negociada na transição entre o governo militar e o civil. "O processo de transição no Brasil é pacífico, com histórico de superação de regimes, não de conflito. Isso nem sempre acontece nos países da América espanhola, muitas vezes pautados por situações de degola e pelo lema lucha hasta la muerte [luta até a morte]", disse Jobim, fazendo referência a um discurso do revolucionário Ernesto Guevara na ONU (Organização das Nações Unidas), em 1964, em defesa da revolução cubana.
Como bem lembrou o então ministro Eros Grau, à época da discussão sobre a validade e o alcance da Lei da Anistia pelo STJ:
- a Lei de Anistia foi, sim, ampla geral e irrestrita, e os crimes conexos abrangem o crime de tortura;
- o dispositivo constitucional que exclui a tortura dos crimes passíveis de anistia é posterior à lei de 1979 e não pode retroagir;
- a Constituição incorporou como fundamento a Lei da Anistia.
Este último item merece ser destacado. Não é só a Lei da Anistia, a 6683, de 1979, que garante a anistia ampla, geral e irrestrita para crimes políticos e “conexos”. A própria Emenda Constitucional nº 26, de 1985, QUE É NADA MENOS DO QUE AQUELA QUE CONVOCA A ASSEMBLÉIA NACIONAL CONSTITUINTE, incorporou, de fato, esse fundamento. Está no artigo 4º da emenda:
Art. 4º É concedida anistia a todos os servidores públicos civis da Administração direta e indireta e militares, punidos por atos de exceção, institucionais ou complementares.
§ 1º É concedida, igualmente, anistia aos autores de crimes políticos ou conexos, e aos dirigentes e representantes de organizações sindicais e estudantis, bem como aos servidores civis ou empregados que hajam sido demitidos ou dispensados por motivação exclusivamente política, com base em outros diplomas legais.
§ 2º A anistia abrange os que foram punidos ou processados pelos atos imputáveis previstos no “caput” deste artigo, praticados no período compreendido entre 2 de setembro de 1961 e 15 de agosto de 1979.
O que aqui se discute não é a questão da memória, da busca dos corpos desaparecidos etc. Nada disso está em questão. Mas não há a menor possibilidade de ocorrer uma revisão da Lei da Anistia sem que ambos os lados - guerrilheiros terroristas e torturadores - sejam afetados e, neste caso, punidos.
Ocorre que a OEA - e, por conseguinte, a CIDH, braço daquela - está apinhada de esquerdistas. Os guerrilheiros que perderam a batalha pela implantação da ditadura comunista tentaram vencer no tapetão do nosso Judiciário e perdeu. Agora, logrou uma vitória na CIDH, mas sem validade jurídica perante as cortes brasileiras, funcionando em plena democracia.
Os familiares dos guerrilheiros do Araguaia têm o direito de reivindicar os corpos e podem se dedicar à vontade à criação de mitos sobre aquele confronto de delírios totalitários na selva. O estado de direito lhes assegura essas iniciativas - o mesmo estado de direito que reconhece a validade da Lei da Anistia como pacificadora e redentora do passado - um passado que não passa para os comunistas.
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