A tragédia do Rio seria chocante em qualquer tempo, claro. Um único morto por causa das chuvas já nos diminuiria. Nada menos de 105 mortes confirmadas e 56 desaparecidos num só dia são uma estupidez inaceitável no Rio, em São Paulo e em qualquer lugar. O desastre também desafia o entendimento porque mesmo aqueles que desconfiamos da propaganda oficial por dever de ofício nos deixamos contaminar por ela. Mas não é o Rio, afinal, o grande canteiro de obras do tal PAC? Como pode?
Não, leitor! Nada de fazer tabula rasa: “É tudo mentira! Não há obra nenhuma! Eles estão nos enganando!” Há obras, sim. Não anunciam o paraíso, como faz crer a propaganda oficial. Também não respondem a urgências, que apelam a outras áreas do governo. Texto publicado no Estadão de hoje ilustra bem esse debate. Na prática, ele nos informa a diferença entre o que diz o cara e o que dizem alguns números do governo do cara. Querem ver?
Por Diego Zanchetta:
O Estado do Rio recebeu apenas 1% das verbas do Ministério da Integração Nacional destinadas ao Programa de Prevenção e Preparação para Desastres, em 2009, um ano antes de ser castigado pela chuva de ontem, a maior em 44 anos.
O valor transferido da União, R$ 1,6 milhão, não é suficiente para intervenções públicas relevantes. Um plano de remoção preventivo de cem barracos em área de risco em um morro custaria hoje pelo menos R$ 4 milhões, segundo autoridades da Defesa Civil do Rio.
O orçamento da União tinha no ano passado dotação de R$ 646,6 milhões para ser repassada a municípios com programas de combates a enchentes. Desse total, somente 22%, ou R$ 143,7 milhões, foram transferidos pelo governo federal aos Estados.
Apenas cinco prefeituras do Estado do Rio (Campos dos Goytacazes, Niterói, Angra dos Reis, Rio e Resende) foram contempladas.
Beneficiados.
Na Bahia, terra do ex-ministro da Integração Nacional Geddel Vieira Lima (PMDB), que deixou na semana passada o cargo para concorrer ao governo estadual, 58 cidades receberam 48% das verbas do programa (R$ 69,4 milhões).
São Paulo e Rio, os dois Estados que contabilizam quase 200 mortos pelas chuvas desde setembro do ano passado, receberam R$ 6,6 milhões em verbas da União para prevenir desastres.
O dinheiro não é suficiente sequer para construir um piscinão. Cada reservatório da capital paulista custa, em média, R$ 30 milhões. Uma campanha educativa para as pessoas colocarem o lixo de casa na rua em horários predeterminados, por exemplo, custa R$ 5 milhões na cidade de São Paulo.
Em ofício encaminhado ao Tribunal de Contas da União (TCU), a organização não-governamental (ONG) Contas Abertas questiona os repasses maiores para municípios baianos. “Paralelamente, vimos que R$ 1,3 bilhão foi pago pela União aos Estados no programa de resposta aos desastres em 2009, ou seja, quase dez vezes mais do que os valores aplicados na prevenção, que seria a melhor solução para evitar as tragédias como a de ontem”, argumenta Gil Castelo Branco, coordenador da ONG.
O governo federal, por sua vez, argumenta que não houve favorecimento político na distribuição das verbas.
Pós-tragédia.
Após as chuvas que atingiram Angra dos Reis no início deste ano, com 57 mortes, o Palácio do Planalto editou uma Medida Provisória para enviar em caráter emergencial cerca de R$ 130 milhões a cidades fluminenses afetadas pelas chuvas.
Ontem, as autoridades do Estado já falavam em pedir novo auxílio ao governo federal, mas evitaram críticas a Lula.
Encerro
Esses números não farão parte da propaganda oficial.
por Reinaldo Azevedo
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