terça-feira, 2 de fevereiro de 2010

Não Nos Tomem por Rocinantes

A foto dos magistrados da Associação dos Juízes pela Democracia homenageando João Pedro Stedile me fez ir ao site da entidade. Ali, fiquei sabendo que a douta organização reúne “magistrados comprometidos com o resgate da cidadania do juiz, por meio de uma participação transformadora na sociedade, blá, blá, blá”. Pus-me a pensar. O que seria o tal “resgate da cidadania do juiz”? Como se caracteriza a síndrome dos magistrados não cidadãos? Os meritíssimos queimam o passaporte e o título eleitoral? Desinteressam-se dos temas nacionais? Não creio. Examinada a foto e o site, percebi que “resgate da cidadania” quer dizer militância política numa perspectiva marxista e totalitária.


Apenas mediante essa interpretação se torna compreensível que magistrados brindem Stedile com uma estampa de D. Quixote enfrentando moinhos de vento. O homenageado, é bom lembrar, desatende convocações para audiências em juízo, está empenhado em promover uma revolução através do campo e chama o MST de “nosso exército”. Sua organização invade propriedades, destrói tudo que encontra e rasga ordens judiciais. E os magistrados da AJD abrem sorrisos e batem palmas! Saem para o jogo político fora dos parâmetros do Estado democrático de direito. Transformam-se em Sanchos Pança desse “D. Quixote” que, no famoso discurso de Canguçu, afirmou: “A luta camponesa abriga hoje 23 milhões de pessoas. Do outro lado há 27 mil fazendeiros. Será que mil perdem para um? O que falta é nos unirmos. Não vamos dormir até acabarmos com eles”.


Suas excelências devem achar que somos Rocinantes. Mas eu denunciarei, enquanto me obedecerem os dedos para escrever e a voz para falar, que eles são regiamente remunerados pela sociedade, com todas as prerrogativas vitalícias da função, para, entre outras coisas, não se meterem em política (nem em revoluções). Sabem por quê? Porque o poder dos juízes, no conjunto dos poderes de Estado, é o único que não nasce do voto popular, ora essa! Será preciso explicá-lo melhor a tais doutores? Vamos lá: em qualquer democracia, menos nessa, falsificada, que enfeita o nome da AJD, quem quiser fazer política, entra num jogo onde o exercício do poder depende do voto popular, seja na pessoa, seja no partido a que adere. E fazer política, tentar impor ou promover convicções ideológicas pessoais no exercício da função jurisdicional, sem voto, sem unção popular, de modo vitalício, é prepotência, é abuso de poder, é totalitarismo. E é desonesto.


Quando o exército do D. Quixote da AJD ataca uma propriedade, não é apenas o constitucional direito a essa propriedade que resulta agredido. Bastaria a agressão para expor os invasores à ação da justiça. No entanto, junto com a propriedade, vários princípios de direito e garantias constitucionais são atropelados quando derrubam uma porteira. Ei-los, um a um, para que suas excelências relembrem da Faculdade:


1º) a inviolabilidade e a segurança dos direitos adquiridos;
2º) a intimidade da vida privada;
3º) o domicílio (“asilo inviolável da pessoa”);
4º) a liberdade de ir e vir;
5º) o princípio da legalidade;
6º) o princípio do devido processo;
7º) a proibição do uso de armas em quaisquer reuniões;
8º) a proibição de associação para fins ilícitos.


Por fim, duas questões. Primeira: que Estado de Direito pretendem aqueles que aplaudem a ruptura com o devido processo? Segunda: que democracia é essa pretendida pelos que se lixam para a vontade social, apoiando invasões que têm maciça rejeição da opinião pública?


O nome vulgar dessa “democracia” é totalitarismo.


por Percival Puggina

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