quarta-feira, 24 de setembro de 2008

Lula, a Imprensa e o Autoritarismo

Duas notícias e voltamos com os comentários de Reinaldo Azevedo, o mestre.
O presidente do Equador, Rafael Correa, decretou ontem o embargo dos bens da construtora brasileira Norberto Odebrecht, o que na prática, segundo o ministro dos Setores Estratégicos, Derlis Palacios, equivale à expulsão da empresa do país.
Além disso, Correa determinou a ocupação militar das obras da construtora no Equador. A medida presidencial proibiu ainda a saída de quatro de seus representantes no país por terem se negado a pagar um indenização por prejuízos causados pelas várias paralisações da hidrelétrica de San Francisco, construída pela empresa brasileira, que apresentaria graves danos estruturais.
A Odebrecht - que está no Equador há 23 anos - é investigada por corrupção e por ter realizado obras que, segundo Correa, teriam sido concluídas com "um terço da capacidade e o triplo do custo". Há duas semanas, o governo deu um ultimato à Odebrecht: ou a empresa se comprometia a reparar a usina ou deixava o país. "Esses senhores (da empresa brasileira) foram corruptos e corruptores. O que está sendo feito é um assalto ao país", disse o presidente.
San Francisco, localizada no centro do Equador, é a primeira usina no mundo totalmente subterrânea e responde por 12% da energia dos recursos hidrelétricos do país. Segundo o Conselho Nacional de Eletricidade do Equador, ela custou US$ 338 milhões e os reparos estão orçados em US$ 12 milhões. A usina foi inaugurada em 2007, mas desde junho, segundo o governo, vem apresentando falhas técnicas que causaram interrupção do fornecimento de energia. Até então, o consórcio formado pela Odebrecht, Va Tech e Alston admitia "problemas pontuais" na obra e estava negociando com Quito a reparação dos danos detectados.
No decreto de ontem, Correa proibiu a saída do país de dois diretores da empresa que vivem no Equador, Fabio Andreani Gandolfo e Fernando Bessa, além do vice-presidente da construtora para a América Latina, Luiz Antonio Mameri, e do advogado Eduardo Gedeon.
No texto, Correa diz que "os bens móveis e imóveis da construtora serão usados para superar a emergência energética e evitar apagões". Ele ordenou a mobilização do Exército para acompanhar as outras obras que estão a cargo da Odebrecht, entre elas uma estrada, um aeroporto e uma hidrelétrica.
O governo brasileiro tinha dito que as acusações de Correa têm objetivos político-eleitorais - o país vota em referendo, no domingo, o projeto da nova Constituição. Ontem, o chanceler Celso Amorim disse que a ocupação militar da usina construída pela Odebrecht e a proibição de que seus diretores deixem o Equador não afetou, "até o momento", as relações diplomáticas entre Brasil e Equador. Ele acrescentou que espera ver resolvidas em breve as divergências entre a construtora e o governo do Equador. Amorim, que está em Nova York, não quis entrar no mérito das acusações de Quito contra a Odebrecht: "Não podemos prejulgar as reclamações do Equador."
Em comunicado oficial, divulgado ontem, a Odebrecht afirmou que a empresa "continua comprometida com a retomada da operação da usina", que os trabalhos de reparo seguem o cronograma acertado com o governo, que vem fiscalizando o cumprimento do acordo. Segundo a Odebrecht, a empresa propôs como garantia um depósito de US$ 43 milhões e uma auditoria internacional para determinar as responsabilidades pelas falhas no projeto.
por Tânia Monteiro, no Estadão On-Line
aqui) só para me dar uma notinha baixa. Fechada a página, ele sente ter cumprido uma missão: “Pronto! Já detonei esse reacionário!” Os fariseus são agora uma corrente. E tentam me catequizar.

E o fazem atribuindo-me as coisas mais estúpidas, como a suposição de que critico o PT segundo o ponto de vista de quem lhe atribui características de um partido de esquerda tradicional, pré-Muro de Berlim. Bem, este não sou eu. Que a legenda seja caudatária de uma tradição autoritária, ah isto sim: digo e sustento. O que faço amiúde é ir buscar na história da esquerda alguns eventos que alimentaram a sua metafísica salvacionista, concedendo aos esquerdistas atuais, sejam amigos ou não do mercado (isso não me importa), a licença para a trapaça. E, se preciso, eu os desconstruo e demonstro que o demônio do totalitarismo estava na base daquelas escolhas. E pode estar presente nas opções de agora.

Mas e o PT? Sem jamais renunciar àquela metafísica, o partido foi descobrindo o seu próprio modo de ser autoritário — o que não quer dizer que não busque a inspiração em pretéritos mestres do ramo: Gramsci é, sim, a principal referência dos petistas que sabem ler. E foi o teórico comunista italiano que levou o partido a fazer uma escolha: “Primeiro vamos conquistar a democracia; o socialismo virá depois”. Hoje em dia, a perspectiva socialista, é evidente, ficou para a história. Mas isso não quer dizer que o partido renunciou à teoria de que a democracia não é um fim, mas um instrumento para o exercício do poder. Vale dizer: sua natureza continua essencialmente autoritária. E ela vai se revelando seja na soma de escândalos que aprendemos a ver como natural — relembro a história do aloprado do Banco do Brasil que acabou de ser promovido —, seja na tentativa de aprovar leis que engessam a democracia e a imprensa, aquela mesma que Lula disse que tem de ser livre. Então agora reúno os dois pilares deste artigo: as minhas reservas ao petismo, caracterizadas por certo pensamento adesista e desinformado como passadistas, e as escolhas concretas do partido e do governo — que revelam essa natureza autoritária.

O Planalto enviou ao Congresso um projeto de lei que criminaliza as fontes e os jornalistas que divulgarem informações sigilosas. Trata-se de uma estrovenga autoritária, saída da cabeça travessa de Tarso Genro. Pelo texto, se um jornalista tiver acesso a uma gravação de investigação sob sigilo, por exemplo, está impedido de divulgá-la — ou virá punição severa para ele e para a empresa em que trabalhar. E o que disse Lula ontem? "Liberdade de imprensa não pode pressupor que alguém possa roubar informações, e elas possam ser divulgadas sem que a pessoa que tenha roubado fique impune, porque senão você terá dois tipos de cidadãos no Brasil: um que estará subordinado à Constituição e à legislação e um que pode tudo".

Não resisto a observar que esses dois tipos de cidadãos já existem: há os petistas e os outros, como é notório. Adiante. Tratada a questão da maneira como ele tratou, parece tudo muito razoável, não? Nem parece que o texto de Tarso Genro viola dois artigos da Constituição, o 5º (“é assegurado a todos o acesso à informação e resguardado o sigilo da fonte, quando necessário ao exercício profissional”) e o 220 (“A manifestação do pensamento, a criação, a expressão e a informação, sob qualquer forma, processo ou veículo não sofrerão qualquer restrição, observado o disposto nesta Constituição”).

Ainda entre o libertarismo e o acacianismo aparentes, ele avançou: “Quando eu defendo a liberdade de imprensa, é porque eu digo todo santo dia: eu sou o que sou porque no Brasil teve liberdade de imprensa, mesmo quando falavam mal de mim. Eu não quero liberdade de imprensa para falar bem, quero liberdade pra falar a verdade. Quando as pessoas não falarem a verdade, o povo fará seu julgamento". A indagação que faço não tem alcance filosófico, é bem prática: “O que é a verdade, meu senhor? Quem é que a tem na coleira e a leva para passear?” Seria o próprio Lula? Seria Franklin Martins, com a sua ridícula Lula News? A propósito: Lula e Franklin negam até hoje que o mensalão tenha existido. No entendimento que ambos têm da verdade, aquilo não aconteceu. Atenção: Lula acredita (ou finge) — como sempre o fizeram as esquerdas e todos os autoritários, esquerdistas ou não — que existe “a” verdade. E suponho que ela seja íntima do partido que pretende falar em nome da maioria.

Mas ele foi adiante. Estava excitado ontem. Não é todo dia que se tem a chance de dar um pito no Jorgibúxi e ensinar ao mundo como se governa. Leiam um trecho do Estadão On Line: “Ao Estado, o presidente Lula reiterou que, no caso do grampo que revelou a conversa do presidente do Supremo, Gilmar Mendes, com o senador Demóstenes Torres (DEM-TO), o problema da quebra do sigilo seria facilmente resolvido se o jornalista que escreveu a matéria contasse quem lhe deu a informação. ‘Era fácil encontrar, saber quem fez o grampo, se o jornalista que fez a matéria dissesse quem é o cara’, disse Lula, acrescentando que, se isso ocorresse, ‘livrava todo mundo’.”Estupidez! “Livrava todo mundo quem, cara pálida?” Lula sempre foi a mais perfeita encarnação da famosa frase do jornalista americano H. L. Mencken (não vou procurar a citação exata; vocês acham com facilidade): “Todo problema complexo tem sempre uma solução simples, clara e errada.” O jornalista não tem de “livrar” a cara de ninguém. Sua única obrigação é publicar o que apura. E tenho uma outra novidade para este senhor: a reportagem não é um braço da polícia. Os órgãos se segurança do estado não se tornaram essa barafunda por acaso. Houve um partido que foi lá fazer mexericos e fuxicos, aparelhando órgãos que devem ser, acima de quaisquer outros, estritamente técnicos. A transcrição do grampo, cujo conteúdo foi confirmado pelos grampeados, saiu da Abin. O governo Lula que se vire para descobrir e punir os responsáveis. Quem pariu Mateus agora deve embalá-lo, especialmente na fase em que os monstrinhos fugiram do controle.

Ocorre que, para admitir este ponto de vista — e, eventualmente, para entendê-lo —, é preciso acatar a democracia como um fim em si mesmo, não como um meio:

- dêem um pé no traseiro dos perniciosos que afirmarem que o objetivo da democracia é fazer justiça;
- cuspam na moral do larápio que afirmar que a finalidade da democracia é garantir a igualdade;
- faça como Augusto dos Anjos recomendava que se fizesse em certas bocas quando dizem que o sentido da democracia é a inclusão social.

Isso tudo não passa de tramóia diversionista de quem pretende relativizar o regime de liberdades públicas, usando como cunha a agenda ou de supostas minorias influentes ou de maiorias de ocasião.

O governo Lula está tentando responder à desordem dos aparelhos de segurança do estado censurando a imprensa. É inaceitável! E inconstitucional! E, sim, continuarei a bater nessa gente por isso e a mostrar a genealogia de suas idéias. Antigo, antigo mesmo, no Brasil, é oferecer o lombo para o chicote.




Lula parece saber tudo sobre liberdade de imprensa. Mas ele, como de hábito, não sabe nada — o que não quer dizer que seja pouco inteligente, como já observei várias vezes. O presidente é capaz de fazer discursos de aparência libertária, mas de esconder nas dobras de raciocínios um tanto tortuosos e de um domínio sempre precário da língua um viés inequivocamente autoritário. Basta que se ouça direito o que diz. Entre as muitas vozes que lhe propuseram caminhos na economia em 2003, ele acabou ouvindo as que lhe indicaram as melhores saídas. E foi beneficiado por circunstâncias que não eram de sua escolha. O PT pôde, assim, negar a si mesmo para se consolidar no poder. Sorte do país que o melhor de Lula está no anti-Lula. Já chego lá. Mais algumas considerações prévias.

As reações de uns e outros ao livro "O País dos Petralhas" dizem bem os tempos em que vivemos. Começou a surgir um tipo novo no blog: os candidatos a conselheiros do Reinaldo Azevedo, gente disposta a salvar a minha alma do fogo do inferno e da solidão. Como manifestação isolada, sempre houve: aqui e ali, diziam: “Não seja tão radical”; “Você ainda critica o comunismo? Que coisa mais antiga!”; “Olhe que você acaba sozinho!”; “Que pena! Até escreve bem! Mas é tão antigo!” É parte da mesma escória que não lê o blog nem leu o livro, mas entra na área de comentários da Livraria Cultura (



Mas enquanto Lula dava lições de economia ao mundo e censurava George W. Bush por ter falado pouco sobre a economia na ONU — o governo mundial já foi criado, e seu primeiro líder é o Apedeuta —, o braço armado de Hugo Chávez no Equador, Rafael Correa, expropriava os bens da Odebrecht no país, mandava o Exército ocupar canteiros de obras tocados pela empresa e impedia a saída do país de dois de seus funcionários, que tiveram de se refugiar na embaixada do Brasil para não ser presos. Corrêa fez isso tudo ao arrepio das leis do próprio país. Fez por que quis. Alega que a Odebrecht é responsável pela falha numa obra e teria se negado a pagar uma multa.

No caso dos terroristas colombianos que ele acoitava, tivemos notícias muito precisas sobre a sua retidão moral. E lembrem-se que o filoterrorista contou com apoio integral do Itamarati, nessa fase de vergonha a que o submete o chanceler Celso Amorim. Agora, só para exercitar o raciocínio, digamos que o bufão tenha razão nas suas reclamações: é assim que se faz? Ele nem mesmo precisou de uma lei para impedir os brasileiros de deixar o país. Escrevi certa feita que, em matéria de humilhação, o Brasil só aceita ser enxovalhado por países irrelevantes. Eis aí.


Vi Amorim ontem na televisão... Deus do céu! Comecei a desenvolver uma relação estranha com o homem: sempre que ele fala, tenho uma sensação vizinha da vergonha. É como se sentisse por ele o que ele já não consegue mais sentir por si mesmo. O que ele disse sobre a ação de Correa? Leiam:

“O efeito prático do decreto foi impedir que estes dois diretores saiam, além do aspecto de ter presença militar, mas não são propriedades da Odebrecht, então eu acho que a questão ainda será discutida nos próximos dias e nós esperamos que possa ser resolvida. Houve, digamos, ações preventivas da parte do governo do Equador, mas não houve, por exemplo, um confisco”.

Ah, não. Não espero que um chanceler saia chutando a canela de um chefe de estado ou declarando guerra. Mas um mínimo de inconformismo, em situações como essa, é uma obrigação moral. Nada! A preocupação de Amorim era uma só: demonstrar que Correa não tinha feito nada demais.


O Brasil se tornou o principal fiador dos regimes autoritários de Rafael Correa, Hugo Chávez (Venezuela) e Evo Morales (Bolívia). No caso, então, do país vizinho, a coisa é ainda pior: sob o pretexto de combater supostos golpistas, Lula emprestou seu integral apoio à sanha — esta, sim, golpista — do índio fajuto, que decidiu impor uma Constituição aprovada contra as regras que a criaram e sob a pressão de seus milicianos.

Ao receber ontem um prêmio da agência de notícias IPS, em Nova York, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva fez veemente defesa da liberdade de imprensa.

"Ao trilharmos o caminho da justiça social, a pluralidade, a liberdade e a independência das fontes são fundamentais para um diálogo democrático, equilibrado e esclarecedor", afirmou. "O acesso livre e desimpedido da informação é fundamental para se construir um mundo mais justo e próspero."

As afirmações de Lula apontam para direção contrária do que vem fazendo sua equipe. Está em preparação um projeto de lei que criminaliza o vazamento de informações sigilosas, responsabilizando quem fornece os dados e quem os publica. O texto está em análise na Casa Civil e na semana passada foi apoiado pelo ministro da Defesa, Nelson Jobim. Em depoimento à CPI dos Grampos, ele afirmou ser necessário discutir se a imprensa não seria co-autora dos vazamentos de informações sigilosas.

Em seu discurso, Lula afirmou ser resultado direto da liberdade de imprensa. "Eu sou resultado da democracia. Eu sou resultado da liberdade de imprensa. Eu não teria chegado à Presidência se não fosse a democracia e a liberdade", disse. Lula foi premiado por sua atuação pela justiça social.

por Tânia Monteiro, no Estadão

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