terça-feira, 22 de fevereiro de 2011

Mais uma Bala Perdida

Não há dúvida de que é agradável viajar em trens de alta velocidade. Esse tipo de transporte é pouco poluente, rápido e confortável. No entanto, sabe-se também que é ainda melhor morar em um país que possui escolas públicas de boa qualidade para qualquer criança, independente do local de nascimento ou do poder aquisitivo da família, como ocorre na Finlândia. É também agradável morar em um país em que os hospitais são tão bons que não se sabe quais deles são públicos ou privados, como acontece na Alemanha.

O ideal seria morar em um país que possuísse boa infraestrutura, inclusive com disponibilidade de trens de alta velocidade, boas escolas, com professores capacitados, e excelente serviço de saúde pública.

Infelizmente, o Brasil ainda está longe de ser esse país; assim, não pode se dar ao luxo de embarcar em aventura de elevado custo, cujo retorno social é altamente incerto. O projeto do trem-bala não é prioritário para um país que ainda sofre para melhorar a qualidade do seu ensino, melhorar os serviços de saúde e recuperar a infraestrutura que tira a competitividade do setor privado, devido à carência de investimentos em portos, aeroportos, energia e rodovias, como mostraram vários estudos do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (comunicados nº 48, 50, 51, 52 e 54). Projetos de trens de alta velocidade são caros em qualquer lugar do mundo, e o Brasil não é exceção. O projeto do trem-bala brasileiro está orçado em R$ 33 bilhões, mas nesse valor não está incluída a parcela de reserva de contingência para arcar com eventuais custos não programados do projeto.

Some-se a isso os fatos de o projeto envolver subsídios de até R$ 5 bilhões para as concessionárias e de a maior parcela do financiamento ser de recursos do BNDES, que não os tem e vai precisar de mais um empréstimo do Tesouro Nacional, como autorizado pela medida provisória nº 511, de 5 de novembro de 2010, que empresta R$ 20 bilhões para o BNDES financiar o projeto.

É bom olhar o exemplo dos casos dos trens de alta velocidade da Itália, que começaram como projetos de parceria público-privada e terminaram sendo absorvidos integralmente pelo setor público, devido a sucessivos aumentos no custo de tal projeto. Isso levou a um aumento da dívida pública e do deficit público em mais de um ponto percentual do PIB.

No Brasil, o custo do trem-bala é tão incerto que a medida provisória acima mencionada dá carta branca para que o ministro da Fazenda renegocie esse empréstimo para 20, 30, 40 anos ou mais para compatibilizar o fluxo caixa do banco ao financiamento do projeto. Adicionalmente, o artigo 4º dessa mesma medida estabelece que, no caso de não pagamento, o BNDES será perdoado da dívida, que será arcada, integralmente, pelo Tesouro Nacional (leia-se nós, contribuintes).

Projeto de trens de alta velocidade têm elevado custo fiscal e não se sustentam sem elevados subsídios públicos. Esse não é um investimento prioritário para o Brasil neste e nos próximos anos, principalmente quando se reconhece que ainda precisamos avançar, além dos investimentos em saúde, educação e infraestrutura, na agenda de desoneração tributária da folha salarial e do investimento, que ainda não avançou por conta da impossibilidade de o governo abrir mão de receita fiscal. Insistir no projeto do trem-bala é mais uma prova de que ainda sofremos um pouco da megalomania do “Brasil do futuro” da década de 70, que nos levou à década perdida.

por Mansueto Almeida, do Ipea, na Folha de São Paulo

A Primeira de Muitas Ações que Estão Por Vir

O Ministério Público Federal no Distrito Federal entrou na Justiça contra o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o ex-ministro da Previdência Social Amir Francisco Lando por improbidade administrativa. Eles são acusados de utilizar a máquina pública para realizar promoção pessoal e favorecer o Banco BMG, envolvido no esquema do mensalão.

Segundo a Procuradoria, as irregularidades teriam aconteceram entre outubro e dezembro de 2004. Na ocasião, mais de 10,6 milhões de cartas de conteúdo propagandístico teriam sido enviadas aos segurados do INSS com dinheiro público. As cartas informavam, conforme o Ministério Público, sobre a possibilidade de obtenção de empréstimos consignados com taxas de juros reduzidas.

A manobra teria custado cerca de R$ 9,5 milhões aos cofres públicos, gastos com impressão e postagem das cartas. De acordo com a Procuradoria, não havia interesse público no envio das informações e a assinatura das correspondências diretamente pelo então presidente da República e pelo ex-ministro da Previdência foi realizada para promover as autoridades.

Outra irregularidade apontada pelo Ministério Público foi o favorecimento do Banco BMG, única instituição particular apta a operar a nova modalidade de empréstimo naquela época. Segundo a ação, chamou atenção a rapidez no processo de convênio entre o BMG e o INSS –durou apenas duas semanas, quando o comum é cerca de dois meses.

“Diante do apurado, podemos concluir facilmente que a finalidade pretendida com o envio das correspondências era, primeiramente, promover as autoridades que assinavam a carta, enaltecendo seus efeitos e, consequentemente, realizando propaganda em evidente afronta ao art. 37, 1º da CF e, ao mesmo tempo, favorecer o Banco BMG, única instituição particular apta a operar a nova modalidade de empréstimo”, afirma o Ministério Público.

Para garantir a devolução dos valores gastos, a Procuradoria pede o bloqueio de bens dos acusados. A assessoria de Lula informou que soube da ação por nossa reportagem e que iria acionar a defesa do ex-presidente para tratar do assunto.

na Folha On-Line