sexta-feira, 13 de junho de 2008

Movimentos Sociais pela Terra: A Bandidagem Continua

Representantes da Via Campesina entregaram nesta quinta-feira ao chefe-de-gabinete da Presidência da República, Gilberto Carvalho, um documento com propostas "consideradas estruturantes para o desenvolvimento do campo". Desde ontem, a Via Campesina realiza manifestações em diversos Estados em protesto contra o agronegócio e a atuação de empresas estrangeiras no país.
No documento, os movimentos sociais defendem a criação de uma estatal de fertilizantes e sugerem medidas de estímulo a programas de fomento a agroindústrias para produção de alimentos e agroenergia, reflorestamento e infra-estrutura em assentamentos.
Outra proposta é a ampliação do orçamento do Programa de Aquisição de Alimento para R$ 1 bilhão por ano, a fim de garantir a compra dos produtos da agricultura familiar e da reforma agrária pela Conab (Companhia Nacional de Abastecimento).
"A humanidade vive hoje uma encruzilhada. Só temos uma saída para essa crise [de alimentos], que é a restruturação das comunidades camponesas, dos territórios camponeses e comunidades tradicionais, para que a gente possa, através dos recursos da agrobiodiversidade, da terra, da água, produzir alimentos para este país", disse Maria Costa, representante da direção nacional do MAP (Movimento dos Pequenos Agricultores) e da coordenação da Via Campesina.

Manifestações
A Via Campesina realizou hoje manifestações em sete Estados na jornada de lutas contra o agronegócio e a atuação de empresas estrangeiras no país. Os protestos foram realizados em protestos em Minas Gerais, Rio da Janeiro, Paraná, Rio Grande do Sul, Goiás, Mato Grosso, Pernambuco.
Em Minas Gerais, cerca de 1.500 integrantes Via Campesina ocuparam a ferrovia da Vale em Governador Valadares, para que a mineradora abra negociação com as 500 famílias da comunidade Pedra Corrida, que será desalojada pela barragem de Baguari. Os manifestantes respeitaram decisão da Justiça e saíram da estrada de ferro no final da tarde.
No Rio, cerca de 400 integrantes de movimentos sociais fizeram manifestação na porta da sede da Vale. Eles arremessaram cerca de 200 cascas de bananas contra o prédio da empresa em protesto contra a privatização da mineradora e supostos danos ambientais causados pela Vale ao redor do país.
No Paraná, cerca de 700 manifestantes protestaram em frente a fábrica de fertilizantes Bunge em Araucária, região metropolitana de Curitiba.
No Rio Grande do Sul, cerca de 200 agricultores assentados e acampados marcharam até a Fazenda Tarumã, em Rosário do Sul, para denunciar práticas ilegais da transnacional de celulose Stora Enso.
Em Mato Grosso, cerca de 300 manifestantes realizaram um ato público em Diamantino, no encerramento de uma marcha de 80 Km, que partiu de Nova Marilândia no dia 5.
Em Goiânia (GO), 150 manifestantes protestaram em frente à CELG (Companhia Energética de Goiás) contra o preço da energia.
Em Pernambuco, cerca de 500 trabalhadores rurais e índios Xukuru trancaram a BR-232 e outros 400 pessoas bloquearam a BR-110, que liga os municípios de Inajá e Ibimirim, contra o avanço da monocultura da cana.
Segundo Maria Costa, as atividades de mobilização da Via Campesina deverão continuar nos próximos dias. "Como essa é uma jornada política, ela é permanente. As ações terão continuidade sim, porque não podemos dar trégua. Enfrentamos desafios diários e permanentes", disse.

da Agência Brasil e da Folha On-line


O pretexto é o de menos. O que importa é que, quando quer, onde quer e como quer, a Via Campesina, representada no Brasil principalmente pelo Movimento dos Sem-Terra (MST), investe contra uma coleção de alvos que inclui propriedades rurais, centros de pesquisas agronômicas, canteiros de obras, rodovias, ferrovias, hidrelétricas e ainda indústrias e escritórios. Em resumo, contra a ordem econômica e social, substrato da ordem política, como está definida na Constituição de 1988 - que o partido do presidente da República se recusou a assinar. O mote para a sortida predatória, anteontem, em 13 Estados, foi a alta do preço dos alimentos, provocada pelo suspeito de sempre, o modelo agrícola brasileiro, ultimamente em conluio com o também demonizado cultivo de cana para a produção de etanol.
Os ''campesinos'' têm horror, na realidade, ao mundo contemporâneo. A sua Internacional - diferentemente daquela outra que podia ser acusada de tudo, menos de pregar a desmodernização das ''bases materiais da existência'', como diziam os seus teóricos - persegue uma fantasia insana: a destruição do capitalismo para tornar possível a exumação do modo de organização da economia e da sociedade que precedeu a Revolução Industrial. É a utopia do retrocesso, nostálgica de uma idealizada Idade Média. Não é coincidência, a propósito, a proximidade entre esses novos milenaristas e setores da Igreja Católica praticantes da Teologia da Libertação, que também consideram anátema as transformações tecnológicas e o cosmopolitismo da era da globalização.
Mesmo quando apontam para problemas efetivos, como a disparada dos preços dos alimentos, a Via Campesina e suas extensões nacionais invocam causas falsas e soluções fictícias. E, ainda que se exprimissem por meios civilizados, com eles o debate de quaisquer questões é por definição impossível. Imagine-se, por exemplo, o presidente Lula tentando convencê-los com dados objetivos, como fez na cúpula da FAO em Roma, de que o aumento da área plantada para a obtenção do etanol de cana não tira um hectare de terra destinada ao cultivo de grãos.
Cegos pelo fanatismo e viciados em violência, 200 depredadores invadiram na terça-feira uma estação experimental de cana-de-açúcar mantida pela Universidade Federal Rural de Pernambuco em parceria com o setor sucroalcooleiro, no município de Carpina. Sem nada nem ninguém a impedi-los, destruíram mudas de novas variedades do vegetal e vandalizaram uma área plantada de 100 hectares, alegando que ali poderiam ser assentadas 50 famílias. É de emudecer. O ataque à instalação científica - réplica da destruição de um laboratório da Aracruz, no Rio Grande do Sul, em março de 2006 - fez par com as manifestações em Alagoas, Bahia, Paraná, Tocantins e São Paulo contra... a luz elétrica. De fato, usinas hidrelétricas estão na lista negra dos exércitos do atraso.
No centro da capital paulista, uma turba da Via Campesina e da Assembléia Popular - movimento articulado por setores da Igreja -, com cerca de 400 integrantes, ocupou a sede do Grupo Votorantim para protestar contra a construção da Usina de Tijuco Alto, no Vale do Ribeira. A empresa divulgou uma nota em que diz que sempre esteve aberta ao diálogo ''com todos os setores da sociedade'' e considera ''inaceitável'' a violação das leis vigentes no País. É duplamente patético. Primeiro, porque o termo diálogo não existe no léxico dos violentadores da ordem democrática. Segundo, porque o fato de serem inaceitáveis as suas ações não muda uma vírgula na situação. É clamorosa a liberdade de que eles desfrutam para transgredir. De raro em raro a polícia aparece para contê-los. Foi o que aconteceu anteontem na invasão de uma fábrica da multinacional de alimentos Bunge, no município gaúcho de Passo Fundo.
A rigor, é como se houvesse um acordo tácito entre os agressores e o poder público. Eles podem nutrir delírios medievais, mas parecem ser suficientemente espertos para não extrapolar nas suas incursões, praticando crimes contra a pessoa que levantariam tamanha grita a ponto de obrigar o Estado a acabar com a sua consagrada impunidade.


do Editorial do Estado de São Paulo, em 12/06/2008

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