Uma briga entre sócios da empresa de transporte aéreo de cargas VarigLog está trazendo à tona informações que circulavam apenas no submundo dos negócios, relacionadas à venda da Varig, em 2006 e 2007. O fundo de investimentos americano Matlin Patterson e os sócios brasileiros Marco Antônio Audi, Marcos Haftel e Luiz Gallo disputam na Justiça o comando da VarigLog. No bate-boca entre os sócios, surgiram histórias de tráfico de influência, abuso de poder pelo primeiro escalão do governo, acusações de suborno e a elaboração de um dossiê falso. As denúncias envolvem o Palácio do Planalto e o advogado Roberto Teixeira.
Para falar sobre esse tumultuado período da aviação brasileira, a reportagem procurou a ex-diretora da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) Denise Abreu. Ela deixou o cargo em agosto de 2007, sob pesadas críticas e acusações durante a CPI do Apagão Aéreo. Chegou a ser responsabilizada pelo caos aéreo e pelo acidente da TAM. Também foi acusada de fazer lobby para a TAM. Embora não fosse presidente da agência, por seu estilo agressivo, era considerada a diretora mais forte. E ficou conhecida pela foto publicada no Estado em que aparece fumando um charuto no casamento da filha do colega de agência, Leur Lomanto, em Salvador, no auge do apagão aéreo. Agora, quer dar sua versão dos fatos. "Não consigo mais trabalhar, preciso me defender e contar o que sei", diz ela, que acredita ter sido alvo de armação. "Eu sequer fumo charuto."
Denise conta que foi pressionada pela ministra Dilma Rousseff e pela secretária-executiva da Casa Civil, Erenice Guerra, a tomar decisões favoráveis à venda da VarigLog e da Varig ao fundo americano Matlin Patterson e aos três sócios brasileiros. Como a lei brasileira proíbe estrangeiros de ter mais de 20% do capital das companhias aéreas, a diretora queria documentos comprovando a origem de capital e a declaração de renda dos sócios brasileiros para verificar se tinham recursos para a compra. "A ministra não queria que eu exigisse os documentos. Dizia que era da alçada do Banco Central e da Receita e falou que era muito difícil fazer qualquer tipo de análise tentando estudar o Imposto de Renda porque era muito comum as pessoas sonegarem no Brasil."
Quem representava os compradores da VarigLog e da Varig era o escritório do advogado Roberto Teixeira, amigo do presidente Lula. Na Anac, a filha e o genro de Teixeira, os advogados Valeska Teixeira e Cristiano Martins, circulavam livremente, conta Denise. Ela descreve a atuação de Valeska como truculenta. "Ela liga direto da reunião para o pai. Sabe pressão psicológica? Ao fim da reunião, ela diz: agora temos de ir embora porque papai já está no gabinete do presidente Lula."
Outro personagem importante desse período da aviação brasileira, o empresário Marco Antônio Audi, sócio da VarigLog, também falou sobre o episódio. Hoje afastado da gestão da VarigLog pela Justiça de São Paulo - que acusa ele e dois sócios de serem "laranjas" do fundo americano -, Audi diz que só foi possível aprovar a compra da VarigLog pela influência de Teixeira no governo e na Anac. "Paguei US$ 5 milhões ao Roberto Teixeira para cuidar do caso", diz Audi.
Com a aprovação da compra da VarigLog pelo fundo Matlin e seus sócios brasileiros, eles puderam levar a Varig, em leilão, por US$ 24 milhões. Meses mais tarde, a empresa foi revendida à Gol, por US$ 320 milhões.
Hoje, Teixeira advoga para o maior inimigo de Audi, Lap Chan, representante do Matlin Patterson. "Tenho medo do Roberto Teixeira.", diz Audi. Durante o processo de dissolução societária na 17ª Vara de São Paulo, o juiz José Paulo Magano viu indícios de "prática de ilícitos civis e criminais, inclusive crime de quadrilha" e determinou que o Ministério Público e a Polícia Federal investiguem os sócios da VarigLog e o escritório de Teixeira. Procurados ao longo da apuração para falar sobre o assunto, a ministra Dilma e o advogado Teixeira não quiseram se manifestar.
por Mariana Barbosa e Ricardo Grinbaum, no Estado de São Paulo, em 04/06/2008
A ex-diretora da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac)Denise Abreu diz que a ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, e sua secretária-executiva, Erenice Guerra, pressionaram a Anac para aprovar a venda da empresa de cargas da Varig, a VarigLog, para o fundo de investimentos americano Matlin Patterson e três sócios brasileiros.
A sra. diz que foi pressionada durante seu período na Anac. O que aconteceu?
Em abril de 2006, poucas semanas depois de termos sido empossados, os quatro diretores da Anac foram chamados na Casa Civil para tratar do caso Varig. A análise da ministra-chefe da Casa Civil era que a empresa já estava falida. Nessa reunião, recebemos a determinação de fazer um plano de contingência para não deixar os passageiros desassistidos. Recebemos a instrução de que as linhas internacionais de longo curso deviam ser destinadas à TAM e as da América do Sul à Gol. Ponderamos que não era possível seguir esse rateio no mercado interno, já que outras companhias podiam querer esses destinos.
Qual foi o episódio de maior pressão na Anac?
Enquanto elaborávamos o plano de contingência da Varig, a agência estava avaliando a transferência acionária da VarigLog. Em janeiro, a VarigLog havia sido comprada pelo fundo americano Matlin Patterson, em sociedade com a Volo do Brasil, dos brasileiros Marco Audi, Luiz Gallo e Marco Haftel. Eles tinham uma tal de autorização prévia de funcionamento jurídico dada pelo antigo DAC. Como relatora do processo, descobri que não havia na legislação essa figura da autorização prévia. Revimos a autorização e expedimos um ofício com novas exigências, para podermos comprovar a origem do capital e também, por meio de declarações de Imposto de Renda, se os sócios brasileiros tinham condição de comprar a companhia. Isso era importante para adequar a operação ao Código Brasileiro de Aeronáutica (CBA), que impede que um estrangeiro tenha mais de 20% de uma companhia aérea nacional. A diretoria da Anac foi pressionada para aprovar essa transferência de capital da Variglog?Logo que expedi esse ofício, a sra. Valeska Teixeira, filha de Roberto Teixeira, foi à Anac, no Rio. Teve uma reunião bastante calorosa com o superintendente de serviços aéreos e, aos gritos, dizia que queria falar comigo. Na ocasião, pedi para levá-la à minha sala. Ela disse que divergia dos termos do ofício, que era muito amiga do ministro José Dirceu e afilhada do presidente da República. Eu respondi que isso era bom para a relação pessoal dela, mas não mudava nada. Disse ainda que, se entendesse que eu havia extrapolado das minhas funções de diretora da Anac, deveria interpor um mandado de segurança para o Judiciário decidir quem estava correta. Pouco depois, fomos novamente chamados na Casa Civil e, pela primeira vez, ouvi a ministra Dilma dizer que havia chegado denúncias de que eu e o diretor Jorge Velozo estaríamos fazendo o lobby da TAM. E o diretor-presidente Milton Zuanazzi e o diretor Leur Lomanto estariam fazendo o lobby da Gol. Por causa desse suposto lobby, nós teríamos dividido as linhas internacionais entre as duas empresas. Nós nos insurgimos contra essa afirmação, pois havíamos seguido as orientações da própria Casa Civil. A partir daí percebemos que havia algo estranho acontecendo com relação ao caso Varig.
A ministra chegou a cobrá-la pelas exigências de comprovação de origem de capital e de Imposto de Renda dos sócios à VarigLog?
Numa reunião, a ministra se insurgiu contra as duas exigências dizendo que isso não era da alçada de uma agência reguladora, mas do Banco Central e da Receita. Falou ainda que era muito difícil fazer qualquer tipo de análise tentando estudar o Imposto de Renda dos sócios da Volo porque era muito comum as pessoas no Brasil sonegarem imposto. Ela disse também que nunca ia se revelar como se deu a entrada desse dinheiro no País porque poderia haver um contrato de mútuo entre as empresas e que esse contrato, de gaveta, nunca apareceria. Eu respondi que a matéria deveria ser colocada sub judice e os meus colegas já haviam aprovado meu ofício no colegiado da Anac.
Houve alguma ação judicial contra a Anac?
Os representantes da empresa, por meio do escritório do Roberto Teixeira, entraram com uma ação para que a venda da VarigLog fosse aprovada. Eles também entraram com uma representação contra mim no Ministério da Defesa, dizendo que eu fazia lobby pela TAM.
Mas os documentos que a sra. exigia nunca foram apresentados, e mesmo assim a transferência de capital foi aprovada.
Sim. No dia 23 de junho. Fazia uns 15 dias que, por determinação do governo, estávamos despachando na sede do Ministério da Defesa, discutindo o plano de contingência para a Varig. Na sexta-feira 23, quando nós diretores chegamos ao ministério, fomos informados pelo presidente da Anac, Milton Zuanazzi, que teríamos de votar o caso VarigLog naquele dia. A senhora Valeska e o Cristiano Martins (seu marido e sócio) estavam na ante-sala, aguardando a decisão.
Até então a apreciação do caso não estava programada para aquele dia...
Que eu soubesse, não.
Os advogados da VarigLog souberam antes de vocês...
Eu apresentei uma petição para o dr. Milton me dando por impedida de votar. Pela lei, se há uma representação contra uma autoridade que vai decidir, ela é considerada suspeita para votar aquele caso. Poucas horas depois, os advogados da VarigLog apresentaram um protocolo de retirada da representação que haviam feito contra mim no Ministério da Defesa. Aí eu ponderei que havia uma ação judicial tratando dessa matéria e citava nominalmente a mim. Portanto, eu continuava impedida de votar. Aí os advogados da VarigLog foram à Justiça Federal e protocolaram a desistência da ação. Tudo no mesmo dia. Como eles desistiram da ação, infelizmente, a decisão judicial, que havia sido proferida no dia anterior mas ainda não havia sido publicada, passou a não ter valor. O desembargador havia decidido que a Anac estava correta, que tinha o poder de investigar não só a origem do capital, como a capacidade financeira de cada pessoa física.
Não havendo mais impedimento, solicitei uma manifestação da Procuradoria-Geral da Anac. No mesmo dia, apareceu um parecer do procurador João Elídio dizendo que não era competência da Anac exigir os documentos de origem de capital e o Imposto de Renda.
O procurador foi pressionado?
Ele me disse que sim. Contou que ligaram da Casa Civil para ele e ele disse que estava internado. Depois a dra. Erenice ligou no celular dele para perguntar como ele estava de saúde, que ela gostaria muito de mandar o subchefe da Casa Civil visitá-lo no hospital.
Ele estava internado?
Ele disse que estava internado, não fui visitá-lo, não tinha tempo.
Ele foi internado quando soube que tinha que dar o parecer?
Não sei se foi em conseqüência disso, mas foi tudo no mesmo dia. O que eu soube é que, depois de receber o telefonema da dra. Erenice, ele teria saído do hospital e ido a uma reunião na Casa Civil. Pouco depois, ele emitiu seu parecer. Mas, enquanto não chegava o parecer do procurador, eu saí do ministério. Só voltei quando o presidente da Anac me chamou, às 11 da noite, para finalmente votarmos a matéria. No dia seguinte, oficiei a todos, ao Banco Central e à Receita, pedindo que se verificasse a origem de capital e o Imposto de Renda dos sócios da VarigLog. Enquanto eu estava na Anac, não tive resposta.
Por que havia tanta pressa em votar o caso da VarigLog no dia 23?
Não sabíamos à época. Depois, quando a VarigLog comprou a Varig no leilão, é que vimos que uma matéria estava atrelada à outra. Se não aprovasse a transferência acionária da VarigLog, ela não existiria e não poderia participar do leilão.
A sra. também diz que a Anac teve problemas no episódio de venda da Varig. Uma das questões dizia respeito à dúvida se o comprador da Varig herdaria as velhas dívidas da companhia. O que aconteceu?
O procurador-geral da Fazenda Nacional, Manoel Felipe Brandão, deu algumas declarações dizendo que a sucessão de dívidas não estava afastada. Ao saber disso, o juiz Ayoub (Luiz Roberto Ayoub, da Vara Empresarial do Rio de Janeiro) solicitou uma audiência com o procurador, em Brasília. O procurador achou que ia receber só o juiz. Mas a diretoria da Anac também foi chamada, além de um assessor da Erenice e alguns jornalistas. Enfim, uma quantidade de pessoas bem maior do que ele imaginava, e ele manteve seu posicionamento. Em poucos dias, ele saiu da procuradoria e foi colocado o procurador Luís Adams. Aí foi emitido um parecer garantindo que não havia sucessão de dívidas.
Como era a atuação dos advogados do escritório Teixeira, Martins e Advogados?
O caso VarigLog/Varig é o caso em que tivemos a participação muito intensa de advogados dentro da Anac. Não lembro de outros casos. Nunca vi o Roberto Teixeira na Anac em Brasília. Sei que ele participou de algumas reuniões no Rio. A filha e o genro iam muito à Anac em Brasília.
E como era a atuação da Valeska?
Era truculenta. Recentemente vi um boletim de ocorrência do Marcos Haftel (sócio brasileiro da VarigLog) contra ela, em que confirma essa truculência. Ela liga da reunião para o pai. Sabe pressão psicológica? Ao final de uma reunião, acompanhada pelo esposo, ela diz: "Agora temos de ir embora porque o papai já está no gabinete do presidente Lula".
O nome de Roberto Teixeira aparecia nas reuniões da Casa Civil?
Nas reuniões de plano de contingência, ou para aprovar ou não a VarigLog, sobre transferência do cheta da Varig, em várias oportunidades, ouvimos a Erenice falando com o Zuanazzi sobre o tema e se referindo a alguém como "papai". Ou a Erenice e a ministra Dilma dizendo uma para a outra: "Porque o papai precisa analisar". Eu só sabia que todos nós que estávamos na reunião não éramos "papai".
Como eram essas reuniões na Casa Civil. Quem convocava?
O Milton nos comunicava que a ministra Dilma havia convocado a reunião e deveríamos participar, como colegiado.
Tecnicamente, era função da ministra ou a senhora sentia que havia uma ingerência indevida?
Tecnicamente, uma agência reguladora não está vinculada ao governo. A lei da Anac é clara e dá autonomia funcional, administrativa e de gestão à agência.
Na prática, a ministra mandava na Anac?
A Anac é um órgão muito grande. Seria uma irresponsabilidade dizer que ela mandava na Anac. Mas existia uma tentativa de monitoramento das ações da diretoria com relação a esse caso: Varig e VarigLog.
A sra. diz que foi vítima de um dossiê falso. Como foi?
Um mês depois da minha saída da Anac, recebi um envelope na casa da minha mãe. Foi preparado como um dossiê, só com informações falsas. Fui ao meu advogado e pedi para que a documentação fosse levada para a Polícia Federal investigar quem elaborou o dossiê. Demos entrada na PF e o caso foi remetido à Polícia Civil de São Paulo, para investigar crimes de calúnia e tentativa de extorsão.
O que tinha no dossiê?
O dossiê diz que eu teria contas no Uruguai e remeteria dinheiro para Luxemburgo. E teria usado cartões de crédito para fazer saques em dinheiro e pagar eventos onde teria me encontrado com o coronel Velozo e o Anchieta (Anchieta Hélcias, vice-presidente do Sindicato Nacional de Empresas Aeroviárias, ligado à TAM). Ao ler o dossiê, passei a entender uma série de questionamentos que recebi de deputados durante a CPI do Apagão Aéreo e que na hora eu não havia entendido. Também entendi por que, em 2006, a ministra Dilma afirmou que eu e o Velozo fazíamos lobby para a TAM e o Leur e o Zuanazzi fariam para a Gol.
A sra. tem alguma suspeita da autoria do dossiê?
Eu relatei os inúmeros tumultos ao longo do processo, que podem apontar o caminho para a polícia fazer a investigação. Agora cabe ao delegado fazer o link e chegar às suas conclusões.
Sua suspeita é que seria alguém que teve o interesse contrariado durante sua gestão na Anac?
Com certeza.
O que sempre se falou é que a sra. agia em nome dos interesses da TAM e que tem um irmão que advogou para a TAM. Qual é a sua relação com a TAM?
Eu não tenho relação com a TAM. Jamais recebi qualquer benefício da empresa. Meu irmão foi advogado - e isso descobri a posteriori - muito antes de imaginar que eu, procuradora do Estado de São Paulo, iria trabalhar no governo do presidente Lula e, depois, seria indicada para uma agência que ainda não havia nascido. A Comissão de Ética Pública da Presidência da República julgou esse caso, recentemente, e arquivou a questão de ter irmão advogado e disse que não há nenhuma conduta antiética.
por Mariana Barbosa e Ricardo Grinbaum, no Estado de São Paulo, em 04/06/2008
Acusado pela Justiça paulista de ter sido "laranja" do fundo americano Matlin Patterson para comprar a VarigLog e a Varig, o empresário Marco Antônio Audi refuta as denúncias. Mas diz que, desde o início, sabia das dificuldades que ia enfrentar para conseguir a aprovação legal para a compra das empresas. Audi diz que contratou o advogado Roberto Teixeira e combinou um pagamento de US$ 5 milhões para que ele resolvesse o problema - um valor muito mais alto do que os honorários de outros advogados, segundo o próprio Audi. "Não sei o que o Roberto Teixeira negociou. Eu só sei que investi nele, ele tinha de trazer resultados e trouxe. Sua influência foi 100% decisiva." A seguir, os principais trechos da entrevista.
O juiz Magano, da 17.ª Vara Cível de São Paulo, diz que você e os outros dois sócios brasileiros são laranjas do Lap Chan, sócio do fundo Matlin Patterson.
Não é verdade. A idéia de comprar a VarigLog foi minha e eles acreditaram que o negócio ia dar certo e toparam. Eu propus para o Lap investir via empréstimo. Eu queria ficar com 20% e com toda a gestão. E eu falei para ele que tínhamos de achar outros sócios brasileiros que fiquem com o restante, por causa da lei. E ele me indicou o Marcos Haftel e o Luiz Gallo. Mas não como laranjas. Era uma sociedade normal.
Como o sr. conheceu o advogado Roberto Teixeira?
Assumimos a VarigLog em janeiro de 2006. E logo começou uma pressão muito grande de todo o pessoal da Varig e também da concorrência. Aí, em fevereiro, comecei a procurar um advogado muito bom de direito regulatório, pois precisávamos aprovar a transferência de capital da empresa. Uns amigos me indicaram o Roberto Teixeira. Eu não tinha a menor idéia de que ele era parente, compadre do presidente Lula. Tive empatia com ele. Ele me convenceu de que seria a pessoa certa. Na época, o escritório dele era muito simples, metades das luzes estavam apagadas por economia.
O que ele falou para te convencer?
"Eu vou provar para você que tenho influência no governo e um acesso muito forte ao DAC (Departamento de Aviação Civil)." Na época não era nem Anac. Contou o caso da Transbrasil falando que tinha conseguido segurar a briga com a Gol, que queria as áreas da Transbrasil nos aeroportos.
Quais foram os honorários do escritório Teixeira e Martins?
Era misto de horas trabalhadas e uma taxa de sucesso que, se não me engano, era de US$ 800 mil a US$ 1 milhão. Do contato até a aprovação da VarigLog foram US$ 5 milhões. Está tudo contabilizado, pago com transferência bancária ou cheque nominal cruzado para a empresa dele.
Não é muito?
Não é pouco. É um advogado muito caro.
Ele chegou a citar em algum momento que teria de gastar algum dinheiro com propina?
Se ele gastou esse dinheiro com alguma coisa assim, não tenho conhecimento. Por algumas vezes, ele tentou me falar que certas coisas facilitariam muito, mas nunca aceitei.
Como ele "tentava falar"?
Você sabe que tem mil maneiras de dizer bom dia. E ele me disse "bom dia". Você pagou o que ele estava pedindo, pois ele falou que resolveria seu problema. E resolveu tudo. Mas agora tenho esse monstro contra mim. A aprovação da estrutura societária da VarigLog na Anac saiu no dia 23 de junho, logo depois de a VarigLog apresentar uma proposta para comprar a Varig...Realmente, quando ficou claro que éramos a única esperança para a compra da Varig, foi quando saiu a aprovação da VarigLog. Não sei o que o Roberto Teixeira negociou. Eu só sei que investi nele, ele tinha de trazer resultados e trouxe.
Sua influência foi decisiva?
Cem por cento decisiva.
Como era o poder dele? Onde ele era mais influente? Na Anac, no Planalto?
Ele me apresentou a várias pessoas. Ao presidente da República, à ministra Dilma Rousseff (Casa Civil), ao ministro Waldir Pires (Defesa), ao Luiz Marinho (Trabalho).
Qual era o propósito das visitas?
Ele me dizia que era importante conhecer fulano de tal agora. Eu pegava o avião e ia lá. Conversava, falava das nossas intenções. Eram encontros 100% formais.
Ele demonstrava intimidade com ministros?
Muita. Não é pouco. Chegava nos ministérios e era reconhecido na recepção. Mandavam subir. Ele tentou várias vezes ter conversa atravessada comigo. Mas neguei todas as investidas. Hoje vejo que era minha inocência. Mas eu nunca deixei ninguém chegar perto da gente. Nossa contabilidade, da Volo, VarigLog e Varig, está aberta para qualquer um.
Quando vocês resolveram comprar a Varig não temiam herdar as dívidas da empresa?
Todos os advogados consultados pela Gol, TAM e outras diziam que ia ter sucessão (das dívidas), mas eu acreditava que não. E o Roberto Teixeira me deu um conforto, dizendo: "Marcos, vamos em frente que não vamos ter sucessão".
Depois de comprar a Varig, como foi a disputa para obter o cheta (a autorização para funcionamento da companhia)?
Foi outra briga. Contra TAM, Gol, Anac. Foi uma briga muito feia, porque a pressão da TAM e da Gol para a não sobrevivência da Varig era muito forte. Levou seis meses para conseguirmos um novo cheta, pois a Anac dizia que não dava para transferir o cheta da velha Varig. Claro que dava. Mas todos os diretores da Anac eram contra. A gente salvando uma companhia daquela e o regulatório inteiro contra a gente. Alguém precisava ajudar, pois os caras iam nos matar.
E como foi vencida a resistência?
Não tenho dúvida que o Roberto Teixeira usou muito sua influência. Não só na Anac. A Anac estava um casulo para a Varig. A gente foi cumprindo todas as exigências e eles sempre iam pedindo mais coisas. Um dia eu tive uma reunião na Anac e disse, se vocês decidirem não aprovar, eu fecho a Varig em uma semana. Naquela altura, a Varig já estava com 2 mil funcionários, 23 aviões. No dia 14 de dezembro, ganhamos o cheta da Varig. Um dia depois fui ao presidente Lula, com o Lap (Chan). Estava a família feliz inteira, Valeska, Cristiano, Larissa, Roberto Teixeira. A Dilma também.
E poucas semanas depois, os srs. estavam negociando a venda da Varig. Por quê?
Uma semana depois do cheta, o Lap chegou para mim e disse que houve um racha no fundo e que ele não emprestaria mais dinheiro. Ele é muito seco, disse "acabou, não tem conversa". Ele já tinha emprestado US$ 211 milhões para o projeto Varig e US$ 135 milhões para a VarigLog. Pelo combinado, faltavam ainda US$ 270 milhões para o projeto Varig. Só tínhamos uma opção: vender a Varig, ou as duas empresas iriam quebrar. Juntas, as duas consumiam US$ 20 milhões por mês de caixa.
Quem vocês procuraram?
O Lap, que a essa altura estava muito próximo do Roberto Teixeira, disse que ia falar com o Constantino Junior, da Gol. Fui atrás da TAM. A TAM assinou um memorando de intenções, mas pediu dez dias para avaliar. Tentei segurar a negociação, pois achava que a proposta da TAM era melhor, mas o Lap insistia na proposta da Gol. Ele me apresentou o contrato pronto para assinar. Foi uma pressão enorme. O Lap estava desesperado. Sentei com o Junior uma única vez, num hotel. Ele é habilidoso, calmo, e falou: "Eu saio daqui com o negócio fechado ou você nunca mais vai me ver na vida". Era pegar ou largar.
Qual foi a participação do Roberto Teixeira nesse negócio?
A foto no elevador do Palácio do Planalto que o Estado publicou na época é reveladora. O Teixeira era advogado do vendedor e foi a uma reunião com Lula levando o comprador (Gol).
Em um certo momento, Lap Chan recorreu à Justiça dizendo que tinha o direito legal de comprar a parte dos brasileiros na VarigLog e que quem assumiria a empresa seria a Voloex. O que é a Voloex?
A Voloex é uma empresa que foi alaranjada pelo Lap com a ajuda do Roberto Teixeira. Está tudo em uma investigação policial. Eles compraram uma empresa de Santana do Parnaíba, mudaram a razão social, transferiram a sede para a Rua Padre João Manuel, mesma rua do escritório de Roberto Teixeira, e colocaram a irmã do Lap como sócia. Agora, vejam vocês, o Roberto Teixeira, que tanto defendeu a parte nacional e convenceu a Anac que nós não éramos laranjas, ajudou o Lap a criar uma empresa de laranjas para nos substituir. Gozado isso. E, se o Roberto Teixeira hoje diz para o cliente dele que nós somos laranjas, então ele sabia desde lá de trás que nós éramos laranjas? Ou ele agiu em nome do governo ou estava enganando o governo.
Quem está acusando vocês de serem laranjas?
O Lap.
Sob a orientação de quem?
Um cara como o Roberto Teixeira é um estrategista. Se você falar alguma coisa para ele que ele não queira, ele vira as costas e vai embora. Eu tive de brigar com ele várias vezes. Ele é deus. O que ele quer tem de ser feito ou você não contrata ele.
Você disse que tinha muito medo do Roberto Teixeira. Por quê?
Pelo poder que ele tem.
Onde?
No governo, na Justiça. As verdades vão aparecer. Talvez seja tarde, e eu esteja morto (não morto, morto), mas morto empresarialmente.
por Mariana Barbosa e Ricardo Grinbaum, no Estado de São Paulo, em 04/06/2008
A ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, não quis responder às declarações de Denise Abreu, ex-diretora da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac), de que ela teria feito pressões junto à sua secretária-executiva, Erenice Guerra, para que a agência tomasse decisões favoráveis à venda da Varig Log e da Varig para o fundo americano Matlin Patterson e os três sócios brasileiros (Marco Antonio Audi, Marcos Haftel e Eduardo Gallo).
A decisão da ministra foi repassada ao Estado por sua assessoria de imprensa. A assessoria foi informada também das acusações de que a ministra Dilma teria pressionado a agência a não exigir documentos para comprovar a origem do capital da empresa compradora nem a declaração de Imposto de Renda dos sócios brasileiros para verificar se eles tinham recursos para bancar a operação.
Procurados e informados do conteúdo da reportagem, os advogados Roberto Teixeira, Valeska Teixeira e Cristiano Martins não quiseram dar entrevista.
O ex-diretor presidente da Anac, Milton Zuanazzi, também foi procurado, mas não quis dar entrevista. Por meio de sua assessoria de imprensa, ele divulgou a seguinte nota: "Todas as decisões em sua gestão frente à Anac foram tomadas de forma transparente e democrática, pois foram aprovadas pelos membros da diretoria colegiada e acompanhadas por pareceres da Procuradoria Geral da Anac, órgão vinculado à Advocacia Geral da União, e divulgadas no site oficial da entidade."
Vamos lá! Olha a baderna em que a guerrilheira mentirosa - até sob tortura - se meteu desta vez, junto com sua braço direito Erenice Guerra e outros asseclas de menor escalão - mas de safadeza igual: mais um dossiê fajuto para incriminar, desta vez, Denise Abreu, ex-diretora da Anac.
Aliás, fabricar dossiês é fichinha prá quem planejava assaltos, seqüestros e assassinatos. Mas a pergunta que não quer calar é: quanto será que "Estela", quer dizer, Dilma Rousseff levou? E Erenice? O "adevogado" e seus auxiliares, já vimos; por baixo R$5 milhões - fora as "bolas" na transação toda.
Esse povo do PT realmente entende de maracutaias. É a especialidade deles, depois a guerrilha. E sabe o que é pior? Tem mais Dilma na parada. Veja só o que vai na coluna do Diogo Mainardi, na Veja (com minhas anotações em destaque):
"Em minha última coluna [veja aqui], informei que a mulher de Olivério Medina, o representante das Farc no Brasil, foi contratada pelo governo Lula. Isso aconteceu em dezembro de 2006, quando o marido dela ainda estava preso em Brasília, à espera do julgamento no STF. Uma reportagem do jornal Gazeta do Povo mostrou que a mulher de Olivério Medina foi cedida pelo governo do Paraná a pedido de Dilma Rousseff. Epa, epa, epa! Pode repetir? Posso sim. Com prazer.
De acordo com um documento reproduzido pela Gazeta do Povo, e que pode ser acessado aqui [com reprodução abaixo], Dilma Rousseff requisitou pessoalmente ao governador do Paraná a transferência da mulher do preso das Farc. Uma dúvida: a ministra da Casa Civil demonstra esse mesmo interesse por todos os servidores de terceiro escalão?
O deputado Rodrigo Maia pediu esclarecimentos sobre o caso. O senador Arthur Virgílio, por sua vez, encaminhou um requerimento ao Ministério da Pesca [veja aqui]. Até agora, o governo Lula só emitiu uma nota sobre o assunto, prometendo me processar [no mesmo post citado acima]. É a escala de valores dessa gente: Olivério Medina - "el Pancho" - solto, e Diogo Mainardi - "o Pança" - condenado. Em sua nota, a assessoria de imprensa do Ministério da Pesca confirmou todos os dados relatados em minha coluna. Negou apenas que pudesse haver um elo entre o governo e as Farc. Eu ficaria muito surpreso se alguém admitisse o contrário.
O Brasil tem 50.000 assassinatos por ano. Isso é o que importa quando se trata das Farc. Ignore a retórica esquerdista. Ignore a mística guerrilheira. Concentre-se no essencial. E o essencial é o tráfico de drogas. O Brasil é um grande mercado consumidor das drogas produzidas nos territórios dominados pelas Farc. O Brasil é também um grande entreposto para o seu comércio internacional. O lulismo tenta passar a idéia de que as Farc dizem respeito apenas à Colômbia. E, marginalmente, à Venezuela e ao Equador. Mentira. O Brasil entra na guerra com sua monumental cota de assassinatos relacionados com o consumo e com o tráfico de drogas, e com todos os crimes que podem ser associados a eles: assaltos, contrabando de armas, jogo ilegal, lavagem de dinheiro. Cada um de nós, indiretamente, já foi assaltado pelas Farc. Cada um de nós conhece alguém que foi assassinado pelas Farc.
Minha pergunta é a seguinte: um governo que contrata a mulher de um membro das Farc, com a ajuda direta da ministra da Casa Civil, em documento assinado por ela, demonstra estar solidamente empenhado no combate ao tráfico de drogas? Aguardo a resposta. O crime organizado contamina a política. Há uma série de sinais nesse sentido, do caso do ex-secretário de segurança do Rio de Janeiro, que acaba de ser preso, aos atentados do PCC na última campanha presidencial, que afundaram a candidatura de Geraldo Alckmin; dos inquéritos sobre os perueiros, na campanha à prefeitura paulistana, ao pedido de propina de Waldomiro Diniz ao dono de um bingo. O governo Lula considera perfeitamente legítimo contratar, para um cargo de confiança, a mulher de um criminoso internacional preso por pertencer a um grupo que pratica o terrorismo e o tráfico de drogas. Eu respondo lembrando os 50.000 assassinatos por ano. Sabe como é: na guerra entre os traficantes de drogas e a lei, os mortos escolheram o lado errado."
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