terça-feira, 3 de junho de 2008

Inflação, Demagogia e Irresponsabilidade

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva, no seu programa semanal de rádio Café com o Presidente, fez, semana passada, um alerta sobre a inflação e disse ser importante que o povo entenda o seguinte: "A inflação é uma obrigação de todo brasileiro, que deve cuidar para que ela não aconteça. Sabe, é do trabalhador que compra, da dona de casa que compra, do empresário que produz, do atacadista que vende, do varejista e do governo".
Mais uma vez, sinto dizer que S. Exa. está redondamente enganado. A inflação, como bem dizia Milton Friedman, “é um fenômeno exclusivamente monetário”, causado pelo aumento da quantidade de moeda e/ou crédito sem o respectivo lastro. (É importante perceber que, enquanto toda inflação causa aumento de preços, nem todo aumento de preços é sinônimo de inflação).


A inflação, portanto, agora nas palavras de Ludwig Von Mises, "não é um ato de Deus (...) uma catástrofe da natureza ou uma doença que se alastra como a peste. A inflação é uma política, uma política premeditada" adotada por políticos e burocratas que, para nosso azar, são também os maiores beneficiários dela.
Não há qualquer fundamento científico em apontar como causas da inflação a ganância dos empresários, os circuitos de distribuição ou a falta de responsabilidade social das empresas e o descaso do consumidor, como pretende fazer o senhor Luiz Inácio. Com o conhecimento econômico hoje existente, não é mais possível culpar os agricultores, os pecuaristas, os frigoríficos, os açougues, os sindicatos ou o comportamento vil dos empresários sempre que os preços sobem ou há escassez de um ou outro produto.

Em seu discurso botocudo, Lula utiliza a mesmíssima esparrela que o governo argentino tem usado na tentativa de transferir para terceiros uma responsabilidade que é exclusivamente sua. Lá nos Pampas, o Leviatã austral, comandado pelo casal Kirchner, tem travado com os produtores rurais e industriais uma batalha sem tréguas, porém inútil, na tentativa de fazer com que estes aceitem vender seus produtos com prejuízo ou a preços mais baixos do que conseguiriam no mercado internacional. Tudo para tentar deter, na base da caneta, o dragão da inflação, cujos índices extra-oficiais já andam pela casa dos 40% ao ano, ainda que os dados oficiais (manipulados) ainda estejam nos 15%.
Assistindo ao que acontece hoje por lá, não dá para não traçar um paralelo com o nosso passado recente: pacotes, tabelamentos, pactos sociais, congelamentos, "tablitas", confiscos, fiscais do Sarney, caça ao boi no pasto e mais uma infinidade de bobagens heterodoxas para acabar com a inflação no porrete. Quem não tem memória curta sabe, perfeitamente bem, que essas estratégias, mais cedo ou mais tarde, fracassarão. E fracassarão simplesmente porque suas armas estão apontadas não para as causas do problema, mas para os seus efeitos; não para os verdadeiros inimigos, mas para as próprias vítimas. Afinal, como bem dizia o velho Mário Henrique Simonsen, "Para conceber um congelamento [ou tabelamento] não é preciso um doutorado em Harvard ou no MIT: basta não entender nada de economia."

Depois da crise econômica do início da década, os argentinos escolheram a pior maneira para sair da falência. Após operar um calote de proporções oceânicas – efusivamente aplaudido por toda a esquerda mundial e cantado em prosa e verso como a salvação para todos os países emergentes – o governo daquele país optou por fomentar a recuperação da economia através do velho artifício da elevação dos gastos públicos. Estes, por seu turno, eram financiados, principalmente, pelo uso do imposto inflacionário, via despejo de moeda sem lastro no mercado.

A curto prazo, como se viu, a estratégia foi um retumbante sucesso. O governo gastou à vontade, sem que precisasse aumentar tributos ou endividar-se. O povo, satisfeito com o crescimento de curto prazo e, como sempre, acreditando que existe almoço grátis, se habituou a pensar no Estado como senhor de recursos ilimitados à sua disposição.

Tal política é como uma droga, injetada diretamente na veia do homem-massa (apud Ortega Y Gasset) e, principalmente, dos seus representantes eleitos – já que as obras públicas e outras benesses sociais costumam satisfazer os primeiros e tornar extremamente populares os segundos.

Num primeiro instante, os investimentos estatais impulsionam a economia e a criação de empregos, gerando uma falsa impressão de prosperidade. (Aliás, esse efeito de curto prazo é o responsável pela grande popularidade das políticas monetárias expansionistas propaladas por Keynes, não por acaso autor da famigerada sentença: "a longo prazo estaremos todos mortos"). Mais cedo ou mais tarde, no entanto, o demônio – digo: a inflação – sempre cobra o seu preço e, infelizmente, castiga com mais rigor justamente os mais fracos. Quando o dinheiro começa a desvalorizar-se de forma acelerada, os que mais perdem são aqueles que não dispõem de meios para proteger os seus rendimentos, seja imobilizando-os, seja colocando-os ao amparo de uma moeda estrangeira forte ou simplesmente aplicando-os no mercado financeiro.

Mas os efeitos deletérios da inflação não param aí. Ela também acarreta mudanças no comportamento dos agentes econômicos, as quais, por sua vez, implicam em perda de eficiência dos mercados. Como a qualidade das informações fornecidas pelo sistema de preços se deteriora, aumenta o nível de incerteza quanto ao futuro, distorcendo a alocação eficiente de recursos. Além disso, com a desordem dos preços e a perda de critérios relativos de mensuração, os esforços dos agentes são desviados de atividades produtivas para atividades meramente especulativas, voltadas somente para a preservação da renda e da riqueza. Está então armado o cenário ideal para a debacle.

por
João Luiz Mauad em 03 de junho de 2008 no Mídia Sem Máscara

Nenhum comentário: