A política sindical do governo Lula converteu-se numa grande ação entre amigos. O último acepipe servido na festa de confraternização entre as ex-rivais CUT (Central Única dos Trabalhadores) e Força Sindical é a portaria nº 186, que deverá fomentar a criação de federações e confederações de trabalhadores e patrões.
A medida, como sempre, vem travestida de roupagens liberais. Os sindicatos terão doravante, pelo incremento das opções, maior liberdade para escolher a quais federações e confederações vão filiar-se. Na forma, tal raciocínio é incontestável. Na prática, entretanto, existem razões para recear que as coisas não sejam bem assim.
A portaria concede ao Ministério do Trabalho o poder de atuar como instância de conciliação no caso de conflito entre entidades que disputem a representação de uma mesma categoria de trabalhadores ou de atividade econômica. Fica criada, assim, mais um balcão de favorecimento de amigos. CUT e Força tenderão a manter seus feudos e ampliá-los à expensa de centrais menores e com menos "representatividade" no ministério.
Curiosamente, agora não parece valer o argumento de que colocar sindicatos sob a influência de um braço do Estado fere a autonomia dos trabalhadores. Foi com base nesse raciocínio que Lula vetou o mecanismo que permitiria ao Tribunal de Contas da União (TCU) fiscalizar os recursos provenientes da contribuição negocial, que irrigam os cofres sindicais com verbas da ordem de R$ 1 bilhão anual.
O caminho para promover uma verdadeira reforma sindical, que de fato elimine a indevida tutela estatal, é conhecido pelo menos desde 1948, quando surgiu a Convenção nº 87 da Organização Internacional do Trabalho, ligada à ONU.
O documento, que era defendido pela CUT até a chegada de Lula ao poder, preconiza a eliminação das contribuições compulsórias e da unicidade sindical (norma que permite uma única associação para cada categoria na mesma base territorial). Essas duas disposições se somam para fomentar a necessária concorrência por filiados, base de todo sindicalismo independente.
Editorial da Folha de São Paulo, em 23/04/2008
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